Um Ensaio Sobre a Materialização das Percepções de Força Entre Praticantes do Esporte de Escalada
Por Virgínia Squizani Rodrigues (Autor).
Resumo
Este trabalho olha para as práticas corporais de pessoas praticantes do esporte de escalada em rocha a partir de uma perspectiva das técnicas corporais propostas por Marcel Mauss (2017), bem como o conceito de corporeidade proposto por Thomas Csordas (2008) e algumas inquietações provocadas pela leitura de Bodies that matter (2011) da filósofa Judith Butler e pela proposta da valência diferencial dos sexos de Françoise Héritier (1996). Na primeira parte do trabalho localizo algumas de minhas observações a fim de ilustrar a prática de escalada esportiva como fundo etnográfico para, em seguida, deliberar acerca dos modos como a percepção de força se materializa nos diferentes corpos, assim como por eles é materializada. Desejo, com a questão de uma técnica corporal que visa a maestria de uma combinação de força, resistência, concentração e equilíbrio, pensar o que a percepção de força corporal pode nos dizer sobre a materialização da valência diferencial dos sexos (HÉRITIER, 1996) em corpos das sociedades complexas. É do senso comum ouvir que homens são “naturalmente” mais fortes que mulheres e que, portanto, são mais adeptos a atividades que demandam de força muscular. Até certo ponto, acredito que somos capazes de facilmente observar tal diferença e tomá-la como fato. Entretanto, acredito ser frutífero refletir sobre até que ponto um certo acúmulo de técnicas corporais desenvolvidas de modo diferencial desde a nossa infância não fez de corpos dados como masculinos, corpos de maior força anatômica e corpos dados como femininos, corpos menos fortes, pois menos expostos ao desenvolvimento de técnicas corporais anatômicas de força. Inspirada no pensamento de Butler (2011) que elabora sobre a materialidade do sexo e denuncia os processos de ontologização deste e, consequentemente, o apagamento dos processos de construção das relações impregnadas de poder, procuro olhar para aquilo que é visto como natureza (neste caso em específico, a força anatômica do corpo), como algo que também é construído. Afinal, seria muito arriscado dizer que a percepção dos modos como diferentes técnicas corporais são aplicadas ao longo de nossas vidas, por vezes, são apagadas e, portanto ontologizadas a ponto de nos fazer crer que exista uma "força natural" do corpo masculino que inexistiria no corpo feminino? Neste trabalho, esta e demais questões são pensadas através do esporte de escalada que se mostra como um excelente campo para pensar o corpo e, a partir deste, o estar e o operar no mundo.