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Laércio
É preciso repensar a sala de aula
Prof. Dr. Silvio Meira - professor emérito da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE)
Palestrante do Seminário de Desenvolvimento Acadêmico fala sobre a necessidade de mudanças no sistema educacional clássico
Nos dias 1º, 2 e 3 de março a PUCRS promove o Seminário de Desenvolvimento Acadêmico, evento voltado para professores e técnicos administrativos da PUCRS.
O tema em destaque será “A Inovação na Educação Superior”, abordado pelo professor emérito da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Silvio Meira. Para Meira, inovação é mudança e tem impacto na vida das pessoas. “Tudo ao redor da educação, em todos os níveis, está mudando muito, e muito rapidamente. Se a educação não mudar, se os comportamentos associados ao processo educacional não mudarem, todas as instituições, estruturas e organizações, métodos, processos e conteúdos educacionais que conhecemos (e admiramos) se tornarão irrelevantes porque deixarão de atender a demanda do seu contexto. Ultrapassadas, obsoletas, elas serão substituídas por outras formas e locais de aprendizado”, afirma.
Ao falar em inovação na sala de aula, Meira aponta que o principal problema a ser resolvido no processo de aprendizado é o engajamento dos alunos. “Há algo essencialmente errado na escola como ela existe hoje. À medida que o tempo passa, os alunos, que deveriam estar cada vez mais envolvidos no processo de aprendizado, estão cada vez mais distantes. Os resultados estão aí, nas avaliações do sistema de ensino público e privado”, comenta. A mudança para Meira não depende de novos investimentos ou tecnologias de ponta, mas de uma revisão das bases sobre as quais o sistema educacional está assentado. “É preciso centrar o sistema no aprendiz, para que os resultados, através dele, fluam para a economia e sociedade como um todo”, complementa.
Para a educação superior, Meira aposta em modelos de comunidades de aprendizado, e não de ensino, centradas no aluno, no contexto da vida real, fora da escola. “No dia em que mudarmos a estrutura do ensino superior de disciplinas isoladas, de outras disciplinas e do mundo ao redor, e passarmos a ter, em larga escala, um aprendizado em contexto e contínuo, por e para toda a vida, vamos mudar o mundo”, garante.
Por que a inovação na educação é fundamental para o futuro do País, da sua democracia e da sociedade?
Parafraseando uma definição de Peter Drucker, pode-se dizer que inovação é a mudança de comportamento de agentes, em um dado contexto, como participantes de qualquer ação. Se o contexto é a sociedade, sabemos que ela está mudando. Se são os mercados, idem. Se são as profissões, elas mudaram muito mais nos últimos 50 anos do que nos 200 anos anteriores. E mudarão mais nos próximos 25 do que mudaram nos últimos 100, talvez 200 anos. Ao contrário do que muitos, mesmo dentro do ambiente educacional, pensam e professam, o essencial no processo educacional não é o ensino, mas o aprendizado. Se eu puder aprender fora do sistema, de forma mais eficaz e eficiente, por que é mesmo que eu iria perder meu tempo com o sistema?
É possível inovar em sala de aula sem recorrer às tecnologias?
É preciso repensar a sala de aula. Talvez até acabar com a sala e a aula. Já há um número de escolas assim, onde a sala e a aula foram trocadas por ambientes de aprendizado baseado em problemas, no contexto de projetos, muitos deles reais e concretos. Um exemplo é o Olin College: em uma disciplina de produtos e mercados, os aprendizes têm que conceber, criar, operar e gerenciar um negócio real e lucrativo no mercado. Em outra, times multidisciplinares de aprendizes passam a cadeira construindo sistemas, que eles escolhem, para entender os princípios da engenharia. Tudo na prática, sem ficar numa sala de aula com um instrutor projetando slides que versam sobre textos de livros que eles poderiam ter lido antes, para discutir, debater e/ou aplicar em um projeto no laboratório. Nenhuma destas inovações recorre a tecnologias especiais, mas a uma mudança radical no comportamento dos agentes envolvidos, tanto os professores e instrutores como aprendizes.
Se nem todo o uso de tecnologia em sala de aula quer dizer inovação, então de que forma a tecnologia pode realmente ajudar a inovar na educação?
Tecnologia pode ter um papel fundamental quando tiver um propósito dentro, ou como parte de um conjunto de métodos e processos de um sistema. Imagine um laboratório de química numa escola onde nem os instrutores sabem para que usá-lo no processo de aprendizado. Qual seria sua utilidade? “Soltar” os alunos no laboratório, misturando coisas, para ver o que aconteceria, até que alguém descobrisse alguma coisa útil ou causasse um incêndio ou explosão? Isso não é razoável, certo? Agora imagine a Wikipedia, com algum software adicional por trás, como parte de um processo de aprendizado de história: que tal descobrir qual foi a relevância de R, no episódio E, dando no máximo C clicks a partir da página P? Aí tem tecnologia, propósito, método e processo, e é completamente diferente de pedir para os alunos encontrarem a resposta na web. O último método é uma busca sem qualquer consideração, Google resolve para o aluno, quase certamente. O primeiro método é um desafio, tem contexto e limites, ponto de partida, envolve reflexão, aprendizado verdadeiro. A forma da tecnologia realmente ajudar na inovação, no processo educacional, é ser usada para criar engajamento, participação, criatividade e aprendizado verdadeiro e não, simplesmente, habilidade no uso das ferramentas pura e simplesmente. Afinal, do ponto de vista de tecnologias da informação e comunicação, elas mudam tão rapidamente que você nunca “sabe”, mesmo, usá-las… está sempre aprendendo.
Que tipo de inovação na educação superior é capaz de mudar o sistema educacional?
A educação superior, de várias formas, oferece, ao mesmo tempo, muito mais e muito menos formas de inovar. Mais, porque trata de aprendizes mais experientes, pelo menos em tese, no processo de aprendizado. Menos porque a vasta maioria dos professores do ensino superior tem muito pouca experiência prática nas duas coisas que mais interessam aos alunos. Primeiro, os docentes não são especialistas na criação de oportunidades de engajamento no processo de aprendizado e sim num certo domínio do conhecimento. Segundo, considerando que o ensino superior é o último estágio de aprendizado formal dos alunos antes do mercado, o docente clássico, “de sala de aula”, não tem a experiência prática de mercado, seja lá qual for o mercado, que cativaria seus alunos. Resultado? Na maioria dos casos, os alunos se tornam autodidatas na teoria e aprendem a prática no mercado. E as escolas superiores, quase todas, em quase todos os países, não estão conseguindo mudar este estado de coisas.
Veja mais detalhes do evento do link abaixo:
http://www.pucrs.br/eventos/inst/desenvolvimentoacademico2017/
Professor e Jornalista Helio Dias
Departamento de Física Experimental.
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