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Não só nos dias atuais, mas ao longo de seu processo histórico, as pesquisas na área de educação física escolar parecem ser ainda incipientes. Em comparação com outras subáreas da educação física, como por exemplo: fitness, desporto de alto nível, atividades em academias etc., a educação física escolar além de desvalorizada, parece vir sendo preterida, tanto por graduandos, quanto por profissionais da área.

Iremos demonstrar, mediante dois exemplos, extremos da educação física escolar e sua situação de desvalorização e descaso, tendo como conseqüência uma débil educação física escolar, com poucos pressupostos científicos.

Marcelo Marcelino da Fonseca (1997) relata suas experiências como professor de educação física do Município do Rio de Janeiro. A seguir, com o auxílio da literatura especializada, observou que vem acontecendo uma ambigüidade na Educação Física Escolar. No discurso ela é considerada como uma disciplina importante dentro da escola, mas, na prática, ou seja, nas ações e atitudes dos profissionais nela envolvidos a situação se modifica, sendo disciplina desacreditada pelas secretarias de educação, direção de escolas, professores, alunos, pais, e o que é pior, até por muitos profissionais da própria disciplina. Com isso, ela acaba sendo percebida como um elemento menor e secundário do fenômeno educacional, sendo utilizada somente como instrumento para os interesses da atual ideologia, em decorrência de um imaginário a esse respeito.

Neste trabalho levantamos a possibilidade que o processo de desvalorização da educação física escolar tem seu início na própria universidade, isto é, no período de formação do acadêmico de educação física. Um bom exemplo pode ser o desinteresse dos acadêmicos pela educação física escolar como temática de pesquisa.

Para testar essa possibilidade decidimos estudar o caso do Curso de Licenciatura Plena em Educação Física e Desportos (BRASIL.UERJ. Deliberação 021/94), da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ).

Nesta perspectiva, o objetivo deste estudo é verificar a incidência da escolha da ‘educação física escolar’ como temática de pesquisa em dez anos de encontros de iniciação científica organizados na UERJ.

Julgamos que este trabalho poderá contribuir, até certo ponto, para que os professores formadores de professores de educação física fiquem mais conscientes sobre as ênfases e enfoques adotados pelos licenciandos interessados em pesquisa no momento da escolha dos temas de investigação.

Neste estudo descritivo (TRIVINÕS,1987) usamos como técnica de pesquisa a ‘análise documental’ e como instrumento de classificação e análise o Systematisation of Research Approaches in Physical Education - SRAPE (FARIA JUNIOR, 1987).
O ‘corpus’ de análise ficou composto pelos resumos de pesquisa feitos por discentes do curso de educação física e publicados em 10 Anais das Semanas de Iniciação Científica da UERJ - SEMICs, entre 1992 e 2001, totalizando 90 trabalhos.

Temos consciência que o período de 10 anos, embora não ideal para propósitos analíticos, é considerado suficiente para permitir as análises e até mesmo observar mudanças paradigmáticas (PRICE, 1963). Os dados obtidos foram tratados com os recursos da Estatística Descritiva.

Portanto, apresentamos em ordem de prevalência, os enfoques das tendências de pesquisa, dos discentes da UERJ, relatados por BOTELHO, SANTOS (2002): 1o técnico, 32,22%; 2o sócio-antropológico, 25,55%; 3o promoção da saúde, 20%; 4o pedagógico, 16,68%; 5o biológico, 4,44%; 6o filosófico, 1,11%.

Dentre os 90 resumos analisados, apenas sete (7) se dedicam à educação física escolar, significando quantitativamente 7, 77%. Eis os títulos dos resumos, com suas respectivas SEMICs, autores e datas de publicação, em ordem cronológica: 1A - Sexualidade nas Aulas de Educação Física: uma forma de dominação? (MELO, 1992); 2a - Conteúdos Sexuais na Prática de Atividades Físicas: uma possível forma de dominação? (MELO, 1993); 3A - Jogos Internos do CIEP Nação Mangueirense: construindo a cidadania (CUNHA JUNIOR, 1994); 6A - Avaliação no Processo Ensino-aprendizagem na Educação Física Escolar: reprodutora ou transformadora? Um projeto de pesquisa (VIEIRA, 1997); 9A - Avaliação Prática no Processo Ensino-aprendizagem do Volley-ball no Cenário Escolar: contribuições do estágio supervisionado (GAMA, 2000); 10A - A Competição e o Tempo de Movimento nas Aulas de Educação Física: um estudo exploratório (PINTO, VILLANO, 2001); 10A - Prazer, Educação Física e Educação (LOPES, 2001).
Quadro Classificatório dos Sete (7) Resumos que se Dedicam à Educação Física Escolar, seus Enfoques de Pesquisa, com suas Respectivas Ênfases:

