Ola amigos do CEV, Encontrei este artigo que julgo ser muito interessante, pois trás a tona um debate bem antigo sobre os critérios para ser um professor de capoeira e sobre a exigência de nível superior para ministrar as aulas de capoeira, onde pelo meu intender julgam mais importante um diploma do que o conhecimento sobre a capoeira e toda sua tradição. Então fica em aberto se alguém quiser comentar fiquem a vontade... abraço...     CAPOEIRA LEIGO E/OU GRADUADO: QUAL FORMAÇÃO? Bruno Rodolfo Martins   Apresentação: O foco desta pesquisa é ampliar o discurso sobre formação de professores, tendo em vista as ingerências do sistema CONFEF/CREFs ao pretender atingir, com a obrigação de filiação ou registro, os professores de educação física, como também os de capoeira. Algumas questões que trabalhamos foram: quais os critérios para ser um professor “bom” ou “qualificado”; a “quem” devemos a escolha destes critérios: ao próprio código formador ou ao sistema?; e qual a necessidade de filiação ao sistema? O tema desta pesquisa é formação. Pretendemos aqui discutir o chamado currículo oculto, em outras palavras, as relações construídas através de um processo de formação. Acreditamos que, ao desenvolver este tema, poderíamos estabelecer algum parâmetro para a elucidação das questões colocadas acerca da regulamentação da educação física – principalmente no que diz respeito à argumentação do sistema CREF/CONFEF e a reserva de mercado que se tenta criar. Esta regulamentação que, segundo Nozaki (2004) “buscou desqualificar a ação dos assim denominados leigos, os quais, muitas vezes eram outros trabalhadores com formação de nível superior – dança, educação artística, música – ou com qualificação referente aos seus próprios códigos formadores - capoeira, yoga, artes marciais, lutas.” (p.26) Esta formação é considerada de grande importância, pois é dela que este sistema se utilizará para, entre outras coisas, submeter aqueles profissionais citados às suas exigências. O público-alvo escolhido são os professores de capoeira. Os “leigos” de que iremos discutir e sua formação. É exposto por aqueles que defendem esta regulamentação que os professores de capoeira (no caso aqui especificado) não teriam formação para atuarem e que, por isso, precisariam da educação física – seja fazendo o curso de graduação, ou um mini-curso oferecido pelo CREF numa tentativa de ratificação de sua conduta pedagógica. Não há critério para esta classificação: quem pode ou não ministrar aulas. Deveríamos definir o que seria educação física, para podermos adentrar na discussão, em seguida, clarificar o que não seria educação física (que não é a proposta deste trabalho). Não há um consenso entre a comunidade sobre estas definições dentre outras que permeiam esta área. É nessa falta de consenso que aqueles que defendem esta regulamentação vêm fortalecer seu discurso, apresentando para todos, um critério para se exercer a profissão – a filiação ao CREF/CONFEF – que por si só não deveria ser encarada como tal! Estar filiado não é saber o que está fazendo... e que nos faz remeter novamente à formação. Não pretendemos estender a discussão em torno do contexto educacional que vivemos. Sabemos da sujeição às normas de agências internacionais, essencialmente de cunhos políticos, ideológicos e financeiros. Iremos nos ater às situações do dia-a-dia, de ordem prática. Quais são as conseqüências destas situações? O que um professor de capoeira precisa saber no momento de seu lecionar? Como ele é reconhecido como professor? E talvez uma das perguntas mais importantes: será que ele é um “leigo” e não sabe o que está fazendo em sua atuação como professor? Todas estas (mas não só estas) questões convergem para a discussão da formação desta pessoa. Como foi a formação deste, que hoje é um professor de capoeira e como medir esta formação? Novamente: não há critério. Não há modelo. Como, então, sujeitar alguém a um curso com intenção normalizadora de sua conduta pedagógica, oferecido pelo Conselho? Ou pior, sujeitá-lo a cursar o ensino superior, para conseguir um grau em educação física? Ora, especificamente com a capoeira, sabemos que a maior parte de sua cultura é/foi transmitida oralmente e por pessoas, professores “mestres”, que possuem ou possuíam um pequeno grau de educação formal, acadêmica, muitos semi ou analfabetos. Seria pretensioso exigir que estes, por meio de cursos rápidos (por exemplo) deixassem de ser “leigos”. Leigos? Bem, se podemos duvidar da orientação pedagógica oferecida por este professor, sobre seus conhecimentos anatômicos, fisiológicos, biomecânicos, de primeirossocorros... como medir isto? E de qual outro profissional não poderíamos duvidar de seu saber? É ingênuo achar também que, estes mesmos professores não estudaram estes assuntos; afinal, não se precisa de uma graduação acadêmica para se estudar ou entender tais conteúdos citados no caso. É sabido também que, se são professores hoje, estes passaram por inúmeras vivências e pelo reconhecimento de seus mestres e da comunidade capoeirística (pelos seus códigos formadores) – ou seja, ele necessariamente precisa saber o que estará fazendo em sua prática pedagógica, caso contrário esta prática não seria legitimada (o que acontece formalmente às vezes, através das federações, confederações, associações de capoeira). Definitivamente não pode ser um “leigo”, como Steinhilber (2005) define sendo “qualquer pessoa, com qualquer formação e, mesmo sem nenhuma formação”. Nenhuma formação? Outra questão: será que aqueles que cursam uma graduação são detentores daqueles saberes “acadêmicos” oferecidos? Dentro deste contexto, em que a educação brasileira passa por uma grande banalização, numa visão mercadológica, onde não mais se preocupa com qualidade de ensino, pesquisa e extensão... podemos duvidar também da formação deste indivíduo. A ênfase que pretendemos trabalhar é que esta formação é pessoal, quem faz a formação é o próprio indivíduo. É o que poderíamos chamar de currículo oculto. Encontraremos bons professores graduados academicamente e nãoacademicamente – como encontraremos também professores ruins, não comprometidos com a prática pedagógica em questão. Há algumas evidências disso no trabalho desenvolvido por Martins (2004), em que não havia grandes diferenças na estrutura da aula, no planejamento, na relação professor-aluno e principalmente nos aspectos motivacionais, que eram o foco da pesquisa – entre as aulas de professores de capoeira sem ligação com a educação física e daqueles que possuíam o curso superior. Em grande parte podemos afirmar que o que predomina é a tradição. Mesmo aqueles que tiveram a oportunidade e o acesso aos “saberes acadêmicos”, souberam aplicá-los sem deturpar as tradições da capoeira. Assim como, aqueles que não tiveram este acesso preocuparam-se em estudar e aprimorar seus conhecimentos pedagógicos, por conta própria. Em ambos os casos, o autodidatismo é o diferencial. O interesse pessoal é crucial para o desenvolvimento de qualquer trabalho. Para concluir: capoeira é ou deveria ser um domínio da educação física e estar sujeita à suposta fiscalização do Conselho? A educação física pode colaborar para o elucidar de várias questões referentes à prática pedagógica, contudo, a capoeira não é e nem pode ser considerada domínio desta, pois exige uma formação específica, única e legitimada, que é a formação “dentro” da capoeira. Como diria Mestre Pastinha (1968), “capoeira só se aprende praticando sob a orientação de um professor competente”. (p.5) Não importa se é “acadêmico” ou não.

