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Edição 4148

Dificuldade de agrupar estudiosos e produzir grandes projetos seriam os maiores problemas
Professores de diferentes campi avaliaram os ’entraves’ da pesquisa em Humanidades no I Fórum de Ciências Humanas da Unesp, realizado em São Paulo em 23 e 24 de novembro. Problemas para aglutinar competências e a falta de uma metodologia apropriada para medir a produção têm dificultado o protagonismo da área, segundo apontaram especialistas.

"Ousadia é a palavra que a área de humanas precisa perseguir com mais afinco", afirmou a pró-reitora de Pesquisa, Maria José Giannini, durante o evento.

Para a professora, as complicações provocadas pela estrutura multicampi da Universidade precisam ser superadas para reunir competências de diferentes unidades. Um caminho para isso seria divulgar mais os projetos, buscar contatos e parcerias e utilizar melhor as ferramentas de apoio que a instituição oferece (ver página da Pró-Reitoria de Pesquisa).

A preocupação de Maria José também foi expressa pelo coordenador científico da revista Pesquisa Fapesp, Luiz Henrique Lopes dos Santos, que palestrou no primeiro dia do encontro.

O filósofo e professor da USP buscou desmistificar a ideia de que as humanidades são preteridas pelas agências de fomento à pesquisa. Ele citou dados dos EUA, onde o setor recebe apenas 9% (4 bilhões de dólares) de todo o investimento anual em pesquisa, em um total de 50 bilhões de dólares. Na Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo), o percentual para esse segmento é de 11%.

"Os projetos dessa área, em geral, têm um custo menor porque não demandam aquisições de equipamentos caros, mas poderiam fazer solicitações mais ambiciosas", explica Santos.

Ele destacou que em 2009 a Fapesp teve sobra de recursos - dos R$ 730 milhões que a instituição poderia aplicar no ano, apenas R$ 680 foram gastos. "Faltaram projetos qualificados nos diferentes setores. Em ciências humanas, principalmente, há pouquíssimos pedidos de financiamento de médio e grande porte."

Produção x ’produtivismo’

Humanidades é a área em que o Brasil e a Unesp têm o pior desempenho em avaliações tradicionais. No SIR (SCImago Institutions Rankings) de 2010, a instituição aparece como a 9ª do país nesse setor, 4ª em ciências exatas e ciências da terra, e 2ª em ciências da vida e da saúde. É a 200ª universidade do mundo no mesmo ranking, mas ocuparia a 625ª posição se fossem levadas em conta apenas as humanidades.

Esses números transmitem a falsa ideia de que se produz pouco em ciências humanas, conforme Santos. Para ele, inexiste um modelo adequado de análise para a área. Livros, por exemplo, não são levados em conta pelos rankings que quantificam o volume de pesquisa das universidades.

Segundo o professor, esse formato de publicação é 37% maior nas humanidades em relação às demais áreas, e para criar essas obras é necessário muito mais tempo do que para escrever um artigo.

O "produtivismo", termo usado pelos cientistas para definir a ânsia por alto número de publicações, foi muito criticado em diferentes momentos do fórum, assim como o fator de impacto. Este, que é um índice que mede quantas vezes um mesmo artigo foi citado em outras publicações, é inadequado para analisar disciplinas como filosofia, segundo a opinião do jornalista Anderson Vinícius Romanini, professor da Escola de Comunicações e Artes da USP.

"Isso pode gerar grupos que citam uns aos outros apenas para aumentar o índice", alertou o pesquisador em palestra no encontro. "Isolamentos desse tipo são extremamente ruins para a ciência, que deve se pautar pelo confronto de idéias."

Abordagens múltiplas

A forma como a pesquisa em humanidades é feita foi questionada pela professora de Filosofia Mariana Broens, do Câmpus de Marília. "Será que o modelo de produção solitária, individual e contemplativa pode responder aos desafios da contemporaneidade?", indagou ela.

Obstáculos às investigações multidisciplinares podem ser encontrados nas especificidades de cada área. Para fazer um estudo em música, por exemplo, grande parte do tempo será empregada na audição de acervos, o que pode não parecer compreensível para pesquisadores dos demais setores. Outra barreira é a da língua. Nas disciplinas em que a palavra escrita é parte da própria conceituação, como antropologia e direito, por exemplo, o domínio do idioma para o qual será traduzido um artigo precisa ser muito maior.
Apesar das dificuldades, a busca por abordagens interdisciplinares será cada vez mais necessária, como afirma Mariana. Ela deu como exemplo estudos sobre processos cognitivos, que têm agrupado pesquisadores de neurociência, biologia, ciências da informação, computação, linguística, antropologia, pedagogia e psicologia.
(Cínthia Leone, da Assessoria de Imprensa da Unesp)

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