Recebi, através de meu endereço eletronico particular, o seguinte comentário de um Mestre Capoeira do Rio de Janeiro, da República Independente do Leblon:
“Que história complicada essas da Capoeira, não? A confusão, aliás, já começou na África, passando pelos descaminhos para o segundo mundo, pela guarda negra chegando ate o cadastro eleitoreiro de capoeiras fabricado pelo orepublicano IPHAN. Com esse perfil, a Guarda Negra não poderia ser diferente.O próprio José do Patrocínio se confundiu todo. Para mim, entretanto, o que mais me chamou atenção no seu “paper” é a insistência para na história que Getúlio, por causa de Bimba, tirou a capoeira da ilegalidade. Isso jamais houve, é fantasia como o fantástico filme do Besouro que vem aí, turbinado por um técnico chinês, especializado em efeitos especiais. Será sucesso no mundo inteiro, mas temo que alguns capoeiras, ao saírem do filme, tentarão levantar vôo ou sair dando fenomenais por cima dos prédios.”
Já havia respondido ao Mestre : “Sim, Mas Zuma foi quem começou esse processo… espero ter deixado isso claro, inclusive, alertado pelo Mestre, fiz questão de incluir aquelas afirmações de que Bimba se valeu dos trabalhos de Zuma para justificar a esportivização da capoeira - não sei se ficou claro… Vejo agora que não coloquei essa parte em meu blog, pois ficaria muito extenso. Vou me corrigir, tratando disso em outra postagem… inclusive na Comunidade Capoeira do CEV… vamosm ver no que dara…
De novo artigo que estou escrevendo, sobvere o assunto, em que fica demosntrado que Bimba se serviu de Zuma para ‘criar’ a sua capoeira bahiana…
Desde 1820 têm-se registros em São Luis do Maranhão de atividades de negros escravos, como a “punga dos homens”. De acordo com Mestre Bamba, jogo que utiliza movimentos semelhantes aos da capoeira. Encontrou no Povoado de Santa Maria dos Pretos, próximo a Itapecurú-Mirim, uma variação do Tambor-de-Crioula, em que os homens participam da roda de dança – “Punga dos Homens”.
Para Mestre Bamba esses movimentos foram descritos por Mestre Bimba - os “desafiantes” ficam dentro da roda, um deles agachado, enquanto o outro gira em torno, “provocando”, através de movimentos, como se o “chamando”, e aplica alguns golpes com o joelho - a punga[1]:· Pungada na Coxa - também chamado “bate-coxa”, aplicado na coxa, de lado, para derrubar o adversário; segundo Bamba, achou-o parecido com a “pernada carioca” ou mesmo com o “batuque baiano”; · Pungada Mole - o mesmo movimento, aplicado nos testículos, de frente; aquele que recebe, protege “as partes baixas” com as mãos … · Pungada Rasteira/Corda - semelhante à “negativa de dedos (sic)”, de Bimba; · Queda de Garupa - lembra o Balão Costurado, de Bimba.
Anibal Burlamaqui - Zuma[2] - foi um importante inventor desta nova capoeira carioca e afirmou que vários golpes foram extraídos dos “batuques” e “sambas”, como no caso do “baú”. Trata-se de um golpe dado no adversário com a barriga, sendo similar aos movimentos do “samba de umbigada”. O “baú” também era usado durante os “batuques lisos”, segundo Zuma, os mais delicados. O “rapa” havia sido um golpe usado nos “batuques pesados”. Ele também explica os golpes de “engano”, que serviam somente para burlar o adversário.
Fregolão (2008) [4] considera que toda a pluralidade cultural imbricada na constituição destes elementos podem significar manifestações culturais diferentes, conforme a região em que ocorrem. Letícia Vidor de Souza Reis[5], baseada em Câmara Cascudo, afirma em “O mundo de pernas para o ar”, que o “batuque baiano” era uma modalidade de capoeira que irá influenciar muito Manoel dos Reis Machado, o Mestre Bimba, na elaboração da Capoeira Regional Baiana[6].
A afirmação traz um significado especial por tratar do batuque baiano na formação de Mestre Bimba, da qual seu pai era campeão na modalidade, porque implicava num jogo agressivo de pernas contra as pernas do oponente, já como uma forma característica de luta acompanhada por cânticos e instrumentos. Também há apontamentos de que o batuque se disputava entre “pernadas” durante os carnavais cariocas[7]
Mestre André Lacé[8], a esse respeito, lembra que a capoeira tradicional, na Bahia e pelo Brasil afora, tinham a mesma convivência com o batuque. Além do mais há registros autorizados jurando que a Regional nasceu da fusão da Angola com os melhores golpes das lutas européias e asiáticas[9].
