Como o formato atual impede que os clubes de futebol de gerem receitas compatíveis com o mercado internacional.
RICARDO OGNIBENE e PEDRO ALFONSIN*
Como sabido há muitos anos, quiçá décadas, o Brasil tem domínio absoluto de um produto extremamente mal explorado, o futebol. Somos responsáveis pelos maiores negócios esportivos da história, provemos profissionais de qualidade aos quatro cantos do mundo, mas nossa gestão ainda é tão ruim que não conseguimos sequer gerar receitas com nosso próprio ativo.
Quando mencionamos que a gestão é ruim não estamos privilegiando ninguém, a gestão dos clubes é ruim, das Federações, Confederações, Sindicatos , Associações e quem mais esteja envolvido.
Contudo, nos atendo especificamente à questão das receitas, não podemos deixar de mencionar a questão do calendário do futebol brasileiro atual, gerador contínuo de prejuízos, tanto pela realização de longos campeonatos estaduais, como pela inversão junto ao calendário europeu.
Não há razão lógica para a realização de campeonatos estaduais no Brasil, principalmente tão longos. Diante do cenário atual, completamente dependente do chamado “Sport business”, em que a sua existência ou não dependem de uma chamada “viabilidade financeira”, é inconcebível que os clubes se permitam perder 4 meses do ano para receber uma Cota de TV ínfima, que não cobre despesas muitas vezes, simplesmente para ser conveniente à uma federação e uma TV.
Pra se ter uma idéia, saindo do eixo RJ – SP, um clube top paranaense recebe algo em torno de R$ 500 mil reais em direitos de TV pela campeonato estadual, dinheiro esse que não cobre sequer despesas com alimentação e transporte da equipe, causando perdas financeiras substanciais aos clubes locais.
No cenário global atual, os negócios deveriam perder o sentido quando causam prejuízo à uma das partes, mas no futebol brasileiro ainda é diferente.
Tal fato acaba se refletindo nas formas mais simples possíveis, por exemplo, em nosso calendário desportivo.
Pergunta-se: Alguém tem idéia de quanto os clubes brasileiros perdem anualmente SOMENTE em função do calendário?
De fato é um número incalculável, haja vista que não temos idéia de quantos novos negócios apareceriam anualmente e progressivamente com o tempo, mas desta vez vamos me ater unicamente a algo de extremo prestígio e costume no mundo inteiro nessa época, os torneios de pré-temporada.
Praticamente 100% dos clubes da Série A1 do Campeonato Brasileiro receberam um convite para disputar algum torneio desse cunho ao redor do mundo no ano de 2009, e o que isso quer dizer?
RECEITA!
Cada torneio desse envolve para os clubes receitas com TV, ingressos, exposição de imagem, exposição de atletas em período de transferência, sem contar o lado da internacionalização da marca e marketing a ser explorada. Ou seja, os clubes perdem isso anualmente em função do calendário obsoleto e sem sentido do futebol, e pior, não se vê efetiva tentativa de mudança aqui.
Exemplo destes torneios somente em 2009, teve o Internacional/RS. Convidado a participar da Peace Cup, na Espanha, onde disputaria com Real Madrid (estréia de Kaká), Juventus, Werder Bremen, Lyon, Sevilla, Besiktas, Porto, Aston Villa e, pasmen, LDU, um prêmio de 2 milhões de Euros, com transmissão ao vivo para toda a Europa e Brasil, via Sportv, em um período de duas semanas, e teve sua intenção frustrada em função do calendário e da confederação, que não autorizou a saída do clube no período, assim como fez com todos os outros.
Mas qual a contrapartida? Qual o motivo da subserviências tão passiva dos clubes? Não chegou a hora de cada diretoria tomar as rédeas dos seus negócios e buscar situações mais interessantes para si próprias? Essa questão do calendário é tão simples de ser resolvida, da onde vem tanta força contrária à sua regularização?
Situação patética e semelhante se deu exatamente, agora na Copa das Confederações com a seleção brasileira. Enquanto todos os times do planeta estavam de férias, o que possibilitava a convocação de qualquer atleta para uma competição, os maiores clubes brasileiros estavam disputando fases finais de competições importantíssimas, como Taça Libertadores e Copa do Brasil, e equipes como São Paulo, Cruzeiro, Corinthians, Inter e Grêmio acabaram sendo gravemente prejudicadas, mas sabemos que isso certamente é algo que não importa para ninguém, além do próprio clube.
Se é tão difícil, manter os jogadores fora de série no Brasil, para quem acompanha futebol, é inadmissível que esse esforço solicitado inclusive pelo Presidente da república, seja muitas vezes subtraído dos clubes em fases decisivas.
É de se dizer que a FIFA passa aos clubes e Federações a programação de suas até 2014, e que países como Argentina, México ou até mesmo Equador já adaptaram seus calendários ao da FIFA, não estando o Brasil adaptado nem mesmo a um bloco “não-europeu”.
Além disto, não há como não mencionar a questão das cotas de TV, que tanto “aflige” os clubes.
