Integra

INTRODUÇÃO:

Na sociedade contemporânea, o futebol tem se mostrado um fenômeno de extrema relevância social e cultural, principalmente no Brasil. Esse esporte é produto resultante das transformações decorrentes da Revolução Industrial durante os séculos XVII e XIX e foi trazido ao Brasil como prática da aristocracia inglesa, tornando-se popular e acessível às classes trabalhadoras em decorrência do seu processo de profissionalização. O futebol, assim como outras práticas de forte radicação popular, pode ser visto como veículo para uma série de dramatizações da sociedade brasileira e sua vivência, seja como praticante ou como espectador, permite ao ator social usufruir concretamente alguns elementos significativos da nossa cultura - como a morte, a masculinidade, a violência, a raiva, o racismo, o orgulho, a perda, etc. A partir do final dos anos 60, as escolinhas de futebol, bem como as categorias de base, adquirem um valor e uma obrigatoriedade para a construção do jogador de futebol moderno, pois a manipulação da prática futebolística desde cedo se torna condição necessária para atingir um novo patamar de força física exigida pelo novo modelo hegemônico de prática, bem como a correção de vícios, indisciplinas, atitudes, hedonismos e outros. Sendo assim, consideramos relevante um estudo que se aproxime e compreenda como e em que sentidos os professores/treinadores situados nas escolinhas de futebol representam sua prática laboral cotidiana.

METODOLOGIA:

Para tanto, nos apoiamos na linha teórico-metodológica das representações sociais, que ganha relevo no Brasil na década de 90 e tem se mostrado bastante eficaz no tratamento de questões do cotidiano, como o futebol, por exemplo. Representar seria um processo cotidiano de construção do conhecimento sobre a realidade, que tem o objetivo prático de orientar as ações dos atores sociais em relação a objetos que o afetam, que lhes são relevantes e implicar na construção de uma visão consensual da realidade para um grupo específico. Porém, os sentidos das representações sociais do futebol estão intimamente ligados à prática esportiva, a empiria das ações concretas no contexto do campo futebolístico. Delineamos como metodologia a aplicação de entrevistas semi-estruturadas sob a forma de diálogo espontâneo dirigidas a três professores/treinadores: um com maior experiência no ramo das escolinhas de futebol e outros dois ainda estudantes de Educação Física na Unesp de Presidente Prudente que cumprem estágios não-obrigatórios numa escolinha de futebol municipal, seguido de mapeamento e análise das representações no intuito de identificar e compreender os sentidos que circulam no discurso dos atores sociais que se utilizam da prática do futebol no interior das escolinhas.

RESULTADOS:

Através da análise dos discursos, conseguimos captar alguns sentidos bem marcados que dão norte à prática do futebol no interior das escolinhas: evolucionista; disciplinador; moralista; e tecnicista. O sentido evolucionista do discurso foi mapeado nas representações que objetivam a importância da prática do futebol como sendo evoluir o indivíduo para que ele melhor se adapte ao meio, ao campo de práticas no qual está inserido. O sentido disciplinador do discurso foi mapeado nas representações que ressaltam o caráter ascético da prática futebolística, no intuito de que, desde cedo, deve-se educar os jogadores para que obedeçam, sintam prazer nos treinos de preparação física, vivam de forma regrada, em suma, transformando-os em corpos disciplinados, obedientes e utilizáveis. O sentido moralista do discurso foi mapeado nas representações que propõem a inserção das crianças nas escolinhas como uma alternativa às drogas, à malandragem, à rua e ao hedonismo no geral, no intuito de construir um conjunto de regras e normas que será introjetado pelo jogador de forma que seu comportamento se adeque ao padrão instituído socialmente. O sentido tecnicista do discurso foi mapeado nas representações que encerram numa proposta de escolinha como sendo a base para a formação dos jogadores que irão atender às necessidades do mundo profissional, mercadorizado e racionalizado do futebol, e que elegem o aperfeiçoamento e o desenvolvimento das técnicas como objeto de intervenção

CONCLUSÕES:

Mediante a análise dos sentidos das representações sociais do futebol presentes nos discursos dos professores/treinadores, podemos concluir que, nas escolinhas de Presidente Prudente/SP, há uma determinação coercitiva e autoritária de como deve ser a manifestação corporal do futebol através de uma intervenção seriada, detalhista e pontual ao longo do tempo de existência do jogador norteada por uma representação social desenvolvimentista de prática desportiva. Os professores/treinadores que operam dentro das escolinhas de Presidente Prudente não se apropriaram do conhecimento de que grupos específicos, em seu cotidiano, constroem suas próprias formas de prática futebolística ou, pelo menos, vivenciam a mesma prática com significados diferentes, e apresentam, em seus programas, um modelo hegemônico de prática de futebol impregnado no imaginário social dos nossos atores através da mídia televisiva e impressa.