Tenho visto a repercussão das ações de medidas socioeducativas empreendidas pelo Promotor de Justiça, o Dr Sérgio Fernando Harfouche (MS). Estas consistem em diante de uma ação de indisciplina ou violência do aluno no âmbito da escola em relação ao colega ou ao professor, o mesmo é responsabilizado por elas e deve cumprir algumas medidas disciplinares determinadas pela direção a partir de um aconselhamento com o promotor e em comum acordo com os pais. Estes por sua vez já foram participados dessas ações por meio de reuniões promovidas na escola juntamente com o promotor. As medidas aplicadas referem-se a pequenos trabalhos na própria escola como, lavar as canecas do lanche, limpar a areia do parquinho, lavar a quadra, etc. Essas ações tiveram início em abril de 2009 num evento na Assembléia Legislativa onde Sérgio Harfouche apresentou um plano de ação a diretores e coordenadores pedagógicos com o objetivo de mudar a realidade da maioria das escolas de Mato Grosso do Sul, nas quais se observam gritos, desrespeito, intimidação e ameaças, danos ao patrimônio público e agressões físicas entre alunos e contra funcionários destes estabelecimentos de ensino.
Segundo a reportagem do Fantástico do dia 11/4/2010, são medidas que têm obtido resultados efetivos na diminuição dos índices de violência nas escolas. Num percentual de 60% de redução da violência nos três primeiros meses de aplicação.
Quero aqui externar a minha admiração por esse promotor, principalmente porque sua preocupação foi com ação preventiva e não somente com a execução das medidas, quando os adolescentes já estão em conflito com a lei. Mas, essa ação me leva a algumas reflexões...
A primeira reflexão que faço é a de que não seria também a própria aula uma das motivações à indisciplina?
Digo isso porque tenho presenciado aulas sem desafios nem descobertas; aulas que acontecem o tempo todo somente na sala e na própria escola; aulas em que copiar do quadro é a maior dificuldade empreendida pelo aluno; aula em que interpretar o texto se resume a responder questionários; aulas onde o professor prá conseguir a atenção dos alunos, bate no quadro, na mesa, grita, numa agressividade que anula qualquer ação participativa dos alunos; aulas de educação física que se resumem a futebol; aula em que o instrumento que mais se aproxima da tecnologia é o giz e o livro, e aqui não é porque os recursos tecnológicos são inexistentes na escola, não! Eles estão lá, mas a maioria dos professores é resistente a eles ou incompetentes para lidar com eles. Vejo a cultura jovem com excesso de informação e pouco conhecimento, extremamente ligado à imagem principalmente àquelas que apelam para emoções fortes como velocidade e violência. O professor tem que se aproximar dessas tecnologias sob pena de não cumprir seu papel de articular a cultura elaborada com a cultura experiencial dos alunos, se negar isso, a escola deixa de ser escola.
Outra reflexão que me faço é se a violência acontece somente nas escolas públicas ou se somente são evidenciadas nas escolas públicas? Será que o professor é só desrespeitado nesse âmbito escolar? Será que a agressão ao colega, o bullyng, acontece somente nas escolas públicas? Será que o compromisso de formação de “melhores cidadãos” é somente da escola pública?
É curioso como as ações de diversas instituições, sejam governamentais ou não, são somente para a classe baixa sob a égide do “risco social”. Eu considero em risco social todo jovem cujos pais lhe dão mesada e nem ao menos verificam com o que foi gasto; ou ainda os deixam na porta do shopping sem ao menos conhecerem seus amigos; e tem também àqueles que com acesso irrestrito à internet não saem de casa e seus pais nem ao menos imaginam qual a concepção de mundo que esse jovem está formando; existem àqueles que emprestam os carros dos pais e sob efeito do álcool cometem irresponsabilidades, inclusive homicídios e não são responsabilizados pelos seus atos até porque na maioria das vezes são filhos de juízes, políticos, desembargadores... Isso na minha concepção é risco social. Quem cuidará desses jovens?