RESUMOS ENFOQUES ÊNFASES

Sexualidade nas Aulas de Educação Física: uma forma de dominação?
SÓCIO-ANTROPOLÓGICO SEMÂNTICA
Conteúdos Sexuais na Prática de Atividades Físicas: uma possível forma de dominação?
SÓCIO-ANTROPOLÓGICO SEMÂNTICA
Jogos Internos do CIEP Nação Mangueirense: construindo a cidadania
SÓCIO-ANTROPOLÓGICO SEMÂNTICA
Avaliação no Processo Ensino-aprendizagem na Educação Física Escolar: reprodutora ou transformadora? Um projeto de pesquisa
PEDAGÓGICO ENSINO
Avaliação Prática no Processo Ensino-aprendizagem do Volley-ball no Cenário Escolar: contribuições do estágio supervisionado
PEDAGÓGICO ENSINO
A Competição e o Tempo de Movimento nas Aulas de Educação Física: um estudo exploratório
TÉCNICO TREINAMENTO DESPORTIVO
Prazer, Educação Física e Educação
FILOSÓFICO
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Conclui-se que são poucos (7,77%) os estudos acerca da educação física escolar apresentados na UERJ pelos discentes (e supervisionados pelos docentes). Isto pode ser visto como uma contradição, se considerarmos que se trata de um Curso de Licenciatura em Educação Física. Isto se deve, em nossa interpretação, ao enfoque tecnicista que caracteriza o currículo deste Curso. Segundo BOTELHO, SANTOS (A SAIR, 2002) os discentes têm como principal tendência de pesquisa o enfoque técnico. Isto devido as seguintes ênfases: biomecânica (19 trabalhos) - obrigatória no currículo, além de docentes comprometidos em pesquisar com discentes; Treinamento desportivo (quatro trabalhos) - o currículo preconiza disciplinas voltadas para o desporto; traumatologia (seis trabalhos) - docentes das disciplinas de anatomia humana, biomecânica e biometria têm fornecido subsídios para tais estudos. Ainda sim, essa situação agravou-se pela ‘maioria dos docentes’ que ao ministrarem disciplinas de desportos ou não, coletivos e individuais, adotam posturas práticas e tecnicistas, muito próximas ao conhecimento de senso comum, influenciando assim, o corpo discente a uma não adesão a pesquisas relacionadas à educação física escolar.

Quanto a classificação dos enfoques e respectivas ênfases desses sete artigos, predominou-se o enfoque sócio-antropológico (três resumos), todos com ênfases semânticas. Isto se deve, ao fato de que os orientadores dos mesmos, foram os docentes FARIA JUNIOR, FARINATTI, estes preocupados com a difusão de pesquisa na área de educação física escolar. Cabe ainda ressaltar, que um dos trabalhos com enfoque sócio-antropológico (MELO, 1993), foi aprimorado em relação à sua primeira versão (MELLO, 1992). Já os outros, distribuiram-se entre os enfoques técnico, de acordo com o currículo, pedagógico (dois), filosófico.

