Tenho a minha frente um exemplar do DICIONARIO DE CAPEOIRA, de Mano Lima - (Brasilia: Conhecimento, 2007; 3a. ed. rev. e ampl). Encontrei-o em uma livraria aqui em são Luis do Maranhão. Mestre André Lacé já o havia recomendado. Mas para quem m ora na periferia, lá no alto do mapa, no chamado Norte de antigamente, Nordeste de hoje, a comunicação é um pouco lenta. A telefonia celular, por exemplo, não funciona a contento. A Internet banda larga nem se fala...

Como disse, já havia a recomendação do Mestre André, do Quilombo do Leblon-RJ; André Lacé Lopes é uma referencia na capoeira carioca... No prefácio desta terceira edição - revista e ampliada - quem a assina é o Carlos Cavalheiro, de Sorocaba. o que por si só já recomenda a obra, alé, claro, do aval do André... o prefácio da segunda edição - 2006 - vem assinada pelo Luiz Renato Vieira. Sem cometários... já o da primeira edição, inverno de 2005, é o Ministro de Esportes quem assina... deixa para lá...

O processo de construção, na apreentação, deixa claro que se trata de uma obra em construção, e coletiva... boans referencias, uma boa filmografia, verbetes concisos ... mas contém erros, que não deveriam mais aparecer nesta terciera edição - ou aparecem apenas nela, não vi as outras duas, como a de dar data de nascimento de Bimba em 1990...

Mas o que quero comentar, aqui, são os erros referentes ao Maranhão. Mestre Sapo, por exemplo, é dado como tendo chegado por aqui na década de 1950... Anselmo Barnabé nem havia nascido...

"Sapo, Mestre - s.m. Discipulo de Mestre Canjiquina, mudou-se para o Maranhão no final da década de 1950 e lá fundou a 1a escola de capoeira de São Luís (MA). É considerado por alguns como o precursor da capoeira naquele estado (Fernandez, 2005)." (p. 180).

1- vamos começar por ’precursor da c apoeira naquele estado":

1884 - em Turiaçú é proclamada uma Lei – de no. 1.341, de 17 de maio – em que constava: “Artigo 42 – é proibido o brinquedo denominado Jogo Capoeira ou Carioca. Multa de 5$000 aos contraventores e se reincidente o dobro e 4 dias de prisão”. (CÓDIGO DE POSTURAS DE TURIAÇU, Lei 1342, de 17 de maio de 1884. Arquivo Público do Maranhão, vol. 1884-85, p. 124)

 

CARIOCA” - uma briga-de-rua, portanto capoeiragem (no sentido apresentado por Lacé Lopes) – outra denominação que se deu ‘a capoeira, enquanto luta praticada no Maranhão, no século XIX e ainda conhecida por esse nome por alguns praticantes no início do século XX.

 

1820 – registra-se nesta data referência a “punga dos homens”, jogo que utiliza movimentos semelhantes à capoeira.

1829 - registram-se certas atividades lúdicas dos negros. Nesse ano é publicado no jornal “A Estrela do Norte” a seguinte reclamação de um morador da cidade: “Há muito tempo a esta parte tenho notado um novo costume no Maranhão; propriamente novo não é, porém em alguma coisa disso; é um certo Batuque que, nas tardes de Domingo, há ali pelas ruas, e é infalível no largo da Sé, defronte do palácio do Sr. Presidente; estes batuques não são novos porque os havia, há muito, nas fábricas de arroz, roça, etc.; porém é novo o uso d’elles no centro da cidade; indaguem isto: um batuque de oitenta a cem pretos, encaxaçados, póde recrear alguém ? um batuque de danças deshonestas pode ser útil a alguém ? “(ESTRELLA DO NORTE DO BRASIL, n. 6, 08 de agosto de 1829, p. 46, Coleção de Obras Raras, Biblioteca Pública Benedito Leite)

 

Comentários

Por Leopoldo Gil Dulcio Vaz
em 22 de Setembro de 2009 às 10:23.

