Resumo

Na Bahia, tanto na capital como na região metropolitana e Recôncavo, o boxe é uma atividade popular, prática amplamente disseminada na paisagem, na música, na memória e na corporalidade soteropolitana (com a clara exceção das elites e da pequena classe média branca que vive em enclaves fortificados, seja na orla, seja em condomínios mais distantes da região central), encontrada em dezenas de bairros, favelas e quebradas. As teorias locais para a popularidade do boxe em Salvador, como escutei em meu trabalho de campo, revelam que a prática do boxe está intimamente associada à cultura da dança, ao carnaval popular dos blocos de rua (popularmente conhecidos como a “pipoca” do carnaval) e das práticas corporais populares do corpo, como a capoeira e suas ramificações, de uma forma mais ampla. Conforme escutei de um dirigente da Federação Baiana de Boxe, e meu principal anfitrião em Salvador, sobre a época em que viveu em São Paulo: “estranhei que o pessoal tinha dificuldade para fazer um ritmo de batucada no banco do ônibus; aqui em Salvador toda criança aprende algum tipo de ritmo desde que nasce, isso é fundamental para a aprendizagem do boxe”.
Assim, a partir de meus dados de campo, buscarei entender e analisar estas influências, saberes expressivos do cotidiano nos bairros populares, que indicariam uma pré-disposição à prática, aprendizagem e eficácia do boxe na Bahia – responsável pelas únicas duas medalhas de ouro do Brasil na modalidade. Ou seja, defenderei a tese, ainda provisória, de que sua genealogia está ancorada em performatividades de gênero e raça, encorporada no aspecto viril e guerreiro que atualiza e compõe modelos de dignidade da masculinidade negra dentro de um contexto urbano de racismo estrutural. Tudo isso regido pelo ideal heroico e universalizante que representa a prática olímpica da modalidade em questão.