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     Supomos que não está fácil para ninguém lidar com esta pandemia e suas consequências. As consequências são muitas e atingem as mais diversas esferas da nossa vida. As perdas são muitas, a começar pela própria vida.  Nas últimas semanas temos nos deparado, infelizmente, com mais de 1.000 mortes diárias em nosso país.

      No texto passado, falamos dos prejuízos que sofremos pela limitação ao nosso movimentar-se, imposta pela necessária quarentena e isolamento social. Falamos ainda, em outra oportunidade, das perdas que sofremos com a substituição, necessária neste momento, dos professores por aplicativos e demais ferramentas digitais. Poderíamos levantar aqui inúmeras outras perdas, mas neste texto abordaremos o quanto perdemos com os descabidos e irresponsáveis ataques ao sistema educacional brasileiro, da educação básica ao ensino superior. Foi necessária uma árdua luta para aprovar o Fundeb, contra a vontade do governo federal.

     No início da quarentena e suspensão das aulas em todos os níveis, tínhamos poucas centenas de pessoas infectadas. Em 24 de março, início da quarentena no Estado de SP, foram notificados 2.201 casos de contágio. Acertadamente, cancelaram-se as aulas presenciais e fecharam-se as escolas e faculdades/universidades. O que levou a crer que, quatro meses depois, com 1.927.000 casos de contágio (em 14 de julho), a decisão mais acertada é apoiar o discurso pela volta às aulas presenciais nas próximas semanas? Dia 13/07 o Governo de SP anunciou a permissão para volta às atividades práticas presenciais em universidades de alguns municípios paulistas (aqueles que se encontram pelo menos há 14 dias na fase amarela do plano traçado pelo Governo paulista). Qual a finalidade dessa autorização?

     É justamente ao falar da educação em nível superior que elencamos aquele entendido por nós como o segundo grande ataque à educação em tão poucos dias: Ao tomar posse o novo ministro da Educação (o terceiro em menos de um mês – outro ataque), tomamos conhecimento da seguinte fala proferida por ele em 2018: "as universidades ensinam prática totalmente sem limites do sexo".

     Esse discurso de ataque à educação, especificamente à Universidade, mesmo que ainda desvinculado de seu papel como ministro, reflete a atuação dos diversos ministros de educação deste Governo. Ou seja, são palavras inseridas em um projeto. Um projeto, no geral, de destruição do conhecimento científico através de sua negação; no particular, de seguidos ataques à instituição que, supostamente, é a guardiã da verdade, a preservadora do conhecimento científico e da publicação daquilo que mais se aproxima da verdade. Nas palavras de Jacques Derrida, "a Universidade faz ‘profissão’ da verdade. Ela declara, promete um compromisso sem limites para com a verdade... "Para além do que se chama liberdade acadêmica, essa Universidade exige e deveria ter reconhecida uma liberdade incondicional de questionamento e de proposição, ou até mesmo, e mais ainda, o direito de dizer publicamente tudo o que uma pesquisa, um saber e um pensamento da verdade exigem." Ps. 13 e 14 (Derrida, Jacques: A Universidade sem condição. São Paulo: Estação Liberdade, 2003).

     No atual governo, o projeto é substituir o saber acadêmico comprometido com a verdade, pela produção de negações da verdade, o que significa, a afirmação de autoverdades. De tanto repetidas, essas autoverdades se incorporam ao imaginário e vocabulário popular e substituem os conceitos fundados na ciência e na filosofia. Assim ocorre, por exemplo, na reabertura de academias de ginásticas durante a pandemia sob a alegação de que a população precisa delas para manter a saúde. Tal justificativa não se sustenta cientificamente, mas, usada à exaustão, substitui a verdade.

     É compreensível, ainda que não aceitável, que a Universidade, como baluarte da ciência, da filosofia, da verdade (do ponto de vista teórico), sofra ataques ao questionar ou contrariar o projeto negacionista do atual Governo. E a quem cabe resistir e divulgar a verdade do conhecimento científico? Aos pesquisadores e professores! Preparem-se, pois, professores: no atual projeto de governo, somente serão benvindos os que negarem a profissão.