Publish In English For Not Perish ou as Novas Normas do Scielo Brasil. Editorial
Por Ana Márcia Silva (Autor), Tadeu João Ribeiro Baptista (Autor).
Resumo
O imperativo e famoso dito da lógica acadêmica “publicar ou perecer” (ANGELL, 1986) ganha novo grau de dificuldade: publicar em inglês para manter-se ativo no mundo acadêmico, como sugere o título deste editorial da Pensar a Prática volume 17, nº 4. Isso porque a biblioteca eletrônica Scielo Brasil (2014), exigirá de todos os periódicos que queiram estar a ela vinculados e, consequentemente, de toda comunidade acadêmica, a publicação de 80% de seus artigos em inglês.
Tal resolução surpreende, principalmente, pela base Scielo ter sido constituída para fortalecer os periódicos nacionais e ter se tornado uma importante base de indexação de periódicos em países Ibero-Americanos. Nascida de projeto conjunto da Fundação de Amparo a Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), em conjunto com Centro LatinoAmericano e do Caribe de Informação em Ciências da Saúde (BIREME), desde 2002 recebe apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) para seu funcionamento. Os países de onde são originarios periódicos indexados atualmente e prováveis futuros, não tem o idioma inglês como nativo em nenhum deles, assim como as sociedades para a qual se destinam, em última instância, os conhecimentos produzidos.
A Scielo passa de nenhuma exigência de artigos neste idioma para um exigência de quase totalidade de artigos, de forma que surpreendeu e causou importantes resistências na comunidade acadêmica brasileira. Este foi o caso do Forum de Editores de Saúde Coletivo, vinculado a Associação Brasileira de Saúde Coletiva (ABRASCO) que divulgou manifesto sobre o tema (ABRASCO, 2014).
A desejável internacionalização da atividade científica brasileira, parte importante dos critérios de qualidade de um periódico e de um campo do conhecimento é transformada em mais um indicador quantitativo. Indicador discutível, sobretudo porque se reduz a escrever em inglês; exigência que pode se traduzir no pagamento da revisão para empresas especializadas com profissionais nativos no idioma e familiarizados com as diferentes linguagens próprias dos diferentes campos do conhecimento.
Nesse sentido, outra iniciativa Scielo que surpreendeu, sem deixar de levantar certa contradição, é a carta escrita por sua diretoria, juntamente com a Associação Brasileira de Editores Científicos (ABEC) e encaminhada a Capes. Nesta carta, ambas as entidades opunham-se a política de financiamento de publicação de periódicos brasileiros por editora comercial estrangeira a ser contratada por este órgão público. O edital da CAPES para isso foi publicado em 29 de outubro do corrente e logo depois suspenso e refeito, tornando-se em convite dirigido aos editores de cerca de cem periódicos brasileiros, em média de dois dos principais em cada campo do conhecimento, para assistirem a exposição de grandes editoras empresas internacionais com vistas a qualificação de futuro edital e contratação. As duas entidades mencionadas acima opuseram-se a este processo de contratação (ABEC; SCIELO, 2014) argumentando que a contratação de editoras comerciais não garante a qualidade da produção e a Pensar a Prática, Goiânia, v. 17, n. 4, out./dez. 2014internacionalização. Talvez, seja exatamente isso que possa ser decorrencia de uma política de publicação apenas inglês para os periódicos da comunidade acadêmica iberoamericana.
Os desdobramentos destes fenômenos para todas as Instituições de Ensino Superior, Entidades Científicas e sobretudo no Sistema de Pós-graduação, e lógica de organização do trabalho acadêmico com vistas à potencialização da produção têm sido pauta da discussão, acrescido agora das consequencias destas diretrizes postas com o idioma inglês para todos os editores, autores e revisores. Juntamente com o fenômeno do produtivismo do interior do Sistema Nacional de Pós-graduação, esse tipo de indução à internacionalização deve ser amplamente discutido no Brasil, em seu potencial de criar enviezamentos nos fins da atividade científica.
Seguimos na labuta.
Boa leitura! Ana Márcia Silva Tadeu João Ribeiro Baptista
Editores da Revista Pensar a Prática
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Referências
ABEC; SCIELO. ABEC Brasil e SciELO vêm requerer da CAPES a reformulação do edital anunciado para o financiamento público de publicação de periódicos do Brasil por editora estrangeira. Disponível em: Acesso em 12 dez. 2014.
ABRASCO. FORUM DE EDITORES DE SAÚDE COLETIVA. Carta de São Paulo. Disponível em: Acesso em 12 dez. 2014.
ANGELL M. Publish or perish: a proposal. Annals of Internal Medicine, Philadelphia, v.104, n.2, p. 261-262, fev., 1986.
SCIELO BRASIL. Critérios, política e procedimentos para a admissão e a permanência de periódicos científicos na Coleção SciELO Brasil. Disponível em: Acesso em 12 dez 2014.