Integra

  O presente trabalho tem como objetivo, refletir sobre de que forma a linguagem corporal vem sendo tratada no ambiente escolar.
 Tais questões nasceram de uma prática pedagógica com alunos de escolas públicas do município de Niterói.


 Sem pretensão de indicar soluções, a intenção é de apontar para algumas questões, sobre de que forma o "corpo" do aluno é tratado dentro do contexto da escola, e ensaiar algumas sugestões com a preocupação de ajudar na construção de uma prática pedagógica da Educação Física, na busca de uma interdisciplinalidade curricular, e na formação global do aluno, inserido no seu contexto sócio-cultural.
 Será que o "saber corporal " está incorporado no conteúdo da Educação Física escolar?
 Na maioria das vezes observamos que dentro das escolas a práxis ainda se encontra presa aos primórdios da nossa história, quando com uma visão ainda cartesiana, se mantém uma separação entre o corpo e a mente.


"O corpo é apropriado pela cultura. vai sendo cada vez mais suporte de signos sociais. como dizem é necessária a preparação do (do corpo) para o convívio em sociedade. é preciso aprender as regras sociais. começa a divisão. começa a educação. (Medina, 1990)
 O "corpo" é tratado no ambiente escolar, como se sua função fosse levar a "mente" para sala de aula, a fim de que pudesse ser passado para o aluno, o saber que a escola julga necessário adquirir. E o que vemos é um "corpo" mantido em imobilidade limitado e controlado em seus movimentos e expressões, sendo desprezada a história do saber corporal que cada indivíduo possui.
Como é comum ouvirmos: "Fulaninho não aprende porque não para quieto..." E o seu corpo está ali, inquieto e sinalizando outras necessidades de mobilidade e expressão, o que na maioria das vezes não é percebido.


 O bom professor passa então a ser o que de alguma forma consegue "domesticar, aquele corpo, sedento por novas vivências, movimentos, espaços..., para que a escola avalie, ainda que de uma forma equivocada, que agora quieto e submisso será capaz de adquirir o saber institucionalizado. De certa forma quando se coloca a escola como mera reprodutora do modelo político-ideológico da nossa sociedade capitalista, isto bem seria verdade.


 Dentro da própria Educação Física escolar, ao levarmos em consideração a sua história, nos defrontamos com influências da visão cartesiana de homem, quando por exemplo deparamos com práticas mecanicistas.
Na busca de uma nova perspectiva para essa disciplina e de uma identidade para o profissional dessa área, novos estudos vêm surgindo, e dentre as novas vertentes a questão do trabalho corporal está sendo abordada por muitos na busca de uma práxis que se caracterize pela harmonia entre corpo e mente.
Mas de que "corpo" estamos falando?


 Devemos pensar no corpo não simplesmente como corpo-objeto, corpo-matéria, e sim num corpo-sujeito, que possui manifestações próprias, que é participativo, que possui uma consciência de si e do mundo que o cerca e que interage com as situações concretas vivênciadas no seu dia a dia. Em fim um corpo que possui corporeidade.
"A corporeidade é acima de tudo, uma presença, uma manifestação, uma visibilidade, talvez dito com maior precisão uma fisionomia. a corporeidade se estende para além dos limites da educação física e da biologia. ela alcança a esfera da consciência e não exclui a possibilidade de transcendência. podemos afirmar com certa segurança que a corporeidade é a condição humana, é o modo de ser do homem."(Santin,1993)


 Após reflexões e questionamentos a respeito do tema, surgiram idéias que podem ser revertidas em sugestões de como a Escola, a Educação Física e o Professor dessa disciplina podem contribuir no processo de formação do aluno como um ser inteiro, crítico e autônomo.


  A escola, enquanto instituição, não pode desprezar o movimento corporal historicamente construído, que cada aluno trás para o ambiente escolar, respeitando suas diversidades e levando em consideração as vivências sócio- culturais dos mesmos. Não deve limitar as linguagens oral e/ou escrita como únicas formas de estabelecer relações afetivas, cognitivas e sociais. Sem dizer com isso que deve se criar uma dicotomia entre as diferentes formas de linguagem. Fazer uso da linguagem oral como forma de expressar o que foi corporalmente vivido, poderá proporcionar um crescimento pessoal e contribuir no processo de socialização.
As vivências e conhecimentos corporais que o aluno já tem quando entra na escola, devem passar a fazer parte do currículo escolar, e utilizados como veículos de integração, fazendo com que a intencionalidade da prática pedagógica seja de trazer prazer para o aluno durante o processo de construção do conhecimento.