Comentários

Por Antônio Sérgio Maritan Junior
em 9 de Março de 2015 às 16:55.

Boa tarde a todos dessa comunidade, fico muito feliz em ver que todos estão preocupados com o tema "Capoeira", vou deixar uma única pergunta: Onde fica o curso de especialização?

Um abraço do colega Antônio Sérgio

Por Thaiany Luna Pires Pereira
em 8 de Julho de 2014 às 07:14.

A graduação em Educação Física fará com que o professor de Capoeira se torne mais competente naquilo que faz, melhores práticas de movimento, execução, melhores aproveitamentos, ensinamentos corretos para as faixas etárias, entre outros. Mas o ponto chave é que para você ser um bom professor, você precisa dominar o que faz, ser experiente, passar por uma aprovação de alguém mais graduado que você, posso me referir a capoeira como um curso de graduação e a pós seria o curso de Educação Física. Conhecimento nunca é demais. A capoeira faz parte da nossa história, tem fundamentos e deveria estar dentro das escolas, pois capoeira e dança, é luta, é arte, é história e nenhuma prática nos traz tanta diversidade de conhecimento considerando todos estes pontos.

Por Luciano de Lacerda Gurski
em 8 de Julho de 2014 às 09:32.

Não acho que seja verdade que a graduação vai necessariamente qualiicar a atuação na capoeira. Há muita gente formada e bastante inconpetente. Além do que deve se discutir que conhecimentos são necessários para se ser um "bom' mestre de capoeira. A Educação Física muitas vezes se mostra arrogante, no sentido de achar que só seus conhecimentos (embora poucos sejam realmente seus) são essenciais e dão "qualidade" a atuação.

Ao meu ver um bom mestre de artes marciais se forma na própria arte, pois o movimento corporal é apenas uma parte desta, e, nem mesmo, a mais importante... Os fatores culturais, éticos, valores morais, história da arte são muito mais importantes, e só podem ser adquiridos com anos de vivência, e até mesmo estudo, que não se dá necessariamente em nível superior...

Não tenho dúvidas que um mestre que pratica a arte durantes anos sabe muito mais que qualquer graduado no ensino superior, enquanto que os graduados sabem muito pouco, ou quase nada, sobre as artes marciais. Basta lembrar que a maioria dos cursos de graduação dedicam uma ou duas disciplinas de 40 horas para as lutas de forma geral...

