02/11/2015
Por Victor Andrade de Melo
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A ideia desse post surgiu quando li o belíssimo e divertido “Dez, nota dez! Eu sou Carlos Imperial”, uma biografia desse incrível e polêmico personagem da cena cultural nacional recente, escrita (muito bem escrita) por Denilson Monteiro. Já conhecia o envolvimento de Imperial com o samba – cuja faceta mais notável era sua participação na apuração do concurso anual de escolas do Rio de Janeiro, bem como sua relação com o futebol – por causa de sua ligação com o Botafogo. O livro, todavia, trouxe algumas surpresas.
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Com o Botafogo, para além de sua constante participação como torcedor apaixonado, uma relação mais forte com a diretoria começou no final dos anos 1970, quando o clube passava por muitas dificuldades – estava há anos sem títulos e perdera sua sede de General Severiano por problemas financeiros.
Uma de suas ideias, colocada em prática em um Botafogo X Vasco de 1980, foi fazer entrar no gramado, antes do time, um grupo de beldades vestidas com a camisa da equipe, a quem denominou de “foguetes”. Sua inspiração era as torcidas de esportes norte-americanos, a seu ver uma maneira de animar um pouco mais o monótono futebol naciona, ainda mais a equipe alvinegra. Nem precisa dizer: o ba-fa-fá foi intenso, mais uma polêmica na sua longa trajetória de polêmicas.
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Assim se referiu à iniciativa Marcelo Rezende e Milton Costa Carvalho, na Placar de 18 de julho de 1980, em uma matéria crítica intitulada “Fora Borer”, presidente do Botafogo na ocasião:
“Um grupo de bem fornidas starlets encarregadas de motivar a torcida botafoguense em dias de jogo. Uma missão espinhosa nestes tempos difíceis, em que pesem os inegáveis atributos físicos de todas elas. Uma coisa, porém, até os jogadores reconhecem: ruim com Imperial, muito pior sem ele”.
Nessa ocasião, Imperial era vice-presidente de futebol. Na verdade, nos informa Denilson Monteiro, já tivera uma experiência anterior como dirigente esportivo, no mesmo ano de 1980, como vice-presidente de futebol do Olaria. Seu plano: tornar o clube da Zona da Leopoldina no “Boca Juniors brasileiro”, afinal, até a camisa era similar! Ao assumir o cargo, declarou: “Se o Elton John pode ser dono de time na Inglaterra, por que eu não posso ser um modesto diretor de futebol?”. Por lá também promoveu atividades com suas “lebres” (referência ao séquito de mulheres que constantemente o cercava)
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O primeiro técnico que contratou para concretizar seu plano foi um delegado que dava passos mais seguros em sua carreira de treinador: Antônio Lopes. Imperial era presença constante na arquibancada, sempre acompanhado de suas “lebres” e confraternizando com os torcedores. A propósito, um dos seus principais assessores foi exatamente Russão, o célebre chefe de torcida do fogão.
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O mais surpreendente do livro, no que tange ao esporte, é a informação de que Imperial foi um dos pioneiros da surf music nacional! De fato, estava sempre sintonizado com o cenário internacional, tendo sido um dos mais importantes dinamizadores dos primórdios do rock no Rio e no Brasil, um dos primeiros a trazer, por exemplo, Beatles para o país.
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Pois bem, em 1964, inspirado nos filmes norte-americanos de praia, Imperial compôs “Onda do Jacaré” e “Vou deslizar”, gravadas por Roberto Rei em compacto da RCA, o primeiro álbum desse artista que teria muito sucesso no decorrer da década. Essas canções estão disponíveis no canal da Tropicália Discos: https://www.youtube.com/watch?v=duJYUa4UTUo (estão em sequência, primeiro se ouve “Onda do jacaré” e depois “Vou deslizar”).
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Curiosamente, para o carnaval do ano seguinte, Cauby Peixoto gravou uma música com nome semelhante, “A onda do jacaré”, mas com letra distinta, da autoria de Oldemar Magalhães (disponível aqui: https://www.youtube.com/watch?v=uPbrxMiug-I).
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Carlos Imperial, de fato, não foi o único a perceber o fenômeno dos filmes de praia. Sérgio Murilo também lançou, no mesmo ano e 1964, pela RCA, um compacto com a música “Festa do surf” (disponível aqui http://www.kboing.com.br/sergio-murilo/1-6018461/), depois inserida no álbum SM 1964. Os mais velhos e com mais memória vão lembrar dessa outra canção de Sérgio Murilo, “Broto legal” (https://www.youtube.com/watch?v=LsVj59nuOAc).
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Em 1968, os Versáteis lançaram, pela Artistas Unidos, a instrumental “Mexican surf” (disponível em https://www.youtube.com/watch?v=0_C0qiC_gi8 , a partir de 2 minutos e 50 segundos). Mas no âmbito do rock instrumental, merece mesmo destaque uma das grandes bandas do Brasil, The Jordans, que em 1964 gravou, pela Copacabana, “Surfin’ with The Jordans”, álbum com 12 faixas (disponível em http://www.last.fm/pt/music/The+Jordans/Surfin’+With+The+Jordans). É possível dizer que esse foi mesmo o grupo pioneiro mais identificado com a surf music. Em 2002, Os Jordans se reuniram de novo e lançaram um álbum chamado Geração Surf, disponível aqui: http://freedbcd.net/misc/4a0ee518/
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Sabemos que, na década de 1960, o esporte das pranchas já dava seus primeiros passos na cidade (junto com os camaradas Cléber Dias e Rafael Fortes, escrevi um artigo sobre o tema, disponível em http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/reh/article/view/3669), mas, de fato, a consolidação de um mercado ao redor do surfe parece ter mesmo se delineado claramente nos anos 1980 (ver a bela tese de doutorado do amigo Rafael Fortes, disponível em https://rafaelfortes.files.wordpress.com/2006/12/o-surfe-nas-ondas-da-midia-um-estudo-de-fluir-nos-anos-1980-versao-sem-imagens.pdf). De toda forma, esse conjunto de ocorrências da surf music nos anos 1960 chama-nos a atenção para o fato de que o impacto do surfe no Brasil tenha sido, anteriormente, mais intenso do que temos suposto.
Tema para investigação!
Fonte: https://historiadoesporte.wordpress.com/
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