Integra

Transcorriam anos que depois foram chamados de dourados. Acho que não prestávamos atenção às cores de anos, pois tínhamos muitos outros estímulos para tentar entender e curtir. Os tempos traziam a ambivalência de um país sob enérgica ditadura militar e por outro lado com o “boom” da bossa nova, que competia saudavelmente com o ye-ye-yé dos Beatles e Rolling Stones. Mas o mundo estava passando por mudanças mais radicais pois ao mesmo tempo explodia as mini-saias e a pílula anti-concepcional. Percebia-se que a coisas estavam gostosamente sem controle, de pernas para o ar.

Dentro desse cenário, um grupo de jovens de São Caetano se reuniu e fundou em 13 de agosto de 1965 o Tijucussu Clube. Hoje parece tudo normal, mas não foi bem assim, pois tanto o nome, antiga denominação de São Caetano, como a data, uma sexta-feira 13 de agosto de lua cheia, demonstravam a inclinação daqueles jovens em não se acomodar no lugar comum.
Otacílio de Carvalho Lopes, otorrino e escritor da “Cor do Gosto”, foi o paraninfo da fundação que aconteceu no entao pomposo salão de festas do Clube Comercial, em cima do Edifício Vitória, que abrigava cinema do mesmo nome, local de muitas matinês tão concorridas pela turma do clube, nos domingos a noite, caminhando em um grande grupo desde a R.Piaui, na Vila Paula.

Mas para se chegar a este evento histórico, muitas e muitas reuniões aconteceram para se discutir artigo por artigo do estatuto e definir o símbolo do clube, um pentágono que expressava a grande força de coesão dos cinco membros da diretoria, encimado pela “coroa principesca da França”, descrição feita pelo nosso primeiro presidente e que ninguem discutiu. Mas desde entao, aprendemos, como muitas e muitas outras gerações que vieram posteriormente, a como fazer um estatuto, como registrá-lo, como reservar um salão de festas, como preparar um distintivo, um convite, contatar a imprensa... e tantas outras coisas que esse Clube nos ensinou, e que nunca mais esquecemos...levamos para a vida...e desfrutamos de todo esse ensinamento.

Incrível que em meio ao caos da adolescência, conseguíamos realizar muita coisa. O Prof Abival, psicólogo, que lecionava no Mackenzie, foi o primeiro a dar uma palestra (sobre Escapismo) de inúmeras outras. Chegamos a fazer algumas campanhas filantrópicas, mas logo aprendemos que o importante não era dar o peixe, mas ensinar a pescar. Mas tambem nos divertíamos. Quantos e quantos bailinhos nós organizamos, desde garagens adaptadas, passando por salões de casas de classe média, até nos salões do Comercial e da ACASCS, como o inesquecível Bonnie and Clyde, em que todos estávamos impecáveis a caráter, como se ali fosse algum “sallon”. E dançavamos samba, bossa-nova, rock. De Ray Conniff a Jobim, do famoso álbum Metais em Brasa aos redentores Help e Yellow Submarine. E que sucesso fez a luz negra, inaugurada em uma noitada inesquecível na casa dos meus pais.

Aliás, os pais tiveram um papel importante nessa história, pois embora as vezes assustados com tantas novidades, souberam distinguir que o importante não era a cabeleira enorme, mas o que havia dentro daquelas cabeças. Poderia citar muitos, mas para não cometer uma impropriedade, recordo dos meus pais, Sr Ari e Dona Tininha, que creio representarem muito bem uma geração especial também de pais (e não só de filhos). E por falar em filhos, lembramos que para iniciarmos nessa turma mais cedo, criamos o Tijucussu Mirim, que nos presenteou com grandes futuros líderes.

Sem eles, talvez não pudéssemos trazer para momentos inesquecíveis Geraldo Vandré, Amilson Godoi e Plínio Marcos, este no auditório do segundo grande show do Tijucussu,Cré com Cré, Lé com Lé, nome do “skecth” escrito e interpretado pelos membros do Clube, realizado num sábado, enquanto o AI-5 era decretado na segunda sequinte. Mas também tivemos os Pulguentos (com filhos do Renato Corte Real) e os Louphas (de amigos do Mackenzie e de Ilhabela) no primeiro show: o Tiju-Yé-Bossa, demonstração que sabíamos harmonizar gostos tão distintos.

Outra coisa que gostávamos de fazer eram os convescotes. Quantos e para quantos lados fomos. Mas após memorável visita ao Sr Eliseu Santana, ele consentiu e passamos a desfrutar das benesses do maravilhoso Sítio da Maria Luisa, paradoxalmente integrante dos Castores. Alias não havia jogo de futebol mais aguardado na cidade que Tijucussu e Castores, onde diferenças ideológicas eram acertadas no nível da canela.

Por sinal o Tijucussu acabou tendo um time de futebol juvenil, que se sagrou campeão da cidade de forma invicta, tendo inclusive ganhado no segundo turno no entao papão da área, o Saad Futebol Clube, por 6 a 0 (e não era a Alemanha....). Aliás tivemos também um bom time de basquete, cuja passagem mais memorável foi uma viagem a Uberlândia, onde fomos humilhados pela equipe do Praia Clube, toda constituída de barrigudinhos e desajeitados atletas, que arremessavam a maior parte das bolas de “lavadeira” e o pior é que elas caiam.

Mas na área esportiva criamos uma grife: a Olimpíada Colegial de São Caetano (e depois do ABC), que com o objetivo de “congraçamento dos estudantes” acima das disputas esportivas, envolvia campeonatos de conhecimentos gerais, concurso de rainhas e o baile da Olimpíada que superlotava os salões do São Caetano Esporte Clube. Mas por falar em superlotação, não há quem dentre os tijucussenses se esqueça da maravilha festiva que eram as finais no Lauro Gomes, totalmente tomado pelas turmas dos colegios, que depois de muita torcida se confraternizavam, com os emocionados organizadores, sob a chuva de confete e serpentina.

Para discutir científicamente aqueles jogos, organizamos o Simpósio de Esportes Colegiais, precurssor do Simpósio Internacional de Ciências do Esporte do CELAFISCS. Em função da repercussão dessas Olimpíadas, que trouxeram pela primeira vez a nossa cidade por duas ocasiões o governador do estado, Laudo Natel, coordenamos a pedido do Presidente da CME, o Planesporte, que deu a São Caetano 14 centros esportivos, que até hoje representam a base da estrutura esportiva da cidade.

Tivemos também uma enorme cobertura da mídia, com a então poderosa TV-Gazeta apresentando ao vivo a Abertura dos Jogos e ainda um espaço semanal no Jornal de São Caetano, com a coluna: Nós, os Tijucussenses. Chegamos a ter um departamento de pesquisa, que inclusive chocou a cidade com a pesquisa de hábitos sexuais (isso no início dos anos 70.

Muitas e muitas são as imagens que me vem a cabeça ao alcançarmos esses 50 anos de nossa fundação. No geral representavam os sonhos de uma geração que veio para mudar nossa cidade e nossas vidas. Sim, porque arrisco a dizer que nossas vidas de certa forma foram divididas entre antes e após o Tijucussu. E finalizo compartindo uma frase que o saudoso Cacá (Antonio Carlos de Carvalho, o Carvalhinho) nos brindou em uma de suas últimas alocuções em nossas Cerimônias de Aniversário: “ podemos dizer que no Tijucussu nós éramos felizes e sabíamos” !