 

1843 - o Diretor da Casa dos Educandos Artífices do Maranhão em relato ao Presidente da Província informava que havia “um outro problema”: a segurança dos alunos e do patrimônio da casa, em razão da existência de vários capoeiras, entre eles negros escravos, alguns fugitivos do interior da província e outros alforriados, o que resultava em atos de violência cotidianos, pela falta de intervenção policial no local

 1863 – Josué Montelo, em seu romance “Os degraus do Paraíso”, em que trata da vida social e dos costumes de São Luis do Maranhão, fala-nos de prática da capoeira neste ano de 1863 quando da inauguração da iluminação pública com lampiões de gás; ao comentar as modificações na vida da cidade com as ruas mais claras durante a noite: "Ninguém mais se queixou de ter caído numa vala por falta de luz. Nem recebeu o golpe de um capoeira na escuridão. Os antigos archotes, com que os caminhantes noturnos iluminavam seus passos arriscados, não mais luziram no abandono das ruas."

ANOS 30/40 -Mestre Firmino Diniz – nascido em 1929 – que é considerado o mestre mais antigo de São Luís, teve os primeiros contatos com a capoeira na infância, através de seus tios Zé Baianinho e Mané. Lembra ainda de outro capoeirista da época de sua infância, Caranguejo; Mestre Diniz teve suas primeiras lições no Rio de Janeiro com “Catumbi”, um capoeira alagoano. Diniz era o organizador das rodas de capoeira e foi um dos maiores incentivadores dessa manifestação na cidade de São Luís.

 

ANOS 60 – “Renascimento” da capoeira em São Luís, com a chegada de ROBERVAL SEREJO no início dos anos 60. Criação do Grupo “Bantus”, do qual participavam, além de Mestre Roberval Serejo (graduado por Arthur Emídio); Mestre Diniz (aluno de Catumbi, de Alagoas), Mestre Jessé Lobão (aluno de Djalma Bandeira), de Babalú; Gouveia [José Anunciação Gouveia]; Ubirajara; Elmo Cascavel; Alô; Patinho [Antonio José da Conceição Ramos]; e Didi [Diógenes Ferreira Magalhães de Almeida].

 

1965 – Mestre Paturi (Antonio Alberto Carvalho, nascido em 1946, o Mestre mais velho em atuação, hoje), inicia-se na Capoeira com os Mestres Manoelito e Leocádio, e após a chegada de Mestre Sapo, passa a treinar com este. Foi o primeiro a registrar uma Associação de Capoeira (?).  

 

1966 - Mestre Canjiquinha [Washington Bruno da Silva, 1925-1994], e seu Grupo Aberrê passam pelo Maranhão, apresentando-se em Bacabal, no teatro de Arena Municipal; e em São Luís do Maranhão: Palácio do Governador; Jornal Pequeno; TV Ribamar; Residência do Prefeito da capital; Ginásio Costa Rodrigues. (in REGO, Waldeloir. Capoeira Angola: ensaio sócio-etnográfico. Salvador :Itapuã, 1968). Acompanhavam Mestre Canjiquinha Sapo [Anselmo Barnabé Rodrigues]; Brasília [Antônio Cardoso Andrade]; e Vitor Careca, os três, ‘a época, menores de idade.

 

1968Mestre Sapo retorna ao Maranhão, para ensinar capoeira. Vai se tornar a maior referência da capoeira do Maranhão, formando inúmeros alunos e graduando vários mestres, até sua morte, em 1982.

 

ANOS 1970 - A partir de 1970, Mestre Sapo começou a formar seu grupo de capoeira, passando a ministrar aulas em uma academia de musculação, localizada na Rua Rio Branco; é também nesse ano que se dá a morte de Roberval Serejo; seus alunos, da academia Bantú, passam a treinar com Mestre Sapo.

 

Em uma de suas viagens, no final dos anos 70, Mestre Sapo, conheceu o Mestre Zulú, em Brasília. Foi quem o graduou Mestre. A partir de então, Mestre Sapo implantou em São Luís o sistema de graduação, através de cordas ou cordel, seguindo as cores adotadas pelo Mestre Zulú. Mas quem o iniciou na capoeira foi Mestre Pelé de Salvador [Natalício Neves da Silva, nascido em 1934]

 

1979 – Mestre Robervaldo Sena Palhano funda, no bairro da Alemanha, a “Associação Cativos de Capoeira”, com estilo e características próprias, com o objetivo de divulgar e motivar a prática da capoeira;

BOX – GENESE DA CAPOEIRA EM SÃO LUIS DO MARANHÃO

Manoelito

Leocádio

 

 

Zé Baianinho

Mané

         

 

GRUPO BANTUS

|

(Arthur Emídio)

Roberval Serejo

(Djalma Bandeira )

Jessé Lobão

(Catumbi)

Firmino Diniz

|

Babalú

Patinho

Ubirajara

Manuel Peitudinho

 

