30/12/2013
O último post no ano de 2013 ficou a meu encargo. Como era de se esperar, minha primeira ideia foi fazer uma retrospectiva de 2013, como as milhares de retrospectivas que invadem as TVs e monitores de todos, por tudo o quanto é canto. No entanto, tenho uma particularidade nesse sentido: odeio retrospectivas de fim de ano. Assim, minha primeira ideia não seria aproveitada.
Decidi então escrever sobre a corrida de rua de maior longevidade no país, a São Silvestre, realizada todo dia 31 de dezembro, desde 1924. Completando neste dia 31 de dezembro 89 anos, a corrida foi realizada até mesmo no ano de 1932, após a derrota paulista na chamada Revolução Constitucionalista, e durante os anos da Segunda Guerra Mundial.
A corrida foi criada por Cásper Líbero, jornalista paulista que criou A Gazeta em 1918, de onde surgiria o semanário A Gazeta Esportiva, em 1928. Muito ligado aos esportes, Líbero teria presenciado uma corrida noturna durante uma viagem à França, em 1924, e resolveu patrocinar uma corrida no último dia do mesmo ano, em São Paulo. A corrida veio depois a ser batizada com o nome do santo homenageado no dia 31, São Silvestre. Com um percurso inicial de 8,8 km, a corrida não foi reconhecida como uma prova oficial pela Federação Internacional de Atletismo até o ano de 1991, quando passou a ter um percurso de 15km. Talvez por seu pequeno trajeto, ou pela data festiva, a corrida tem também como atrativo pessoas com fantasias e muita descontração de grande parte dos participantes, um de seus charmes especiais.
No entanto, não é exatamente com a história da São Silvestre que este post se preocupa. Pretendo, na verdade, oferecer um pequeno olhar sobre a relação entre a corrida São Silvestre e a identidade da cidade de São Paulo.
O esporte e identidades locais
Não deve ser novidade para o leitor deste blogue que o esporte está intimamente ligado a profundos sentimentos de identificação dos indivíduos. Foram tantos os artigos aqui já postados sobre isso que não tenho nem mais a conta. No entanto, não me recordo de um póst que abordasse de forma mais direta a relação entre o esporte (no caso, uma prova esportiva) e a identidade da cidade. A visão do evento esportivo como o que Pierre Nora chamou de lieu de memóire, ou lugar de memória; lugares (físicos ou não) em que a consciência histórica de um povo é construída. Os lugares de memória podem ser, assim, monumentos, personalidades, edifícios, festividades, ou outros marcos que sustentam uma visão em comum de um passado, ajudando a materializar uma identidade compartilhada. E eventos esportivos podem funcionar nesse sentido (Para mais informações, ver artigo de Pierre Nora, na revista Projeto História, n. 10).
A São Silvestre apareceria assim como um dos marcos da memória paulistana. Mas não é apenas sua realização e repetição, já por quase 90 anos, que a imbui de tal representatividade. Podemos começar pelo trajeto atual da corrida (disponível no site oficial do evento).
Um olhar um pouco mais atento pode facilmente observar que diversos pontos chave para a identidade paulistana são “visitados” pela São Silvestre: o MASP, o Memorial da América Latina, o Teatro Municipal, a Praça da República, o estádio do Pacaembu, o Viaduto do Chá e a prefeitura da cidade, com a chegada em frente à Gazeta (Fundação Cásper Líbero), em homenagem ao criador do evento.
Tal mobilização de símbolos não deve ser vista como algo acidental, ainda mais nos dias de hoje, quando a transmissão da corrida pela televisão é tão significativa. A imagem a ser transmitida de São Paulo é a da cidade do MASP, do Teatro Municipal, com seu marco histórico no viaduto do Chá e o esportivo no Pacaembu. Transmite-se uma imagem selecionada da cidade, que será vista por milhares, e será compartilhada por muitos como a imagem de São Paulo.
Ao assistir a corrida, lembre-se que ela não é famosa pela dificuldade de seus parcos 15 km, mas pela sua “tradição” e pela imagem que representa da cidade de São Paulo. Esse fato não diminui sua importância. Na verdade, ele coloca a São Silvestre ao lado de eventos esportivos de grande renome no mundo, como o Tour de France ou as 500 milhas de Indianápolis; ela se torna um evento que marca sua cidade, ou seu país, se tornando um símbolo dela. Só que nas outras, não encontraríamos o the Flash.
Fonte:www.historiadoesporte.wordpress.com
Comentários
Por
Edison Yamazaki
em 31 de Dezembro de 2013 às 00:04.
Não restam dúvidas de que as corridas de rua atualmente proporcionam muita propaganda para as cidades que as organizam. Mesmo com todo esse "profissionalismo" em torno dos eventos, confesso que tenho saudades do tempo em que a São Silvestre era apenas uma grande brincadeira no último dia do ano. Saída e chegada em frente a Gazeta e muita festa dos participantes. Acho que estou ficando velho.
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