Pessoal, tem uma peça de história no Blog do Jãozin (e honra para o CEV pela escrito dos 3 grandes professores). É bom ler e avisaar a turma das tricheiras imaginárias (e convenientes)

Jorge Bento e Manuel Sérgio

Jorge Bento e Manuel Sérgio: exerceram papel fundamental na Educação Física brasileira, ambos batizando-a com nomes diferentes: do lado de Manuel Sérgio, Motricidade Humana; do lado de Jorge Bento, Desporto. Amissíssimos do Brasil e dos brasileiros, exerceram, entre eles, antagonismos e animosidades. Professores portugueses e brasileiros pegaram carona na querela. Acontece que, por exemplo, no caso do Prof. Manuel Sérgio, seu papel no Brasil é bastante diferente de seu papel em Portugal. Veio ao Brasil em um momento crucial de mudanças: nossa ditadura perdia fôlego e uma outra educação era necessária, e ele participou da nova construção. Manuel Sérgio reivindica uma nova ciência, a da Motricidade Humana. Há algo para ele que ainda não foi pesquisado, qual seja, a faculdade humana de se mover para realizar a vida. Exceto, por exemplo, fungos e plantas, os seres vivos, de modo geral, realizam a vida movendo-se. No caso dos homens, há um conjunto muito particular de coordenações, a que chamamos motricidade, que realiza a intenção de viver. Por exemplo, neste instante, posso escrever tudo isto sem que seja necessário pensar sobre cada gesto de meus dedos, porque tenho a intenção de escrever isto, e essa intenção me anima e me orienta, bem como quando ando pelas ruas, ou quando converso com alguém. Essa maneira especial de viver, essa maneira humana, é o que Manuel Sérgio chama de Motricidade Humana, e isto ainda não teria sido investigado. Dentro desse campo haveria uma pedagogia que educaria  com base nesses conhecimentos, e que se chamaria Educação Física ou Educação Motora, talvez Educação Corporal.

Da parte de Jorge Bento, a questão é mais aparentemente cultural, pois trata-se de considerar os conjuntos motores que dão vazão à dimensão lúdica humana. Essas manifestações culturais, particularmente lúdicas, são chamadas por Bento de desporto. Ou seja, desporto, para ele, não é apenas aquilo que atletas praticam regulados por regras internacionais, mas sim todas as nossas manifestações lúdicas, tais como as brincadeiras infantis, nosso circo, nossas festas, nossas danças. E tudo isso, se tem sido investigado pela antropologia, pela sociologia, pela psicologia, entre outras ciências, enquanto manifestações lúdicas não, falta-lhes ciência. Haveria, portanto, uma ciência que investigaria o desporto, não do ponto de vista antropológico, ou sociológico, mas do ponto de vista do desporto, do lúdico. Para Bento, o desporto não é sociologia, não é psicologia, não é antropologia; o desporto é desporto. De fato, pouco se sabe sobre o lúdico humano, e o que há, raro, é pobre de modo geral.

Muitos se opuseram a Jorge Bento e a Manuel Sérgio, no Brasil e em Portugal. Quase sempre, por paixão, por não gostar de um ou de outro, mais que por entreveros intelectuais. Vi muita gente dizer que não gostava de Manuel Sérgio, de suas ideias, mas sem opor-lhes qualquer coisa razoável. Sobre Bento também.

Esse é um problema do mundo acadêmico: as divergências acabam descambando para o lado pessoal e o debate fica pobre. Nós, os brasileiros, que saibamos ser gratos pelo amor que esses pensadores têm pelo Brasil e pelos brasileiros e que saibamos aprender com as tantas lições que já nos deram.

Ainda sobre Jorge Bento e Manuel Sérgio

Manuel Sérgio e Jorge Bento devem ser visitados frequentemente pelos brasileiros da Educação Física (e, gostaria, por brasileiros de outras áreas), tal a importância que tiveram nos rumos em nossa área. Sugiro lerem os comentários feitos pelo Prof. Jorge Bento nos espaços reservados aos comentários. O Prof. Jorge Bento esclareceu, nos comentários, que minha interpretação quanto às suas ideias sobre desporto e ciências do desporto, não correspondem ao que ele, de fato, pensa. Na verdade, conheço melhor o pensamento do Prof. Manuel Sérgio que o do Prof. Jorge Bento. Creio que ele discorda, acima de tudo, do que falei sobre sobre o lúdico, porque, de resto, pouco falei sobre suas ideias. Mas isso não tem muita importância, porque sua influência no Brasil deve-se, não só às suas teorias, mas também ao seu modo de conduzir-se em nossa profissão e pelo maneira como compartilhou ideias com os brasileiros ao longo de tantos anos. O Prof. Bento esclarece também que não há nenhuma animosidade entre ele e o Prof. Manuel Sérgio, nenhuma querela. Eu não disse que há, eu disse que houve e, de fato, muitos anos atrás, era o que percebíamos, nós que convivíamos com ambos.

De minha parte, aprendi muito do que sei conversando com o Prof. Bento, e não só para a Educação Física, mas também para minha vida pessoal. Foi meu companheiro de muitas conversas, fui seu ouvinte de muitas poesias, partilhamos os livros de Miguel Torga, e trocamos nossos amores pelo Brasil e por Portugal.

Mesmo sabendo que Jorge Bento e Manuel Sérgio, meus queridos mestres, têm mantido conversas entre eles, eu gostaria de vê-los no Brasil participando de um colóquio, onde e quando for possível. Fica aí a sugestão.

Comentários

Agradeço ao João a referência elogiosa que faz ao meu nome. Isso é o essencial. Quanto à apresentação das linhas e referências estruturantes do meu pensamento e da minha visão, o texto do João contém alguns desvios substanciais. Todavia o importante é a intenção que o orienta, assim como o apreço recíproco que cultivamos. Muito obrigado pela sua generosidade!
Um abraço cordial para ele e para todos os leitores.

Comentários

Por Laercio Elias Pereira
em 1 de Junho de 2010 às 19:19.

Ops, Não coube tudo na nota anteriuor :-(. Laercio

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Muito agradeço ao João a referência elogiosa ao meu nome. Tenho por ele uma profunda amizade e um superior apreço. Isso é o essencial e vale para descontar as imprecisões do texto, tais como:

1. Não tenho qualquer animosidade com o Prof. Manuel Sérgio. Neste fim-de-semana estive com ele num simpósio realizado na ilha da Madeira. Não somente almoçamos e jantamos lado a lado, como também tivemos longas e íntimas conversas, marcadas por um registo de cordialidade e consideração recíprocas.

2. O meu entendimento do desporto e das ciências do desporto não corresponde à interpretação que o João apresenta no texto. O desporto e as restantes formas culturais do movimento humano não são categorias de interpretação e esclarecimento de nada; ao invés, carecem de categorias externas para a sua compreensão.

Todavia, como disse acima,quero sobretudo expressar ao João a minha gratidão pela referência elogiosa ao meu nome. Bem haja!
Um abraço cordial aos leitores.
Jorge Bento


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