A educação física escolar (EFE) parece vir sendo percebida como elemento menor e secundário do fenômeno educacional tanto por graduandos, quanto por profissionais da área em comparação com outras subáreas da educação física. Neste trabalho levantamos a possibilidade de que o processo de desvalorização da EFE tem seu início na própria universidade. Para testá-la decidimos estudar o caso do Curso de Licenciatura Plena em Educação Física e Desportos (BRASIL UERJ. Deliberação 021/94), da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). O objetivo deste estudo é verificar a incidência da escolha da ‘EFE’ como temática de pesquisa pelos discentes da referida área em 10 anos de encontros de iniciação científica da UERJ, publicados em 10 Anais das Semanas de Iniciação Científica, entre 1992 e 2001, totalizando 90 trabalhos. Neste estudo descritivo usamos como técnica de pesquisa a ‘análise documental’ e como instrumento de classificação e análise o Systematisation of Research Approaches in Physical Education - SRAPE (FARIA JUNIOR, 1987). Temos consciência que o período de 10 anos, embora não ideal para propósitos analíticos, é considerado suficiente para permitir as análises e até mesmo observar mudanças paradigmáticas (PRICE, 1963). Os dados obtidos foram tratados com os recursos da estatística descritiva. Apresentamos, em ordem de prevalência, os enfoques das tendências de pesquisa, dos discentes da UERJ, relatados por BOTELHO, SANTOS (A SAIR, 2002): 1o técnico, 32,22%; 2o sócio-antropológico, 25,55%; 3o promoção da saúde, 20%; 4o pedagógico, 16,68%; 5o biológico, 4,44%; 6o filosófico, 1,11%. Dentre 90 resumos, apenas sete se dedicam à EFE, significando quantitativamente 7, 77%. Conclui-se que são poucos os estudos acerca da EFE apresentados na UERJ pelos discentes (e supervisionados pelos docentes). Isto pode ser visto como uma contradição, se considerarmos que se trata de um Curso de Licenciatura em Educação Física. Em nossa interpretação, o enfoque tecnicista, caracteriza o currículo deste Curso. Ainda sim, essa situação agravou-se pela ‘maioria dos docentes’ que ao ministrarem disciplinas de desportos ou não, coletivos e individuais, adotam posturas práticas e tecnicistas, muito próximas ao conhecimento de senso comum, influenciando o corpo discente a uma não adesão a pesquisas relacionadas à EFE. Classificação dos enfoques desses sete artigos: predomínio do enfoque sócio-antropológico (em número de três). Isto se deve, ao fato de que os orientadores dos mesmos, foram os docentes FARIA JUNIOR, FARINATTI, estes preocupados com a difusão de pesquisa na área de EFE. Já os outros artigos, distribuiram-se entre os enfoques: técnico (um); pedagógico (dois); e filosófico (um).

Obs. Os autores, Alfredo Gomes de Faria Junior, Daniela Maria Barreto dos Santos( e-mail: dany.mbs@zipmail.com.br), Dominique Christine Miranda e Rafael Guimarães Botelho (e-mail: rafaelgebotelho@ig.com.br) são da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ

Referências bibliográficas

  • Botelho, Rafael Guimarães, Santos, Daniela Maria Barreto dos. Dez anos de Iniciação Científica na UERJ: a produção discente na área da educação física escolar. In: Semana de Iniciação Científica da UERJ, 11, 2002, Rio de Janeiro. Livro de Resumos. Rio de Janeiro: UERJ, Dcarh/Sr-2. (A SAIR).
  • Brasil.Universidade do estado do Rio de Janeiro. Resolução nº 188, do Conselho Superior de Ensino e Pesquisa, que ‘aprova o novo currículo pleno do IEFD/UERJ. Boletim UERJ, Rio de Janeiro. nº 193, p. 109 - 121, jan./jun. 1988.
  • Faria Junior, Alfredo Gomes de. The Teaching of Physical Activities for the Elderly: the state of art. In: 8th EGREPA International Congress, 2000, Brussel. Proceedings ... p. 21 - 26. Brussels: ULB, 2000. 369.
  • Faria Junior, Alfredo Gomes de. Trends of Research in Physical Education in England, Wales and Brazil (1975-1984): a comparative study. 1987. Relatório de Pós-doutorado (Educação para a saúde e bem-estar). London: University of London Institute of Education, 1987.
  • Faria Junior, Alfredo, Farinatti, Paulo, Ferreira, Marcos Santos. Educação Física: Memórias de Licenciatura - 1992 - 1994. Rio de Janeiro: UERJ, 1995.
  • Faria Junior, Alfredo Gomes de, FARINATTI, Paulo de Tarso Veras (orgs.). Pesquisa e Produção do Conhecimento em Educação Física. Rio de Janeiro: Ao Livro Técnico, 1992.
  • Fonseca, Marcelo Marcelino. Uma Visão Sobre o Valor da Educação Física Curricular, a Partir de Perspectivas Imaginárias e Ideológicas. 1997. 153 f. Dissertação (Mestrado em Ciência da Motricidade Humana), Universidade Castelo Branco, 1997.
  • Fonseca, Marcelo Marcelino. Uma Visão Sobre o Valor da Educação Física Curricular, a Partir de Perspectivas Imaginárias e Ideológicas. 1997. 153 f. Dissertação (Mestrado em Ciência da Motricidade Humana), Universidade Castelo Branco, 1997.
  • Price, D. J. S.Little Science. Big Science. London: Columbia University Press, 1963.
  • Trivinos, Augusto Nibaldo Silva. Introdução à Pesquisa em Ciências Sociais: a pesquisa qualitativa em educação. São Paulo: Atlas, 1987.