Para Mestre Gil Velho[10], ainda hoje muito se discute sobre as origens da capoeira, com as perspectivas do debate atreladas aos diversos discursos que vestem sua imagem moderna, a esportiva:“Parte-se de idéias construídas, e não de práticas sociais espontâneas. Assim, a capoeira carioca está historicamente imbricada às maltas de capoeiras da cidade e à “filosofia da malandragem carioca” dos anos 1800. A baiana, por sua vez, está ligada à cultura negra baiana e especificamente ao candomblé. No Recife, ela se manifesta nas gangues de rua Brabos e Valentões. Esse autor considera que para a análise da essência da capoeira, tem-se que voltar no tempo e considerar o contexto da realidade sócio-cultural de espaços com registros identitários e territoriais dela, destacando-se dois loci: Rio de Janeiro e Recife. Estes dois centros urbanos eram, no século XIX, os maiores pontos de comunicação com o resto do mundo, onde mais circulava gente, idéias, comércio. As zonas portuárias permitiam a troca de idéias entre nichos sócio-culturais semelhantes. A capoeira do século XIX, no Rio, com as maltas de capoeira[11], e em Recife, com as gangues de rua dos Brabos e Valentões, foram movimentos muito semelhantes aos das gangues de savate (boxe francês)[12] em Paris e das maltas de fadistas[13] de Lisboa do século XIX. Chama atenção é que os gestuais dessas lutas também são parecidos, ou seja, os golpes usados na aguerrida comunicação gestual eram análogos:Por outro lado, as perspectivas identitárias e territoriais próprias dão a cada movimento sua sócio-fronteira, com espaços personalizados dos atores em seus próprios contextos sócio-culturais. A capoeira marca sua presença em grupos de sócio-fronteiras a partir de meados do século XIX, no Rio de Janeiro com as maltas e no Recife com as gangues. Nessas cidades, os grupos disputavam os espaços demarcados identitariamente e tinham suas próprias manifestação rítmicas.(CAVALCANTI, 2008)[14]
[1] http://www.jornalexpress.com.br/
[2] http://www.capoeira-fica.org/PDF/Annibal_Burlamaqui.pdf - A Capoeira Desportiva é o mais antigo segmento organizado da Capoeira. Surgiu no Rio de Janeiro após a Proclamação da República, no Brasil, em 1889. É resultante do reaproveitamento da corporalidade da antiga capoeiragem, em seus gestos e movimentos, para a construção de um método ginástico caracterizado por uma forma de luta sistematizada. Em 1904 surgiu um livreto anônimo, sob o nome: Guia do Capoeira ou Gymnastica Brazileira, com algumas propostas deste reaproveitamento, no qual se encontram as letras ODC, que significam “ofereço, dedico e consagro”, no caso “à distinta mocidade”. Foi somente em 1928 que a Capoeira Desportiva foi metodizada e estruturada por seu precursor, Annibal Burlamaqui, conhecido pelo nome de Zuma, o qual elaborou a primeira Codificação Desportiva da Capoeira, sob o título de: Gymnastica Nacional (Capoeiragem) Methodizada e Regrada. Sua obra.
[3] http://4.bp.blogspot.com/_VcRetvJqu_U/SWfpDlAQZ6I/AAAAAAAAC68/mfXW2md8_IM/s1600-h/punga.gif, in Javier Rubiera para Sala de Pesquisa - Internacional FICA
[4] FREGOLÃO, Mário Sérgio. A CAPOEIRA NA HISTÓRIA LOCAL: DA VELHA DESTERRO À FLORIANÓPOLIS DE NOSSOS DIAS. Florianópolis, julho 2008. Nota enviada por Javier Rubiera para Sala de Pesquisa - Internacional FICA el 8/18/2009, disponível em http://www.capoeiraunb.com/textos/FREGOLAO,%20MS%20-%20A%20capoeira%20na%20historia%20local.pdf
[5] REIS, Letícia Vidor de Sousa. O MUNDO DE PERNAS PARA O AR: A CAPOEIRA NO BRASIL. 2. ed. São Paulo: Publisher Brasil/ FAPESP, 1997. v. 1.
[6] Em entrevista ao Jornal Diário da Bahia, na sua edição de 13 de março de 1936, na matéria: “Titulo Máximo da Capoeiragem Bahiana”, Bimba, dá uma longa entrevista acerca de seus desafios públicos na divulgação da chamada Luta Regional. Da mesma destacamos o seguinte trecho: “Falando sobre o actual movimento d’aquele ramo de lucta, genuinamente nacional uma vez que difere bastante da Capoeira d’angola, o conhecido Campeão (Bimba) referindo-se a uma nota divulgada por um confrade matutino em que apparecia a figura do Sr. Samuel de Souza. Do Bimba, de referência aos tópicos ouvimos: Ao som do berimbau não podem medir forças dois capoeiras que tentem a posse de uma faixa de campeão, e isto se poderá constatar em Centros mais adiantados, onde a Capoeira assume aspectos de sensação e cartaz. A Polícia regulamentará estas exibições de capoeiras de acordo com a obra de Aníbal Burlamaqui (Zuma) editada em 1928 no Rio de Janeiro… . Nesta reportagem existem alguns itens que merecem uma atenção mais detalhada:
(a) A confirmação da influencia de Zuma no trabalho implantado por Mestre Bimba;
(b) O reconhecimento de Bimba ao trabalho de Zuma;
(c) A afirmação de Bimba existia Centros mais adiantados em Capoeira que a Bahia, no caso, a Cidade de Rio de Janeiro; (d) O interesse de Bimba pela prática desportiva da “Luta Nacional”;
(e) A integração de seu discípulo nesta inovação;
(f) A adoção do regulamento de Zuma pela direção do Parque Odeon, onde se realizavam tais apresentações;
(g) A liberação pela polícia, daquela forma de luta já existente no Rio de Janeiro.