 A interdisciplinalidade teria importante papel, quando Matemática, História, Ciências... fizessem uso desses conhecimentos já incorporados pela criança e os somassem aos conteúdos curriculares. Nessa troca entre o " saber ímpirico" e o "saber escolar" se daria o processo de aquisição do conhecimento de uma forma significativa e prazeirosa. Assim sendo, talvez, à escola passasse cumprir melhor um de seus papéis, que seria o de transmitir conhecimentos.


 Mas por que todo esse processo só seria possível de se concretizar dentro da sala de aula, quando as crianças estão imóveis, sentadas em carteiras, como se seus corpos não pudessem participar do processo de aprendizagem?


 Voltamos aí a visão cartesiana de corpo e mente, o que infelizmente ainda se perpetua na maioria das escolas.
Para escola propomos a implementação de um projeto pedagógico que estabeleça uma relação de continuidade e contextualizada das diferentes formas de expressão e que perceba o aluno na sua totalidade e não como um ser fragmentado.


 E o papel do professor de Educação Física?


Qual seria a sua contribuição dentro do ambiente escolar?


 A criança dança, canta, dramatiza, pula corda, brinca de pique, joga amarelinha...O professor deve permitir que os alunos vivam dentro do ambiente escolar essas experiências corporais que já possui, e incorporá-las ao processo de aprendizagem.


 O trabalho do professor de Educação Física na escola deve ser o de buscar uma interdisciplinalidade, tendo como uma de suas metas não permitir que o "corpo" seja separado da "mente" (como se isso fosse possível), durante o processo de construção do saber. Cabe ainda ao mesmo valorizar a motricidade corporal do aluno, dentro do ambiente escolar.


 Dismistificar regras já estabelecidas, como por exemplo que os momentos de liberdade de expressão só são possíveis no horário do recreio, e de não permitir que o conceito de uma Educação Física Militarista, se perpetue através de sua prática, assumindo o papel de disciplinador, daquele que simplesmente deve ajudar a manter a ordem .


 O professor deve promover o diálogo, deixando de ser o centro do processo ensino-aprendizagem, o detentor do saber e um mero repassador de conteúdos, transformando sua práxis numa relação interativa e dialética.


O prazer e a ludicidade devem estar presentes em suas aulas, buscando resgatar os jogos e as brincadeiras da cultura infantil.
 Deve reconhecer o aluno como um ser historicamente construído e influenciado pelo seu meio sócio-cultural. Portanto deve de uma forma lúdica ser o mediador entre as experiências corporais já vividas pelo aluno, e as novas possibilidades da linguagem corporal. Atuar como elemento facilitador para o estabelecimento de novas relações. Ajudar a desconstruir o conceito de segmentação do indivíduo, vendo-o como um ser integral inserido no seu contexto sócio-cultural.


 Dessa forma se tornará mais fácil ajudar ao aluno avançar no processo de aquisição do conhecimento, passando a construir formas mais elaboradas de pensar.


 Destaco como forma essencial para o crescimento do processo educativo a articulação de todas as formas de linguagem e expressão, sempre levando em consideração a história que cada aluno trás para o ambiente escolar, as diversidades entre as mesmas, vendo o indivíduo como um ser inteiro na busca do seu crescimento biopisicossocial
 Perceber corpo e mente como indissociáveis, estabelecer a unidade do homem é fundamental para um novo paradigma da Educação Física.

Referências Bibliográficas

Freire, João Batista. Educação de Corpo Inteiro Teoria e Prática da Educação Física.São Paulo,Scipione,1989.
Gonçalves, Maria Augusta Salin. Sentir, Pensar, Agir. Corporeidade e Educação. Campinas S.P., Papirus, 1994.
Medina, João Paulo S. O Brasileiro e seu Corpo. Educação e Política do Corpo. Campinas, S. P. Papirus, 1990
Medina, João Paulo S. A Educação Física Cuida do Corpo... e Mente. Campinas, Papirus, 1989.
Santin, S. Educação Física outros Caminhos, UNIJUI, 1993