O artigo 42 da Lei 9.615/98 previu há quase 11 anos que os clubes tivessem direito a negociar seus direitos INDIVIDUALMENTE, formato utilizado com êxito no mundo todo, por que não o fazemos?
Imagine, você, no domingo, ligando no canal X assistindo sua equipe, o torcedor da outra equipe assistindo no canal Y a dele, e quiçá, um terceiro time no canal W, isso é democracia.
Os envolvidos no futebol dizem que estão fazendo as coisas mudarem, mas, data máxima vênia, fazer o básico não é mudança e ser honesto não é virtude, é essencial.
Brigar pelos interesses dos clubes vai muito além do que pressionar árbitro e fazer cobranças vazias em programas de TV, a mudança de atitude é muito maior, INDEPENDÊNCIA é a palavra aqui.
O que precisamos é uma mudança de atitude, e provavelmente o “espírito da Copa 2014” trará isso. Porém, mais do que isso dependemos da mudança de atitude dos gestores, que precisam sair de cima do muro. As metas precisam ser mais bem definidas, e, quando definidas, que de forma objetiva e concreta para sua realização, pois o tempo para o Brasil acabou.
RICARDO OGNIBENE (ognibene@onesports.com.br ) é sócio da One Sports Business, empresa especializada em consultorias na área desportiva, além de membro dos Institutos Brasileiro (IBDD) e Ibero Americano de Direito Desportivo (IIDD). (ognibene@onesports.com.br )
PEDRO ALFONSIN (pedro@alfonsin.com.br) é advogado, sócio do Ricardo Alfonsin Advogados, pós-graduado em direito desportivo, presidente da comissão especial do jovem advogado da OAB/RS e coordenador do Grupo de Estudos de Direito Desportivo (GEDD).
Comentários
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Caio Pompeu Medauar de Souza
em 27 de Julho de 2009 às 10:00.
A Fifa tenta unificar o calandário mas esbarra sempre nos interesses das federações nacionais, e na velha desculpa dos interesses regionais, das situações climátivas etc.
Mas o caminho nao é exatamente a negociação individual, mas sim a criação de um senso de coletividade entre os clubes, o que não existe. Cada clube se preocupa mais em ganhar mais que o adversário, que em ampliar as possibilidades de receitas com televisão, de fixação de marca etc.
Um abraço
Caio Medauar
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Alexandre Moreno Castellani
em 31 de Julho de 2009 às 19:45.
Falando em "senso de coletividade entre os clubes", pergunto: acabando, por exemplo, com os Estaduais, o que seria dos clubes menores?
Eles sobrevivem sem aqueles 3/4 meses em companhia dos grandes?
E como ficaria a formação de talentos sem esses times menores?
O Rio de Janeiro, por exemplo, não ficou menor quando "quebrou" o futebol do interior?
Não posso dizer que São Paulo é grande, porque o interior é forte? O Barueri não nasceu nesse morimbundo Estadual?
E as Federações? Viram simpels cartórios? Morrem? Como fica, nesse caso, a estrutura política do Futebol?
E a parte do Calendário que não cabe a nos decidir? Libertadores?
Seria legal jogar uma Libertadores no fim da temporada? Junto com o Brasileiro?
Porque queremos mudar mesmo? Ahh, para jogar com o Milan no meio do ano... ok.
Pouco.
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Alvaro Ribeiro
em 16 de Setembro de 2009 às 02:40.
Se o time vai mal, salvo exceçoes, a geraçao de receitas tende a cair, nao ? A proposito...
- Rey-Eiras, E., Lago-Penas, C., Casais-Martinez, L. & Lago-Ballesteros, J. (2008). Consequences of a congested soccer calendar on team performance (Konsequenzen eines dicht gedrängten Wettkampfkalenders auf die Leistung von Fußballmannschaften). In P. O’Donoghue & A. Hökelmann (Hrsg.), World Congress of Performance Analysis of Sport VIII. (Magdeburg: Otto-von-Guericke-Universität, Department of Sports Science (Hrsg.), 2008.- S. 20-22, S. 621-626).
There is a considerable variation in the number of matches played per season by clubs in the Spanish Soccer. In addition to the normal league matches, the top teams have to play some games of the UCL on midweek evenings. This study focuses on the question of whether a period with a busy match schedule can lead to fatigue and increase the risk of poor team performance. The results of the empirical analysis showed that playing a UCL match on midweek (UCL match) did not have a statistical significant effect on team performance. Consequently, UEFA Champions League teams did not have an important disadvantage in the domestic league compared with non-UEFA Champions League.These results are in disagreement with the findings of Ekstrand et al. (1983) and Ekstrand et al. (2004). Perhaps this is down to the sample and to the performance indicator selected in the studies.Secondly, the effect of a busy soccer schedule on the results of Champions League debutants is the opposite of that expected. The probability of winning vs losing is higher for Champions League debutants when they play a midweek match than when they play only one game a week. That is, Champions League debutants performed above their normal standard at the weekend when they played a Champions League midweek match. Many coaches maintain that an athlete´s level of preparation is also elevated by participation in competitions. Participation in competitions does assist the athletes to reach a high state of readiness for the next competition. During such competitions, the athletes have the opportunity to test all training factors in the most specific way. Perhaps, during a certain extent a top team can cope with a busy match schedule. Future studies should determine the ideal duration of the competitive phase in professional soccer. As far as the frequency and the number of matches are concerned, the time required for recovery between matches should be considered. A limitation of this study is that only weekend league matches and midweek Champions League games were considered in the analysis. Other midweek games should also be considered. There will be included UEFA Cup games, Spanish Cup games or even midweek international games which will involve most of the players of the top teams. The study also did not consider the midweek activity of the opponents of the Spanish Champions League teams. (Mikrofiche-Nummer: 306215)
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Caio Pompeu Medauar de Souza
em 13 de Outubro de 2009 às 11:53.
