Resumo

PROPRIEDADES NEUROMECÂNICAS DO TRÍCEPS SURAL APÓS REPARO CIRÚRGICO DO TENDÃO DE AQUILES: DA REABILITAÇÃO AO TREINAMENTO As rupturas do tendão de Aquiles vêm aumentando com o aumento do interesse em práticas esportivas. O programa de reabilitação pós-operatório pode ser realizado com reabilitação tradicional com imobilização, ou acelerada com mobilização e descarga de peso precoce. A abordagem acelerada aumenta a amplitude de movimento (ADM) do tornozelo e aumenta a hipertrofia do músculo tríceps sural. Contudo, apesar da reabilitação acelerada ser mais indicada para uma recuperação rápida, os pacientes apresentam déficit na força muscular mesmo depois de mais de dez anos da cirurgia. Uma das estratégias para diminuir esses efeitos deletérios persistentes no longo prazo é a realização de treinamento excêntrico. Contudo, o exercício excêntrico pode trazer um risco de re-rupturas ou tendinopatia devido às altas cargas se estas não são aplicadas com uma intensidade apropriada. Dessa forma, o objetivo da presente tese de doutorado é identificar os efeitos dos diferentes programas de reabilitação descritos na literatura e verificar os efeitos do exercício excêntrico em pessoas que passaram pelo reparo cirúrgico do tendão de Aquiles. A tese foi dividida em quatro capítulos que correspondem a quatro artigos independentes com objetivos específicos. No capítulo 1, uma revisão sistemática com metanálise foi desenvolvida para comparar os efeitos da reabilitação tradicional com a reabilitação acelerada na força dos plantiflexores, na ADM do tornozelo, na capacidade funcional, na morfologia tendínea e muscular e no desempenho do teste de elevação do calcanhar após ruptura do tendão de Aquiles. Apesar do alto risco de viés encontrado nos estudos, quando os protocolos são comparados não foram encontradas diferenças a favor de nenhum programa para a força muscular. Entretanto, há um efeito em favor da reabilitação acelerada para diminuir déficits de força excêntrica e de ADM. Portanto, o protocolo acelerado, apesar de apresentar bons efeitos relacionados a ADM, não foi superior ao protocolo de imobilização no que se refere à força muscular dos plantiflexores. Esses resultados instigaram a realização de um estudo, com dados do nosso grupo de pesquisa, para tentar entender um pouco mais os efeitos da reabilitação acelerada nas propriedades neuromusculares desses pacientes. Neste segundo capítulo, a proposta foi comparar os efeitos de um protocolo de reabilitação tradicional de imobilização com um protocolo de reabilitação acelerada na ADM, na arquitetura do gastrocnêmio medial e no torque dos plantiflexores logo após a reabilitação (aos 3 meses), e após 6 meses e 30 meses da cirurgia de reconstrução tendínea. Neste estudo, encontramos que a reabilitação acelerada leva a maior ADM de plantiflexão do tornozelo (p=0.007; d=1.61), maior comprimento de fascículo (p=0.043; d=1.10) e maior espessura do músculo gastrocnêmio medial comparado ao grupo tradicional (tanto na perna saudável, p=0.036; d=1.01; quanto na com lesão, p=0.006; d=1.38). Entretanto, independente do protocolo de reabilitação, a perna com ruptura teve menor força de flexão plantar comparada com a perna sem lesão (p<0.001; d=1.46), mesmo após o longo prazo decorrente da cirurgia de reconstrução. Esses resultados indicaram a busca de uma solução para diminuir esses efeitos deletérios relacionados à força muscular. Escolhemos um programa de exercício excêntrico com o objetivo de aumentar a força muscular, o comprimento fascicular, a espessura muscular e remodelar a estrutura tendínea, a fim de tentar diminuir os déficits encontrados nesses pacientes, que parecem ser permanentes mesmo depois de mais de 2 anos da cirurgia. Para isso, no capítulo 3, verificamos o efeito de duas modalidades de treinamento excêntrico, convencional (na academia) e isocinético (no dinamômetro) durante 12 semanas, sobre a massa muscular do tríceps sural, a ativação muscular, o torque dos plantiflexores e a ADM em 28 pacientes que passaram por cirurgia de reconstrução do tendão. O treinamento convencional apresentou maior ativação excêntrica após 8 (p=0.02) e 12 semanas (p=0.001) de treinamento e maior ativação concêntrica após 12 semanas que o grupo isocinético na perna com lesão (p=0.04) e na perna sem lesão (p=0.01). O grupo isocinético apresentou maior massa muscular na perna com lesão no momento pré (p=0.001) e pós 4 (p=0.01) semanas de treinamento e maior massa muscular na perna sem lesão após 8 semanas (p=0.01). A perna sem lesão apresentou maior torque e ativação que a perna com lesão. O treinamento convencional foi capaz de diminuir assimetrias de espessura muscular (p=0.02) e o treinamento isocinético foi capaz de diminuir assimetrias de torque isométrico (p=0.009) após 8 semanas de treinamento. A ativação isométrica aumentou após 8 (p=0.001; d=5.44) semanas de treinamento excêntrico em ambos os grupos e pernas. O treinamento convencional aumentou a ativação concêntrica após 8 semanas na perna sem lesão (p<0.001; d=6.19) e após 12 semanas na perna com lesão (p=0.014; d=4.37) e aumentou a ativação excêntrica nas duas pernas após 8 semanas de treinamento (p=0.01; d=4.4). O treino convencional aumentou a massa muscular após 8 semanas de treinamento (p=0.002; d=5.2), enquanto o treinamento excêntrico aumentou após 12 semanas (p=0.002; d=2.56) na perna com lesão. Ambos os treinamentos aumentaram a amplitude de dorsiflexão após 8 semanas (p=0.03; d=0.83). O torque máximo de plantiflexão aumentou após 8 semanas [(isométrico, p=0.001; d=2.99); (concêntrico, p=0.001; d=2.49); e (excêntrico, p=0.001; d=2.24)] independente da modalidade de treinamento. Tendo em vista os efeitos positivos do treinamento excêntrico nas propriedades neuromusculares desses pacientes, e a possível complementariedade entre adaptações neuromusculares e tendíneas, no capítulo 4 verificamos os efeitos do treinamento excêntrico no comprimento total e livre do tendão, na área de secção transversa e na ecogeneicidade do tendão em 10 regiões diferentes do tendão. O tendão com ruptura apresentou maior área de secção transversa, menor ecogeneicidade, maior comprimento total e livre que o tendão saudável. Além disso, o tendão lesado apresentou diferentes áreas e ecogeneicidades ao longo de seu comprimento, principalmente no momento pré-treinamento. Essas diferenças entre as áreas diminuíram ao longo do treinamento, indicando uma melhora da estrutura tendínea com o treinamento de força. O treinamento convencional foi capaz de aumentar em 18% a área de secção transversa do tendão com ruptura na região de 5cm da inserção osteotendínea após 8 semanas de treinamento e aumentar o comprimento do tendão na perna sem lesão após 4 semanas, entretanto não foi capaz de causar mudanças na ecogeneicidade do tendão (p= 0.28). Os treinamentos excêntricos (em dinamômetro isocinético) e o convencional (em academias) são igualmente benéficos para pacientes que romperam o tendão de Aquiles, podendo ser utilizados indistintamente na reabilitação após longos períodos da cirurgia de reconstrução tendínea.

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