( Fonte: Rego, op. cit., 1968. pág. 282 e 283; Diário da Bahia. Salvador 13 de março de 1936; Da Capoeira: Como Patrimônio Cultural - Prof. Dr. Sergio Luiz de Souza Vieira - PUC/SP 2004) in http://www.capoeira-fica.org/PDF/Annibal_Burlamaqui.pdf
[7] FREGOLÃO, Mário Sérgio. A CAPOEIRA NA HISTÓRIA LOCAL: DA VELHA DESTERRO À FLORIANÓPOLIS DE NOSSOS DIAS. Florianópolis, julho 2008 disponível em http://www.capoeiraunb.com/textos/FREGOLAO,%20MS%20-%20A%20capoeira%20na%20historia%20local.pdf
[8] LACÉ LOPES, André Luiz. CAPOEIRAGEM NO RIO DE JANEIRO E NO MUNDO. Literatura de Cordel. Rio de Janeiro,2004
LACÉ LOPES, André Luiz. CAPOEIRAGEM NO RIO E NO MUNDO. – histórias & fundamentos, Administração geral, administração pública, jornalismo. Palestras e entrevistas de André Lacé Lopes, edição elertrônica em CD-R. Rio de Janeiro, 2004.
LACÉ LOPES, André Luiz. CAPOEIRAGEM NO RIO DE JANEIRO E NO MUNDO. 2 ed. Amp. E list. Literatura de Cordel. Rio de Janeiro, 2005
LACÉ LOPES, André Luiz. L´ART DE LA CAPOEIRA À RIO DE JANEI, AU BRÉSIL ET DANS LE MONDE. Littérature de Cordel. Rio de Janeiro, 2005
LACÉ LOPES, André Luiz. CAPOEIRAGEM NO RIO DE JANEIRO E NO MUNDO. 4 ed. Literatura de Cordel. Rio de Janeiro, 2007.
LACÉ LOPES, André Luiz. CAPOEIRAGEM. Palestras e entrevistas de André Lacé Lopes, edição eletrônica em CD-R. Rio de Janeiro, 2006.
[9] LACÉ LOPES, André. Correspondência eletrônica enviada em 20 de agosto de 2009 a Leopoldo Gil Dulcio Vaz.
[10] Gil Cavalcanti, o Mestre Gil Velho, geógrafo, é coordenador do Projeto Memorial da Capoeira Pernambucana, do Programa Capoeira Viva, do Ministério da Cultura, 2008[11] As Maltas eram grupos de capoeiras do Rio de Janeiro que tiveram seu auge na segunda metade do século XIX. Compostas principamente de negros e mulatos (os brancos também se faziam presentes), as maltas aterrorizavam a sociedade carioca. Houve várias maltas: Carpinteiros de São José, Conceição da Marinha, Glória, Lapa, Moura entre outras. No período da Proclamação da República havia duas grandes maltas, os Nagoas e os Guaiamús. http://pt.wikipedia.org/wiki/Malta_(capoeira)[12] O Savate ou boxe francês, é um desporto de combate, desenvolvido na França na qual os pés e as mãos são utilizados para percutir os adversários e combina elementos de boxe com técnicas de pontapé. Um praticante de savate é chamado savateur e uma praticante de savate é chamada savateuse. http://pt.wikipedia.org/wiki/Savate
[13] SOARES, Carlos Eugenio Líbano. Dos fadistas e galegos: os portugueses na capoeira. In Análise Social, vol. xxxi (142), 1997 (3.º), 685-713 disponível em http://analisesocial.ics.ul.pt/documentos/1221841940O8hRJ0ah8Vq04UO7.pdf
[14] CAVALCANTI, Gil. Do lenço de seda à calça de ginástica. Ter, 17 de Junho de 2008 16:44 Gil Cavalcanti (Mestre Gil Velho), disponível em http://portalcapoeira.com/Publicacoes-e-Artigos/do-lenco-de-seda-a-calca-de-ginastica
Fonte: http://saladepesquisacapoeira.blogspot.com/2009/01/grabado-de-capoeira-siglo-xix.htmlFuente foto Silat: Martial arts of the world: an encyclopedia, Volume 2 Escrito por Thomas A. Green.
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