Estive num seminário na Universidade de Esportes de Osaka onde participaram um representante da Federação Japonesa de Futebol, o treinador de Futsal da seleção japonesa e o auxiliar técnico da seleção feminina, Campeãs Mundias e prata em Londres, um profissional do corpo técnico do Barcelona e eu. O tema principal era: "como utilizar o futebol para inserir os jovens japoneses no cenário global". Cada um falou um pouquinho para um público bastante heterogêneo formado por treinadores masculinos e femininos de clubes e escolinhas, dirigentes esportivos, professores que não tinham nada com esportes, curiosos e muitas crianças. Vejam bem, crianças!!

O que mais marcou foi o depoimento do sr. Satoru Mochizuki, assistente técnico na seleção feminina e professor da Universidade de Esportes de Shiga. Indagado sobre esquemas e métodos de treinos, ele disse que na seleção, muito mais do que isso, era levado em considerado o fator humano. Primeiro eles selecionaram as meninas pelo seu caráter, otimismo, perseverança, etc., e em seguida pela qualidade técnica. Disse que existiam atletas tecnicamente melhores, mas que não se encaixariam na proposta da Comissão Técnica. Ele disse que os treinos são bem parecidos em todo o mundo, ressalvando particularidades culturais, mas as pessoas são muito diferentes e se reunirem um grupo com "pessoas de boa índole, altruístas, dedicadas e perseverantes" a probabilidade de sucesso é muito maior do que um monte de craques egoístas e desinteressados.

Falando resumidamente ele falou: "convocamos primeiro o homem e somente depois o atleta". Os aspectos fisicos, técnicos e demais qualidades veêm a seguir. Seguindo essa mesma linha de pensamento é que foi convocada a seleção sub-20 que ficou em terceiro lugar na Copa do Mundo que terminou na semana passada. Será que ele está certo? Será que a nossa seleção principal não está falhando nesse aspecto?

Comentários

Por Roberto Affonso Pimentel
em 10 de Setembro de 2012 às 09:54.

Olá Edison, como mudaram os japoneses neste novo século! E para melhor.

Temos no Procrie (www.procrie.com.br) dois artigos que tratam do assunto com intensidade e depoimentos de algumas personalidades validando os novos conceitos e metodologias do treinamento. Concordam que é mais importante aprofundar-se nos estudos da Psicologia Pedagógica do que simplesmente um cursinho de alguns dias com ex-jogadores. Destaco as postagens "Alegria no Futebol e no Voleibol"? e "Ensinar Vôlei e Futebol, que Diferença"?

Neles há depoimentos de Guardiola e José Mourinho, dois dos melhores treinadores da atualidade. Quando se referem à Formação de atletas, dão ênfase em como devem ser consideradas as condições psicológicas para o desenvolvimento do indivíduo. Vejam, p.ex. o breve relato do Mourinho:

"(...) a teoria do treinamento desportivo positivista não se alinhava a minha forma de pensar. Foi aí que o Prof. Manuel Sérgio me ensinou que para ser aquilo que eu queria ser, teria de ser um especialista na área das ciências humanas. Foi assim que aprendi que um treinador de futebol que só perceba de futebol, de futebol nada sabe. Se sou um treinador singular é porque não me esqueço das lições sobre emancipação e libertação. É preciso ser livre para fazer o novo… até no futebol". (Motrisofia – Homenagem a Manuel Sérgio, de José Mourinho).

E ainda, de Daniel Coyle, em o "Código do Talento": (...) Qualquer discussão sobre o processo de aquisição de habilidades deve levar em conta um misto de descrença, admiração e inveja intensas que sentimos quando vemos um talento aparentemente saído do nada. É um sentimento que nos leva a perguntar: “De onde veio aquilo“? Como esses indivíduos, que parecem ser iguais a nós, de repente se tornam tão talentosos?

Parabéns pelo relato do seminário e parabéns aos treinadores japoneses, especialmente de futebol e de voleibol, cuja equipe feminina está voltando a se destacar no cenário mundial.

Por Edison Yamazaki
em 10 de Setembro de 2012 às 23:44.

Roberto,

Os japoneses estão fazendo um esforço enorme para mudar. Particularmente, eu acho que o esporte é o caminho mais fácil e rápido para impor essas mudanças. A sociedade japonesa é cheio de hereditariedade, cheio de regras explicitas e implícitas. E no meio de tanta "ditadura" as crianças ficam perdidas.

Por isso, os adultos estão chegando à conclusão (óbvia) de que é necessário tecer elogios, observar os acertos, estimular o certo.

Aqui, por questões culturais, observa-se primeiro os erros, e em cima desse erros é que são tecidos comentários. Ele estão querendo mudar buscando maior identificação com os jovens e crianças. Ainda levarão muitos anos para uma transformação mais saúdável, principalmente porque o foco de maior desgaste da juventude é na escola com seus professores opressores. Aqui ele ainda marcham em ritimo militar quando entram em campo para os jogos.

O depoimento de Mouninho é valioso e verdadeiro. Precisamos conhecer melhor os homens e suas particularidades.

Um grande abraço,

Por Roberto Affonso Pimentel
em 11 de Setembro de 2012 às 08:59.

Edison, eis um depoimento a respeito da metodologia de ensino.

Importância do grito!

Em vários colégios da região do Grande Rio não é diferente. Certa feita, pouco antes de ministrar uma aula sobre o método do mini voleibol, os alunos do educandário formavam fila dupla e se deslocaram de sua sala para o ginásio quase que marcialmente, em profundo e sepulcral silêncio, comandados pelo "sargentão" (o professor de Ed. Física). Ao dar início à aula, reuni todos e setenciei: "Quem não fizer bagunça não ganha picolé"! Ficaram atônitos, sem saber o que fazer, pois ali estavam seu professor e os donos da escola. Insisti a seguir e, felizmente, todos entraram na onda. Sendo que, entenderam que bagunça nada mais era do que gritar à vontade e dar vazão às suas energias. A partir dali, mesmo sem conhecer qualquer um deles, identifiquei-me com todos e consegui a espontaneidade em suas participações. A ponto de um deles comentar com o colega: "Assim que tinha que ser a aula de EF aqui no colégio"!

Igual procedimento no Morro do Cantagalo, uma das favelas da Zona Sul do Rio de Janeiro, liderada por traficantes. Durante três meses realizei um curso ali e jamais tive problemas. Uma das mâes testemunhou certa feita: "Lá do meu barraco sei quando o Senhor está aqui dando aula: é uma gritaria (alegria) só"! E a diretora da escola no Morro: "O Senhor parece que está aqui há 16 anos, o tempo que dirijo a escola, e no entanto, nunca vi as crianças reagirem com tanta alegria às suas aulas"!      


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