A última reflexão a que me proponho é sobre como que esse plano de ação tem sido socializado com os pais pelos diretores das escolas. Alguns diretores estão gerindo sua escola, de forma arbitrária e desnecessária, mas dizem estarem embasados na fala do Promotor. Por ex: o aluno que chega atrasado terá que varrer o pátio da escola. Ora às vezes a causa pode ser o atraso do ônibus, dos pais, etc. Se o jovem depende dos ais para chegarem a escola e estes se atrasaram a quem cabe a medida disciplinar? Não penso que essa medida disciplinar ajudaria na formação de melhores cidadãos. O desconhecimento dos alunos do Regimento Escolar, na maioria das vezes construídos sem a participação deles, também contribui para algumas ações arbitrárias dentro da escola. Por trás de atitudes disciplinares geralmente se escondem os esquemas “autoritários” que regem muitas vezes nossa sociedade. É importante delinear o conceito de disciplina nesse âmbito em que ela está sendo exigida, a Escola.
Quero aqui citar Celso Antunes, quando sugere um conceito mais amável de disciplina como, por exemplo, "Disciplina é uma relação de afeto e respeito, uma ação recíproca de cumprimento de normas". O autor afirma que o início dessa construção deve se manifestar por meio de um acordo entre alunos e professores, algo como um "contrato" em que ambas as partes discutem e constroem seu papel e sabem como acatar sanções na eventualidade de um descumprimento. Dessa forma, conclui o autor:
“quando os professores de uma unidade escolar sentam-se com seus alunos e desconstroem e sabem reconstruir a plenitude da significação e dos tipos de disciplina, não apenas a aula corre mais facilmente e a aprendizagem se concretiza de maneira mais saborosa como estudantes e mestres descobrem que, reconhecendo a disciplina como ferramenta essencial às relações interpessoais, aprendem autonomia, exercitam a firmeza e conseguem, com mais dignidade, construir o caráter.
Dessa forma trago estas reflexões acerca das ações empreendidas nas escolas, com a intenção de contribuir na construção da disciplina nesse espaço tão importante na vida do jovem.
Referências
(http://www.hojems.com.br)
http://rmtonline.globo.com/addons/video_player.asp?em=3&v=18432
ANTUNES,Celso. Qual disciplina deseja quem reclama da indisciplina? Disponível em:http://www.educacional.com.br/articulistas/celso_bd.asp?codtexto=613 acesso em 20/04/2010.
Comentários
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Nei Alberto Salles Filho
em 23 de Abril de 2010 às 08:59.
Olá Leize,
Muito clara sua exposição e as reflexões sobre a questão.
Reforço a questão da indiciplina como resposta a uma escola que não tem como proposta "o mundo real", ou seja, protagonismo, atitudes, até mesmo a mobilização para cuidado com a comunidade escolar.
Mesmo considerando a proposta um boa alternativa e sem querer ser aquele que sempre encontra defeitos... eu perguntaria.... lavar copos, limpar parque e quadras são "castigos" ??? Não poderiam ser ações propostas como cultura escolar? A violência diminiu, ponto! Isso é ótimo, ponto. Mas, mostra que ninguém quer limpar nada mesmo, muito menos pagar o mico de cuidar da escola. Seria interessante cruzar os dados com a violência comunitária, será q muda comportamento? E os jovens que cumpriram a medida socioeducativa, o que dizem...
Abraços
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Leize Demétrio da Silva
em 23 de Abril de 2010 às 10:47.
Grata Nei pela participação, e tbém penso como vc...a escola está distante do jovem. Ate podemos citar alguns professores que procuram desenvolver um trabalho diferenciado mas, na maioria das vzs são barrados pela equipe gestora.
No depoimento dos jovens que cumpriram as medidas disciplinares nota-se uma mudança de atitude, mas é importante realmente pesquisar a violência na comunidade e cruzar esses dados.
Um grande abraço.
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Carolina Professora
em 27 de Abril de 2010 às 15:52.
