Resumo
Este estudo aborda as relações estabelecidas entre o esporte e a educação escolar e tem como lugar da narrativa as práticas discursivas e institucionais produzidas e realizadas pela Associação Brasileira de Educação (ABE), em 1920 e 1930. Ao estabelecer esse recorte, meu principal propósito foi compreender como e por que as práticas esportivas, na época já disseminadas como experiência moderna e urbana, participaram de um projeto cultural que apostou na eficiência da escola como possibilidade de organização e disciplinarização da vida social. Nesse processo, interessou-me compreender as maneiras pelas quais os signos e códigos esportivos compuseram ordenamentos e enunciações que modelavam a escola moderna como tempo/espaço privilegiado na socialização das futuras gerações. Partilhando indícios anunciados por outros estudos, pretendo, com esta pesquisa, indicar que, a partir da década de 1920, os projetos e prescrições relativos à escolarização do esporte ganham maior destaque entre os educadores. Tal movimento guarda relação com o propósito de renovação pedagógica que, na mesma época, buscou constituir a escola como uma experiência moderna, ativa, eficiente, tecnológica e, como tal, sintonizada com o discurso do trabalho urbano- industrial. Na construção narrativa, foram abordados os sentidos políticos e culturais impregnados no exercício de produção de uma forma escolar para o esporte e a relação estabelecida entre esse movimento pedagógico-cultural e aquele vinculado à aposta na regeneração social pela educação. As fontes mobilizadas e constituídas como corpus documental da pesquisa foram prioritariamente aquelas que compõem o acervo histórico da ABE e que, até então, não haviam sido mobilizadas em estudos relativos à história da Educação Física. Conhecendo a rede de sociabilidade estabelecida pela ABE para abordar a relação escola-esporte, me foi possível identificar uma pluralidade de idéias, mentalidades e perspectivas em confronto. Uma idéia basilar aparece como uma espécie de consenso: o esporte poderia contribuir para a energização do caráter do brasileiro. Mas o desvendar dessa trama possibilitou-me identificar e problematizar as múltiplas interpretações e interesses que circularam em torno dessa proposição. Os tensionamentos e também os acordos táticos estabelecidos entre o primado educativo da eficiência dos gestos e o primado cívico-nacionalista de fortalecimento do corpo da nação modelaram o percurso de escolarização do esporte. As práticas discursivas e institucionais estudadas permitiram-me identificar que o esporte foi anunciado como conteúdo e como método de ensino. Também como uma finalidade educacional ou um conjunto de valores e atitudes a serem prescritos. Em outra vertente, foi ao mesmo tempo inquirido como instituição educativa paralela e concorrente à escola. Problematizando essa diversidade de formas e dimensões educativas me foi possível indicar uma in(corpo)ração do ethos sportivo no esforço de produção de uma moderna forma escolar de socialização.