Poderia-se afirmar então: o mestre poderia ter a formação na arte e mais a Educação Física... É verdade, mas poderia ter formação an arte e na história, na filosofia, em artes... As artes marciais não são apenas gestos motores... Se rum bom mestre vai muito além de conhecer um determinado movimento ou a estratégia para ensinar um movimento... Aliás, acho que a Educação Física poderia aprender como se ensina movimentos com as artes, pois muitas sistermatizaram ao longo de séculos formas de ensino e aprendizagem, que muitas vezes são mais eficientes que as normalmente usadas pela Educação Física...

No fim a Educação Física quer abraçar o mundo para garantir seu emprego, e isto não pode se dar as custas de artes tradicionais como a capoeira. Felizmente a frente unida pelas tradições culturais conseguiu livrar a capoeira, yoga e outras tradições da garra do confef...

A maioria destas artes surgiu antes da Educação Física, é no mínimo arrogância a Educação Física achar que detém maiores ou melhores conhecimentos sobre elas...

Parabéns professor Gabriel por propor o debate.

Abraço!

Por Gabriel Grillo Brum
em 8 de Julho de 2014 às 19:20.

Muito obrigado Thaiany e Luciano, a opinião de vocês é muito importante...    No meu entendimento a educação física deve auxiliar a capoeira e não tentar se impor, pois tentar modifica la ou menosprezar seus mestres usando o termo leigo para rotular um profissional que não possui nível superior, se torna muito injusto. O conhecimento cultural que traz consigo esse personagem é muito grande, pois a capoeira é muito ampla.    Uma faculdade não garante que o aluno apos sua formação seja competente para ministrar aulas de capoeira, ainda mais no nosso pais que a educação não é tao valorizada. Mais uma vez muito obrigado....  grande abraço.  

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Por Adália Táci Pereira Mendes
em 13 de Julho de 2014 às 21:50.

Concordo com você Ghilheme Grilo. A capoeira é muito rica em todos os aspectos e para que se forme  professores de capoeira capacitados em todas os âmbitos da capoeira, desde musica,  ao jogo e luta, demanda de bastante tempo de estudo e pratica. Fato que não é possível em uma disciplina de 6 meses em uma universidade. Acredito que a graduação em educação contribuirá muito com o capoeirista. Mas trago para este debate outra questão que venho observando muito ultimamente, como alguns  " mestres " vendem os  cordões  (graduações) para iniciantes sem qualidade e domínio dos fundamentos e toques básicos da capoeira.

Por Pedro Lucas dos Santos Pêgo
em 9 de Março de 2015 às 15:34.

Pessoal por gentileza, vamos colocar as fontes para podermos ter uma discussão séria sobre teoria e prática.

Para o autor deste texto, cite por favor suas referencias para que possamos adquirir este ocnheicmento também!

Por Luciano de Lacerda Gurski
em 10 de Março de 2015 às 15:20.

Olá Adália, 

sua questão remete a ética profissional, aquilo que o Confef supõe (ou deveria) zelar.

Não tenho dúvidas que nem todos os mestres são éticos, se entendermos ética como conjunto de ações tidas pela sociedade como "corretas".

Assim como não tenho dúvidas que existem muitos professores formados, e com cref, que também não são éticos. A rigor, o próprio confef e cref são anti-eticos, na medida em que usam da persuasão e de ações ilegais para exigir a filiação e cobrança de taxas...

Para o tema proposto aqui, acredito que a formação em nível superior não impediria que os mestres "vendessem" cordas. Isto me parece ser uma influência social por quais passam também outras artes marciais, e tem haver com um processo de mercantilização das práticas corporais, onde tudo, inclusive a pessoas, se tornam coisas, e tem valor na medida em que geram lucro.

Ao pensar nos mestres que vendem cordas, penso também nos cursos de graduação que vendem os diplomas...

Ao meu ver, um dos erros do confef é vincular a ideia de diploma com qualidade, enquanto que na atuação profissional, a qualidade, que é relativa sob o ponto de vista de quem avalia, se dá por uma série de saberes, como indicam Tardif (http://www.ucs.br/etc/conferencias/index.php/anpedsul/9anpedsul/paper/viewFile/668/556) e Pimenta. (http://www.scielo.br/pdf/es/v20n68/a13v2068.pdf ), que embora pensem sobre a formação de professores, indicam elementos importantes para a formação dos profissionais de maneira geral.

Para contribuir com o debate deixo outra questão: os cursos de graduação são todos iguais? Os graduados em educação física, de qualquer lugar do país, possuem os mesmo conhecimentos e competências?

Abraço!


Para comentar, é necessário ser cadastrado no CEV fazer parte dessa comunidade.