Resumo
Desde cedo somos orientados a nos formar em uma profissão. Há, porém, um tipo de jovem a quem essa máxima não se aplica: o atleta.Quase todo atleta profissional começa a se dedicar ao esporte ainda criança e, quando a maior parte de seus amigos está entrando na vida adulta e profissional, ele está concluindo seu ciclo como esportista de elite sem certeza do futuro. Mas essa não é a pior situação: há atletas que se mantêm competitivos até perto dos 40 anos. Se aos 20 nem sempre é fácil começar uma nova carreira, longe das quadras, pistas, ginásios ou piscinas, o que dizer aos 40? E aí, o que fazer?!
Os atletas profissionais têm em comuns uma determinação férrea e uma capacidade de superação e de trabalho invejáveis. Essas virtudes alimentam-se, sobretudo, de resultados, vitórias e reconhecimento. O desafio está em, ao final da carreira esportiva, redirecionar aquelas virtudes excepcionais para uma vida profissional que lhe traga satisfação e contribua para a sociedade.
Nos países desenvolvidos, onde a prática esportiva de alto rendimento já é madura e profissionalizada, existem inúmeras iniciativas que oferecem ao atleta uma vida profissional digna após sua carreira no esporte. O bem-sucedido esporte universitário dos Estados Unidos é uma delas. Em Cuba, onde o esporte é uma oportunidade de diferenciação profissional, existe o chamado destreino. Nessa fase, o atleta é acompanhado por profissionais que o ajudam na transição para a vida “normal”. No seu destreino, diversos elementos desse planejamento, como alimentação e exercícios, continuam a ser considerados, para que o atleta paulatinamente se adapte a uma vida longe das competições.
No Brasil ainda há um longo percurso a trilhar até que nossos atletas possam se beneficiar de maneira eficaz nessa transição. Existem algumas iniciativas pioneiras de empresas, que perceberam o potencial dos ex-atletas para desempenhar funções associadas ou não às suas atividades esportivas. A grande maioria dos atletas sabe excepcionalmente bem como lidar com situações-limite, tomar decisões, medir riscos… e a vida profissional em qualquer atividade não é tão diferente assim. Mas precisamos evoluir muito até que essas práticas se disseminem pelo empresariado brasileiro de maneira a garantir aos jovens esportistas mais alternativas para suas decisões profissionais.
O caminho mais natural para o ex-atleta é o que o leva das competições às funções de técnico, comentarista esportivo ou ainda na área de administração e gestão esportiva. No entanto, a gama de atividades que podem ser exercidas pelos ex-atletas é ilimitada.Conciliar os estudos com as atividades esportivas profissionais é das
receitas mais eficazes para garantir uma transição sem traumas. Embora não seja fácil a “vida dupla” de atleta/estudante, ela é possível, viável e recomendável. É com certeza o melhor caminho para uma segunda profissão depois que os braços e pernas não corresponderem mais ao ímpeto da busca pelo limite.
Se por um lado o atleta sabe que sua carreira esportiva terá fim, por outro essa experiência pode oferecer alternativas muito promissoras. Planejar o pós carreira e saber aproveitar as oportunidades fazem parte dessa receita.
MARCUS VINICIUS FREIRE é economista, medalhista olímpico de vôlei
em Los Angeles (1984) e superintendente executivo de Esportes do
Comitê Olímpico Brasileiro.
(O Globo) 25/03/2012