Este final de semana ressurgiu a idéia de se transformar o Campeonato brasileiro em torneio, com uma fase final de mata mata. O que se diz é que a Rede Globo quer oferecer mais dinheiro aos clubes para isso.
Pelo debate já tido aqui na comunidade, principalmente pelo material enviado pelo AR fica claro que precisamos de um calendário racional, estudado e que possibilite a melhora na busca da excelência.
O resto, tanto faz. Mas será uma pena abandonar os pontos corridos, que tem possibilitado aos clubes se organizarem e buscarem outras receitas além da televisão, como camarotes, etc. Aos poucos vamos mudando a nossa cultura.
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Roberto Mihalik
em 5 de Novembro de 2009 às 17:42.
Ontem o presidente da FPF Marco Polo Del Nero emitiu uma carta defendendo a manutenção do atual calendário brasileiro.
Alguns pontos que valem a pena considerar antes de modificar o calendário e pensar q isso será a salvação para o futebol brasileiro.
Quem tiver a oportunidade leia.
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André Luiz Villares Monteiro
em 27 de Janeiro de 2012 às 22:27.
Discordo completamente da ideia desse texto. A perda de receitas por parte dos "grandes devedores" não está nos campeonatos estaduais, porque se assim fosse, com esses Estaduais apertados em apenas 4 meses, não haveria esse problema de forma tão crônica!! Ou então, o problema da perda de receitas ficaria restrito a apenas esses meses e então, os demais meses seriam de grandes receitas (pois então jogariam no rentável Campeonato Brasileiro da série A).
Mas, é assim mesmo que acontece?? Não seria a causa do problema os altos salários pagos a alguns jogadores? Diz a mídia que o salário do Ronaldinho Gaúcho passa de 1 milhão de reais por mês? Meu DEUS! Por mais que o Brasil seja seguro quanto a crises internacionais (e eu particularmente não acredito muito nessa tese!), é irreal pagar a um jogador de futebol (que não tem uma publicidade condizente com esse valor) tal quantia como salário! Ainda mais quando parte do salário tem que ser paga por um terceiro (que agora, não está pagando a sua parte!) e portanto, o jogador fica cobrando esse valor do clube e esse passa a responsabilidade para essa empresa!! Isso é brincadeira, né? Isso é falta de profissionalismo, tanto do clube, da empresa e até do jogador... e aí, vem alguém me dizer que a culpa da falta de recursos para esses irresponsáveis é porque o meu clube está na primeira divisão do Campeonato Estadual??! Para com isso, né?!
Toda a mídia, na área esportiva, está nas mãos desses grandes clubes. Se eles são tão capazes em produzir crises, se eles são incapazes de satisfazer o mercado de seus torcedores, se eles são maus-administradores, se eles gastam mal, se eles se dispõe a pagar salários fora da realidade a seus jogadores... então, desculpe, a culpa NÃO é da Federação, a culpa NÃO é dos clubes menores, a culpa NÃO é dos torcedores (seja lá de qual clube for, grande ou pequeno!), a culpa NÃO é da mídia, a culpa NÃO é minha nem sua!! A culpa é dos DIRIGENTES DESSES GRANDES CLUBES. Eles são os grandes responsáveis.
Parece-me que, no Campeonato Paulista, há uma cláusula, no regulamento, culpando o clube que atrasar salário de jogadores, com 3 pontos a cada rodada. Bem, por que isso não acontece, p.ex., no Campeonato Carioca? Temos visto que o direito de imagem do Ronaldinho Gaúcho não é pago! Temos visto que parte dos salários dos jogadores do Vasco não é pago! Temos visto muitas coisas que devem ser expostas para TODO MUNDO SABER... e que a culpa NÃO é da FEDERAÇÃO!! A culpa NÃO é dos PEQUENOS CLUBES!!
A culpa é INTEIRAMENTE DESSES DIRIGENTES IRRESPONSÁVEIS!! Por que não a responsabilização dessas pessoas na condição de dirigentes de clubes, quando for comprovada má-conduta administrativa, colocando o clube a risco de perigo em sua saúde financeira? Por que a gente não discute nesses termos??!!
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