JOGOS OLÍMPICOS, UM MOMENTO DE PROTESTOS?

26/07/2016

por Maurício Drumond

Manifestações políticas não são novidades em Jogos Olímpicos. A decepção com o suposto legado que o evento propiciaria à cidade e as avassaladoras crises política e econômica são o combustível ideal para alimentar tais protestos. Às vésperas da cerimônia de abertura, as antecipações à possíveis manifestações populares – com euforia ou preocupação, dependendo de seu posicionamento político – começam a entrar em pauta; ainda que dividam espaço com outras questões como a possibilidade de atentados terroristas, problemas organizacionais e doping, entre outros.

Por aqui, as manifestações organizadas durante a Copa das Confederações em 2013 também marcaram o imaginário nacional sobre a participação contestatória popular e os grandes (ou mega) eventos esportivos. E com ela, a forte resposta policial engendrada durante a Copa do Mundo de 2014, com uma série de prisões preventivas que a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e a Anistia Internacional (AI) definiram como “graves violações dos direitos e liberdades democráticas”, de acordo com o jornal El País.

Thomas Bach, presidente do Comitê Olímpico Internacional (COI), manifestou-se com o velho mantra do Comitê: “Os Jogos Olímpicos não têm relação com a política”, disseram repetidas vezes diferentes presidentes do COI. Mas a história nos ensina uma diferente lição. Desde sua primeira edição, na cidade de Atenas, em 1896, os Jogos foram por diversas vezes alvo de interesses políticos.

As Olimpíadas de Berlim em 1936, realizadas em pleno regime nazista, já demonstravam o forte simbolismo político ligado ao esporte. Hitler não poupara esforços para construir a imagem internacional de uma grande e bem sucedida Alemanha. Pela primeira vez, os Jogos eram aparelhados pelo Estado e a imagem de uma nação era arquitetada e projetada através do ideal olímpico.

 

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Berlim, 1936.

Já as Olimpíadas de Melbourne, em 1956, foram palco do primeiro boicote oficial. Em tempos de Guerra Fria, a Espanha, a Suíça e os Países Baixos se recusaram a participar dos Jogos, em protesto contra a invasão soviética da Hungria após a Revolução Húngara daquele ano. Já os egípcios, libaneses e iraquianos não compareceram ao evento contra a presença francesa na questão do Canal de Suez. Os Jogos de Melbourne também não contaram com a participação da República Popular da China, que demandava a exclusão de Taiwan da competição.

Devido ao apartheid, regime de segregação racial, a África do Sul foi banida de qualquer competição internacional e ficou de fora das Olimpíadas de 1964, em Tóquio. A sanção só foi revogada na década de 90, após o fim do apartheid, nas Olimpíadas de Barcelona, em 1992. Nos Jogos de 1976, em Montreal, 22 nações africanas se recusaram a participar devido à não exclusão da Nova Zelândia da competição. Esses países pediam a eliminação da delegação neozelandesa pelo fato de que seu time de rúgbi (os “All Black”) havia rompido o isolamento esportivo decretado à África do Sul, que fora banida das competições esportivas internacionais como meio de pressão contra seu sistema segregacionista. Já o Comitê Olímpico Internacional alegava que o rúgbi não era um esporte olímpico, e que por isso o caso fugia de sua alçada. A Nova Zelândia fez valer seu peso político e levou 84 atletas aos Jogos.

As duas Olimpíadas seguintes foram palco dos mais famosos boicotes olímpicos, em 1980 e 1984, nos Jogos de Moscou e Los Angeles, respectivamente. Em Moscou, 62 delegações, lideradas pelos Estados Unidos, se recusaram a participar da competição, a grande maioria em oposição ao regime soviético. Quatro anos depois, em Los Angeles, foi a vez de a União Soviética liderar o bloco comunista de 14 nações a não participarem dos Jogos. O Irã e a Líbia também decidiram boicotar o evento como forma de protesto político, mas não faziam parte do bloco soviético.

Além dos boicotes, podemos também apontar protestos populares em momentos olímpicos. Em 1968, dez dias antes da abertura dos Jogos da Cidade do México, no dia 02 de outubro, a resposta policial a um protesto pacífico resultou no evento conhecido como “Massacre de Tlatelolco”. O número exato de mortes ainda é debatido, com a maioria das fontes indicando entre 200 e 300 fatalidades. Durante os Jogos, uma das imagens mais marcantes em sua história: Tommie Smith e John Carlos dividem um par de luvas e fazem a saudação dos Panteras Negras no pódio dos 200 metros rasos.

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Peter Norman, o australiano que conquistou a medalha de prata na prova e compartilhou o pódio com os estadunidenses, aderiu à manifestação utilizando um broche da organização “Projeto Olímpico pelos Direitos Humanos”, que propunha o boicote de atletas afro-americanos caso uma lista de reivindicações dos movimentos por direitos civis dos Estados Unidos não fosse atendida. A entidade desistiu do boicote, mas instruiu seus membros a protestarem de sua forma, como fizeram Smith e Carlos. Os atletas dos EUA foram punidos por sua federação e mandados de volta ao seu país, e Norman também sofreu punição, ficando de fora das olimpíadas seguintes, em Munique.

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Os Jogos de 2008, na China, também foram precedidos de diversas manifestações políticas, especialmente relacionadas à ocupação chinesa do Tibete, durante a passagem da tocha por diversas cidades, como Atenas, Istambul, Buenos Aires, Paris, Londres e São Francisco.

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Protestos em São Francisco, 10 mar. 2008. (AP Photo/Ben Margot)

Os Jogos chineses, em si, não tiveram manifestações significativas em solo chinês, o que também se deve ao caráter autoritário de seu governo. Já no Rio de Janeiro, o caráter autoritário do governo também transparece em diversas situações. Resta-nos ver, como serão os nossos Jogos?

 

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