Elmo Cascavel

Alô

Gouveia

Didi

|

ABERRÊ

|

 

CANJIQUINHA

 

                                                                         |

Brasília

SAPO

Vítor Careca

|

 MESTRE PATINHO

|

Costa Rodrigues

Academia Senzala

Parque do Bom Menino

Pró-Dança

Lítero

Gladyz Brenha

Marquinhos

Tião Carvalho

Bigu

Gavião

Jacaré

Robert

 

Carlos César

Brenha

Neto

|

LABORARTE

|

Laborarte

Mandigueiros do Amanhã

Centro Matroá

Escola Criação

Maré do Chão

N´Zambi

Brinquedos de Angola

Nelsinho

Klebinho

Bamba

Marco Aurélio

Same

Serginho

Marinheiro

Nestor

Elma

Frederico

|

CENTRO CULTURAL MESTRE  PATINHO

 

 

 

 


 

Acinho de Jesus

Alex

Cabeludo

Domingos de Deus

Euzamor

                                           |                                                                                                                                       |

Pudiapen

 

 

 

Águia

Sidnelson

 

 

 

 

Madeira

                                                                                                                                                                                   |

 

 

 

 

Abelha

Paulinho

Gavião

Arara

Merão

 

 

 

 

King

 

 


 

                                                                                                                

Paturi

De Paula

Dominguinhos

Pirrita

Raimundão

Açougueiro

                                            |                                     |                   |      

Ciba

 

Pedro Soares

Canarinho

Negão

Vânio

 

Socó

 

 

 

 

 

Generoso

 

 

Valdeci

Índio Maranhão

             

                                                                                                                                  

Cacá

Faquinha

(Canjiquinha)

Evandro

(Bimba)

Edy Baiano

Camisa

Bartô

Ribaldo

Pai Velho

Camisa

Rui Pinto

(Burguês)

Fuzuê

(CBC-RJ)

Sena

        |                 |              |            |            |             |            |              |               |             |

Mirinho

Baé

Bodinho

Pezão

Chiquitita

Cimbar

Juruna

Euzamor

Frazão

Magno

Mizinho

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Tutuca

 

 

 

 

 

 

 

 

 

                                                      |                                      |

 

 

 

Chicão

 

 

Curoja

 

 

 

Graúna

 

 

 

 

Mano Lima, permita-me chama-lo assim, vou enviar a seu endereço eletronico o material que tenho disponivel, inclusive sobre a Carioca e a Guarda Negra...

1877 – MARTINS (1989, in MARTINS, Dejard. ESPORTES: UM MERGULHO NO TEMPO. São Luís: (s.n.), aceita a capoeira como o primeiro “esporte” praticado em Maranhão tendo encontrado referência à sua prática com cunho competitivo por volta de 1877. "JOGO DA CAPOEIRA "Tem sido visto, por noites sucessivas, um grupo que, no canto escuro da rua das Hortas sair para o largo da cadeia, se entretém em experiências de força, quem melhor dá cabeçada, e de mais fortes músculos, acompanhando sua inocente brincadeira de vozarios e bonitos nomes que o tornam recomendável à ação dos encarregados do cumprimento da disposição legal, que proíbe o incômodo dos moradores e transeuntes". (MARTINS, 1989, p. 179) 

 

 

Por Leopoldo Gil Dulcio Vaz
em 22 de Setembro de 2009 às 10:22.

CONTINUANDO...

 

1835 - na Rua dos Apicuns, local freqüentado por "bandos de escravos em algazarra infernal que perturbava o sossego público", os quais, ao abrigo dos arvoredos, reproduziam certos folguedos típicos de sua terra natural:- “A esse respeito em 1855 (sic) um morador das imediações do Apicum da Quinta reclamava pelas colunas do ’Eco do Norte" contra a folgança dos negros que, dizia, ’ali fazem certas brincadeiras ao costume de suas nações, concorrendo igualmente para semelhante fim todos pretos que podem escapar ao serviço doméstico de seus senhores, de maneira tal que com este entretenimento faltam ao seu dever...’ (ed. de 6 de junho de 1835, S. Luís.” (ECCHO DO NORTE – jornal fundado em 02 de julho de 1834,  e dirigido por João Francisco Lisboa, um dos líderes do Partido Liberal. Impresso na Typographia de Abranches & Lisboa, em oitavo, forma de livro, com 12 páginas cada número. Sobreviveu até 1836  in VIEIRA FILHO, 1971, p. 36).


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