Nossa, que barbaridade! è por isso que a educação está do jeito como está. O professor fica contra o próprio professor. Concluo então se o aluno não quer nada com a escola, a culpa é do PROFESSOR. È POR ISSO QUE ESSA CARREIRA ESTÁ FADA A EXTINÇÃO. Os bons vão abandonando e ficam os babacas que não tem peito pra educar ninguém, não se indispoem com ninguém, e vão levando a grande ZONA que se tornou a escola! Ora a violência ESTÁ NA SOCIEDADE e não na escola pública ou particular. Agora a escola tem o papel de EDUCAR essa gente, e se a escola se abstem dessa tarefa, quem irá fazê-lo. Gostaria que você fosse pra uma escola de PERIFERIA em São Paulo ou qualquer lugar do Brasil e enfrentasse uma sala indisciplinada com TECNOLOGIA E SUA IDEOLOGIA. Faça a experiência e volte aqui para relatar. Vá para uma escola problema da ZONA SUL de São Paulo, e volte pra contar a história! Como você foi recepcionada!
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Leize Demétrio da Silva
em 5 de Maio de 2010 às 13:35.
Oi Carolina...sou grata pela sua participação.
Quero lhe dizer, que o Perfil do CEV é pouco espaço para contarmos nossa história, não é mesmo? Já trabalhei, sim em comunidades violentas. Uma delas era tão longe da minha casa que tomava três ônibus para chegar, mas eu gostava tanto de trabalhar lá que até nos domingos,próximos das competições, eu ia dar treinamento. Nela eu dava aula do 6º ao 9º e treinamento. Não era raro, os alunos encontrarem no trieiro por onde passavam para chegar até à escola, cadáveres jogados pelo caminho. Durante minhas aulas os alunos que não eram da escola (na maioria em conflito com a Lei, mas amigos dos alunos assistiam sentados no muro e vez ou outra, participavam. Tive somente UM aluno que me desrespeitou a ponto e ter que ter a intervenção da equipe técnica da escola. A grande maioria amava minhas aulas. Eles eram co-participantes nas decisões que eu tomava em relação ao que trabalhávamos; saíamos para parques da cidade (vc acredita que havia adolescentes que nunca tinham ido ao centro da cidade?) a época usava a tecnologia disponível na escola: TV e vídeo. Assistíamos partidas de basquete da NBA e analisávamos depois; campeonatos de ginástica; de atletismo...e posso te garantir que nunca coloquei lá um filminho prá matar o tempo, como já vi muitos fazerem por aqui. Trabalhei também nas UNEI’s e lá desenvolvi projetos esportivos para estupradores, homicidas, traficantes, e posso te dizer que minha maior luta não foi com os adolescentes, mas sim com muitos agentes que não acreditavam na recuperação do adolescentes e não dificultavam a saída deles para participarem dos projetos. Ainda assim, com o apoio dos psicólogos e terapeutas promovemi uma “Olimpíada” onde reunimos todas as UNEI’s do estado e nela não tivemos nenhuma ocorrência de violência ou fuga, promovemos também festival de teatro, entre outros. Posso lhe garantir que a METODOLOGIA e o trato com os alunos fizeram a diferença no comportamento do grupo.
Não posso, como você, afirmar que somente os professores babacas é que ficaram, mas sim aqueles que acreditam no ideal de educar. Só que muitos não perceberam que a sociedade é outra, os valores transmitidos pela mídia, podem e DEVEM ser contestados, não são verdades absolutas. Mas o aluno deve ser convencido disso num nível de consciência e não de autoridade, deve tirá-lo da menoridade intelectual por meio de argumentos, de metodologias diferenciadas, dinâmicas, por meio do amor, do acolhimento.
Sou bem pontual no texto, refiro-me a uma ação que está acontecendo aqui no meu estado. Desconheço a sua realidade, não estou “contra o professor”, como vc afirma no texto, mas tudo que falei em relação na primeira reflexão é uma realidade aqui na minha cidade, posso até apontar o professor, mas não é o objetivo do texto, mas nos levar a um “mea culpa” também. Não acredito que somos de todo isentos dessa culpa.
E em relação às escolas particulares, retomo que fui bem pontual, aqui essas ações acontecem somente na escola pública, mas os fatos de violência acontecem também nas escolas particulares, então porque a medidas serem aplicadas somente aos alunos das escolas públicas?
Estou na educação e acredito no ensino público, mas me revolto também com professores que não acreditam mais, mas não tem coragem de sair, e não desenvolvem um trabalho comprometido com a emancipação do aluno.
Fico muito grata por você expor sua opinião e estou à disposição para ampliarmos o debate. Se quiser pode usar meu e-mail.
Grande abraço, Leize.
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