Resumo

Este trabalho é resultado de uma pesquisa de mestrado. Realizamos uma autoetnografia nas aulas de Educação Física, com turmas de 2º ano do Ensino Médio (EM) de uma rede de ensino particular. Em meio ao contexto da pandemia de Covid-19, as aulas ocorreram em diferentes formatos: presencial, online e híbrida. Tencionamos perceber quais práticas discursivas são produzidas em meio às relações de poder que emergem nas aulas e dissertar sobre certos processos estabelecidos, como problematização e ampliação dos discursos relacionados à representação da prática corporal tematizada: o skate. O método autoetnográfico é compreendido como uma narrativa pessoal de uma experiência vivida, que descreve e critica as crenças culturais, práticas e experiências; reconhece e valoriza as relações de pesquisar com os outros sujeitos do estudo e visa uma autorreflexão entre o pessoal e o político, o sujeito e o social, o micro e o macro (Santos, 2017). As aulas ancoraram-se nos pressupostos teóricos e didático-metodológicos do currículo cultural da Educação Física (Neira e Nunes, 2022). As análises se deram a partir de algumas ferramentas conceituais produzidas por Michel Foucault, como poder e governamentalidade e Stuart Hall, como representação. Mesmo diante das dificuldades produzidas pelo contexto pandêmico, as aulas potencializaram a ampliação, aprofundamento e transgressão de discursos sobre algumas representações e reconstrução de outros, mais abertos à diferença. O estudo desse tema permitiu que os discentes ressignificassem seus discursos sobre a Educação Física, que teve seus limites como disciplina transgredidos por se aproximar de temas para além das práticas corporais, como o rap e o trap. Os alunos puderam experimentar e criar diferentes formas de praticar o skate. Os estudantes que permaneciam nas aulas online deram ideias da possibilidade de andar de skate em suas casas. Em meio às diversas resistências por parte de alguns alunos, tanto em fazer a prática como em relação aos skatistas, as atividades promovidas como: compartilhamento de fotos e vídeos, por parte do professor, de skatistas com corpos e estilos diferentes daqueles fixados em representações discursivas pelos alunos (meninos jovens, corajosos, bonitos, magros, que usam certas roupas e tênis, por vezes usuários de drogas e que ouvem músicas de um único estilo); entrevista com uma professora que era bailarina e skatista; construção de um mapa conceitual com diferentes informações pesquisadas sobre as possibilidades históricas do skate e skatistas; pesquisa sobre competições femininas de skate; e compartilhamento, por parte de alguns alunos, de tipos de skate diferentes daqueles que outros conheciam, puderam desestabilizar seus discursos sobre o skate e os praticantes. Por outro lado, houve a valorização dos saberes dos alunos envolvidos com a cultura do skate, que tiveram suas vozes enunciadas como legítimas. Como resultado, concebemos que todos os efeitos da tematização do skate realizada nessa pesquisa foram frutos de regulações históricas, estabelecidas por práticas discursivas que produziram regimes de verdade acerca do skate e de seus praticantes. Ademais, essa autoetnografia desempenhou um papel de ‘tecnologia do eu’ docente, atuando no processo de constituição de sua identidade e de novas subjetividades durante essa experiência.

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