SOBRE CRENÇAS E DESCREDENCIAMENTOS

 

Jocimar Daolio

 

            Motivado pelo recente episódio de descredencimento do Prof. João Batista Freire do Programa de Pós-Graduação em Educação Física da UDESC[4] “Sub” entendida como parte, não como inferioridade.

Comentários

Por José Roberto Herrera Cantorani
em 1 de Abril de 2011 às 19:27.

Opa pessoal,

não saiu na íntegra.

SOBRE CRENÇAS E DESCREDENCIAMENTOS

 

Jocimar Daolio

 

            Motivado pelo recente episódio de descredencimento do Prof. João Batista Freire do Programa de Pós-Graduação em Educação Física da UDESC[4] “Sub” entendida como parte, não como inferioridade.

Por José Roberto Herrera Cantorani
em 1 de Abril de 2011 às 19:40.

Opa,

mais uma tentativa:

SOBRE CRENÇAS E DESCREDENCIAMENTOS

 

Jocimar Daolio

 

            Motivado pelo recente episódio de descredencimento do Prof. João Batista Freire do Programa de Pós-Graduação em Educação Física da UDESC[1], resolvi expressar algumas opiniões sobre esse momento que estamos passando na área de Educação Física. Confesso que estou um tanto preocupado com os rumos que a área vem tomando.

            O caso do João Freire não é único. Temos sido testemunhas de descredenciamento de vários colegas nossos dos programas de pós-graduação em Educação Física. Pode-se argumentar que alguns deles não estavam produzindo nada e que não é possível um docente sem produção acadêmica integrar programas de pós-graduação. Concordo, mas o fato não se resume a isso. Muitos professores com produção também estão sendo descredenciados. O problema parece estar na definição do que é produção acadêmica em Educação Física e sua avaliação.

            Qualquer paper (nome horrível que alguns colegas gostam de pronunciar, talvez por status) publicado em revista internacional vale mais do que um artigo nacional; dentre os nacionais e os internacionais, há uma hierarquia de valoração em conceitos A, B ou C; qualquer paperinternacional vale mais do que livro nacional; qualquer patente vale mais que qualquer produção nacional. E tudo isso definido pelo chamado Qualis Capes. O nome melhor deveria ser Quantis Capes.

            Desconsidera-se o verdadeiro impacto das produções acadêmicas na área. Quando eu falo em impacto, penso na repercussão e nos desdobramentos que uma determinada produção tem em profissionais e alunos da área e não somente para os docentes dos programas de Pós-Graduação. Sei que existem os indexadores internacionais que definem o fator de impacto (o chamado JCR), mas como desconsiderar o impacto de um livro nacional que vendeu, por exemplo, 10.000 exemplares ou mais e que é leitura obrigatória em cursos de graduação e bibliografia de concursos? Como negar que os profissionais da área lêem, em sua esmagadora maioria, periódicos nacionais e não internacionais. Como tirar do autor a opção de definir onde ele quer e gostaria de publicar seu artigo, considerando-se o público que pretende atingir?

            Por exemplo, publicar um artigo na revista Motrivivência sempre foi, pelo menos entre as pessoas com as quais tenho interlocução acadêmica, certeza de que o texto seria lido e debatido, atingindo, portanto, a finalidade de um artigo. Entretanto, a Motrivivência, no Qualis Capes atual, recebe conceito C Nacional.

            Em nome da produtividade acadêmica em Educação Física, corremos o risco de certas distorções. Temos visto hoje o estranho fato de alguns pesquisadores “top de linha” pelos critérios de avaliação da Capes serem totalmente desconhecidos e não serem lidos por alunos e profissionais da Educação Física. Ou alguns imberbes candidatos a programas de mestrado na área apresentando produção internacional, fato que mistura arrogância com pretensão e fingimento. Isso quando não vemos acordos espúrios para todos os membros de um grupo assinarem como co-autores um artigo que somente um ou dois escreveram.

            Dia desses fui interpelado por um aluno de pós-graduação me perguntando se eu não ficava mais feliz quando tinha um artigo publicado num periódico com qualis superior. Eu lhe disse que nos meus 26 anos de serviço público, sendo 19 na Unicamp e, desses, 8 na Pós-Graduação, consegui uma razoável produção na área sem nunca pensar ou escolher um periódico pela sua classificação no Qualis. Sempre produzi quando tinha algo interessante e novo para dizer e não porque me exigissem produção num certo período ou num determinado tipo de veículo. Algumas vezes produzi em livros, outras em capítulos de livro, ou periódicos. Pretendo continuar assim, talvez correndo o risco de descredenciamento, como João Freire e outros.

            Só para mais um exemplo: no triênio 2001-2004, o programa de Pós-Graduação em Educação Física da UNICAMP, do qual ainda faço parte, deixou de computar 33 capítulos de livros, devido aos critérios de avaliação que condicionam o número de livros e capítulos ao número de artigos[2]. Esse fato beira o patético, porque capítulo de livro é uma produção e como tal deveria ter sido ao menos avaliada, mas nunca desconsiderada.

Talvez a culpa não seja da Capes como um todo, que é um órgão que precisa estimular e avaliar a produção científica dos vários programas de pós-graduação do país. Concordo com isso e nunca fui contra qualquer processo de avaliação. É o que se espera de um órgão governamental que injeta consideráveis recursos públicos em bolsas, investimentos, equipamentos etc. O problema parece ser o embate no interior da área de Educação Física, refletido na atuação dos representantes da área e dos coordenadores dos programas de Pós-Graduação[3].

