Resumo

A presente pesquisa histórica partiu de acontecimentos retratados em grandes jornais paulistanos durante a década de 1930, envolvendo a repressão às casas de jogos de azar (os chamados boliches) na cidade de São Paulo e as respectivas resistências desses estabelecimentos. No estudo, tivemos o objetivo de compreender de que modo os discursos dos agentes históricos envolvidos no processo (forças policiais, poder judiciário, imprensa, bolicheiros) mobilizavam a noção moderna de esporte na construção de seus argumentos, fosse como oposição ou aproximação em relação às práticas que se davam dentro dos boliches. As fontes da pesquisa foram constituídas por notícias, colunas, notas e demais textos publicados entre 1930 e 1937 nos jornais Correio de S. Paulo e Correio Paulistano, além de legislações relevantes do período que tratassem da regulamentação ou repressão ao jogo de azar. O tratamento metodológico foi realizado a partir dos debates da história cultural, pela qual compreendemos as fontes como vestígios indiretos que, constituídos pelo problema de pesquisa e mediados pela crítica, nos permitem interpretar as práticas e representações de um tempo passado. A coleta dos documentos foi feita no acervo da Hemeroteca Digital Brasileira. Na leitura das fontes, notamos que um discurso esportivo estava presente em muitas falas. Os proprietários dos boliches, de um lado, tentavam se aproximar da ideia de esporte, fosse pela adoção mimética de elementos esportivos ou por recursos judiciais que buscavam firmar seu caráter de esporte para resistir à repressão policial. Do outro lado, polícia e imprensa combatiam os boliches, argumentando em muitas frentes que o caráter dos estabelecimentos era definitivamente não esportivo. Em nossa interpretação, pudemos notar que o esporte era objeto de distinção social. Seus elementos eram mobilizados discursivamente em táticas e estratégias nas lutas de representações que envolviam diferentes agentes históricos. Os boliches, enfim, não obtiveram êxito na resistência à repressão, o que revela uma relativa consolidação do campo esportivo, já muito afastado, ao menos discursivamente, do mundo das apostas. São aspectos intimamente ligados, nesse sentido, ao processo cultural de modernização da cidade de São Paulo.