Resumo

As práticas pedagógicas da Educação Física com a Educação Infantil, historicamente, têm sido marcadas por abordagens que oferecem pouca margem para a participação ativa das crianças em seus processos de aprendizagem e de desenvolvimento. Essas práticas, influenciadas por paradigmas biológicos e universais, cuja ênfase recai sobre os fatores maturacionais do desenvolvimento infantil, secundarizam a dimensão sociocultural presente nesse processo. Buscando afirmar práticas pedagógicas que considerem a criança em sua complexidade biopsicossocial, os objetivos desta dissertação são: a) analisar uma proposta de mediação pedagógica da Educação Física com a Educação Infantil que mobilizou pressupostos da Sociologia da Infância e do Comportamento Motor; e b) avaliar o processo de mediação empreendido, considerando a postura pedagógica da professora, os pressupostos teóricos mobilizados e, sobretudo, as formas de se expressar e comunicar das crianças. Utiliza-se a pesquisa-ação existencial como opção metodológica, que foi realizada em um Centro Municipal de Educação Infantil de Vitória/ES, com uma turma de doze crianças na faixa etária de cinco a seis anos de idade. A pesquisa teve a duração de seis meses, totalizando 40 encontros, que foram tematizados por jogos e brincadeiras com os esportes. Os dados foram produzidos por meio de observação participante, desenhos e fotografias e sistematizados em diário de campo. As mediações foram construídas em uma relação dialógica, em parceria entre professores e as crianças, e a execução das habilidades motoras não foi externamente orientada, mas ocorreu por meio de um processo que considerou as agências dos infantis e as suas subjetividades. A diversificação e a combinação das habilidades de correr, saltar, driblar, arremessar, rebater, receber e manipular materiais ganharam sentidos para as crianças, pois foram realizadas com base em suas experiências e mediante as suas práticas autorais. Com base na reprodução interpretativa, os infantis empreenderam as suas marcas identitárias nos bens culturais que lhes foram apresentados, ressignificando-os conforme os seus interesses e possibilidades. Ancorado-se nos pressupostos da Aprendizagem Motora, realizou-se brincadeiras em que as crianças tiveram a liberdade de decidir como executar as suas habilidades motoras em situações abertas e fechadas. Essas decisões exigiram adaptações paramétricas, que ocorreram à medida que perturbações foram incluídas. A professora desenvolveu a escuta sensível e o olhar atento às diferentes linguagens das crianças, às suas formas singulares de se expressar e de se comunicar. Ao ressignificar o olhar sobre o campo do Comportamento Motor, considerou-se as individualidades infantis, o contexto sociocultural em que as crianças se desenvolviam e a forma singular que elas agiam e se comunicavam. As práticas pedagógicas analisadas sinalizaram possibilidades para mobilizar os pressupostos do Comportamento Motor e da Sociologia da Infância, contribuindo para a efetivação de mediações que consideraram a criança como sujeitos ativos em seus próprios processos de desenvolvimento. Ressaltamos a necessidade de que mais pesquisas abordem os cotidianos escolares e que a produção do conhecimento científico esteja cada vez mais próxima do que realmente acontece na prática pedagógica com as crianças pequenas, superando, dessa forma, a dicotomia entre teoria e prática.

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