Em outras palavras, os processos de avaliação têm valorizado a produção de pesquisadores afinados com uma certa tradição de pesquisa ligada às ciências exatas ou biológicas. Essa tradição de pesquisa mantém vazão de sua produção prioritariamente em artigos, parte deles internacionais. Já a tradição de pesquisa mais próxima das ciências humanas e sociais produz em artigos, mas também em livros. Desconsiderar isso implica tomar a conseqüência pela causa, como se um pesquisador da sub-área[4] sócio-cultural da Educação Física optasse por publicar um livro porque não consegue colocar sua produção em periódicos internacionais, o que é, no mínimo, um equívoco e, no máximo, um desrespeito.

Enfim, o que parece é que a área de Educação Física na Pós-Graduação brasileira está sofrendo um processo de “biodinamicização”. Os docentes que estão sendo descredenciados dos vários programas, não por um mero acaso são, em sua maioria, aqueles que pesquisam a partir de aportes teóricos das ciências humanas e sociais, ou da Educação. Isso aponta para uma possível solução, em minha opinião inadiável: a divisão de nossa área em duas. Essa divisão talvez possa contemplar tanto as pesquisas da sub-área sócio-cultural como aquelas da sub-área biodinâmica. Talvez a Educação Física seja a área em que essa divisão seja mais visível que as outras.

Não se trata de priorizar um tipo de tradição de pesquisa em detrimento de outra. Ambas são necessárias, fazem parte da tradição da área e precisam ser feitas com qualidade. O que me preocupa é ver que alguns colegas, na tentativa de considerar pesquisas, não apenas diferentes, mas de tipos diferentes, estejam deixando a área manca. Impossível não lembrar aqui da frase de Boaventura de Sousa Santos: “Temos o direito a ser iguais quando a diferença nos inferioriza, temos o direito a ser diferentes quando a igualdade nos descaracteriza”.

A História, como sempre acontece, será implacável com os medíocres, os covardes ou, na melhor das hipóteses, os ingênuos. Mas para compreender isso, é necessário entender um pouco de ciências humanas.

Prefiro ficar com Manuel Bandeira, um dos maiores poetas brasileiros e que, ao que me conste, nunca fez parte de programas de pós-graduação: “O que não tenho e desejo é o que mais me enriquece”.

 

[1] Confira o texto de João Batista Freire sobre o referido episódio na biblioteca do Centro Esportivo Virtual, no site www.cev.org.br.

[2] Informação prestada pelo então coordenador do programa, o Prof. Ricardo Machado Barros.

 [3] Em 2004, publicamos (eu e os Professores Mauro Betti, Yara Carvalho e Giovani Pires) na Revista Brasileira de Pós-Graduação (RBPG), revista da Capes, um artigo intitulado “A Avaliação da Educação Física em Debate: implicação para a subárea pedagógica e sociocultural”, no qual respondíamos ao artigo do Prof. Eduardo Kokubun, representante de nossa área na Capes, publicado na Revista Brasileira de Ciências do Esporte. Nesse artigo questionávamos a forma de avaliação da produção acadêmica em Educação Física que, em nossa opinião, estava incorrendo em alguns equívocos. O título original do artigo era: “Conspiração e Transparência na Política da Capes para a Pós-Graduação em Educação Física: implicações para a subárea pedagógica e sociocultural”. O artigo foi publicado no Vol.1, N.2, Nov/2004 da RBPG e pode ser conferido no site www.capes.gov.br/rbpg/portal/conteúdo/183_194_avaliacao_educacaofisica_debate.pdf.

 [4] “Sub” entendida como parte, não como inferioridade.

Por Guilherme Borges Pacheco Pereira
em 2 de Abril de 2011 às 10:12.

Prezados,

Na ocasião do descrendenciamento do João, instalou-se aqui no CEV um debate onde muitos de nós criticávamos os critérios de avaliação da CAPES para a área 21. Vários comentários de apoio ao João, muitas críticas e observações, inclusive minhas. Mas nada mudou. Nos últimos dez anos (ou mais), o movimento tem sido de privilegiar uma área em detrimento da outra, como foi dito. Por consequência, objetos, métodos e veículos de natureza "bio" são mais valorizados do que o conjunto análogo "educação e ciências sociais". Hoje, mesmo que se queira aderir aos padrões do "Quantis CAPES", não é possível, pois os veículos para publicação são rarefeitos. É inconcebível que a Revista Brasileira de Educação seja A1 na área de Educação e sequer figure na área de Educação Física. Por outor lado, deve haver algum pesquisador em Educação Física que publique na Arquivo Brasileiro de Medicina Veterinária e Zootecnia, B2, ou na Revista Clínica de Ortodontia Dental Press, B5. É, no mínimo, um absurdo. Vejam outro exemplo. Em busca no Qualis, usei a chave "socio", somente por associação com os interesses desta comunidade de Sociologia do Esporte. O resultado foi esse:

Série Sociologica. Antropologia C;

Animador Sociocultural B5;

Sociologias (UFRGS. Impresso) B2.

A base consultada lista 876 periódicos. Assim, nesse universo, temos 0,34% de títulos identificados imediatamente com estudos sociológicos, sendo que apenas 0,13% tem "pontuação valiosa".  É verdade que se pode pulbicar temas socioculturais em muitas revistas nacionais e internacionais, mas essa desproporção do Qualis é a p´ropria expressão da narcose pela qual estamos todos passando.

Guilherme


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