Integra

Em uma semana dominada pela notícia da reeleição do presidente do Comitê Olímpico Brasileiro para mais um mandato não vou me deter em analisar o óbvio sobre o abuso de poder ou das instâncias democráticas para justificar atitudes arrogantes e autoritárias. Se tem uma coisa que realmente me faz mal ao fígado é a intransigência, a injustiça e a incompetência. Não é a toa que todas essas palavras tenham em comum o prefixo in, afinal in significa a “falta de alguma coisa” no caso transigência, justiça e competência.

Sou de um tempo que a justiça era um dos maiores desejos da sociedade, a transigência fazia falta nas relações sociais e a competência era confundida como uma das características únicas do mundo capitalista. Não imaginava que fosse viver para ver o meu país inverter vários desses quadros. A justiça, ainda parece uma criança frágil que vive sob cuidados constantes de médicos as vezes mais, as vezes menos, competentes, que tenta se livrar daqueles tantos remédios que é obrigada a tomar todas as manhãs para se manter de pé. Mas, felizmente entre uma CPI e outra e mensalões julgados e outras privatarias esquecidas tenta se erguer e caminhar com as próprias pernas. E por fim vi o discurso sobre a competência ganhar novos rumos, deixando de ser má intenção de ávidos exploradores para ser o desejo não mais contido de quem quer ver o país se tornar digno de sua condição de sexta maior economia de mundo e por que não uma potência não mais do futuro, mas desse presente que vivemos.

Essa semana estive em Brasília para mais uma jornada de trabalho olímpico e vivi uma daquelas experiências de encher os olhos, o peito e o coração de orgulho.

Além de ir até lá para buscar o depoimento de alguns olímpicos fui também para participar da apresentação dos 30 atletas selecionados para o Programa Rumo ao Pódio Olímpico 2020 do Instituto Joaquim Cruz. Esse programa nasceu com o intuito claro e definido de formar atletas para subirem ao pódio nos Jogos Olímpicos em 2020. Para tanto os profissionais envolvidos com essa ação se esmeraram em produzir um processo seletivo que mesclasse diferentes experiências fossem no âmbito técnico, fossem no social e psicológico. Desde a primeira vez que falei com Joaquim sobre isso nossas visões convergiram para o mesmo ponto: a busca da excelência. Não que os projetos sociais, as propostas inclusivas ou recreativas não sejam importantes ou não nos interessem, afinal, ele próprio Joaquim mantém há mais de uma década o Projeto Pés Descalços, em parceira com a Caixa Econômica Federal, em Brasília, e que tem por objetivo justamente proporcionar a um grande número de crianças a oportunidade de praticar atletismo. Mas, naquele momento, pensávamos nos jovens, talentosos, que gostam da competição, da busca de seus limites e da excelência assim como foi o próprio Joaquim.

Gosto da coragem, da falta de vergonha de Joaquim em dizer que é preciso ser melhor sempre, que é preciso sair da mediocridade, de se esconder na média. Além de ser o detentor de duas medalhas olímpicas, ele também foi o ganhador do prêmio de melhor técnico do atletismo paraolímpico de 2011 pelo Comitê Paraolímpico Norte americano, além de ser indicado para estar entre os melhores técnicos Olímpicos e Paraolímpicos da terra do Tio Sam. Joaquim prova com seu jeito sereno e low profile de ser o que é que o esporte em geral, o esporte brasileiro em particular, e principalmente, os atletas brasileiros precisam para que o Brasil avance um pouco na condição de potência olímpica: a busca constante, ininterrupta e prazerosa pela excelência.

Vi em um dos dias em que ele, junto com os demais técnicos da equipe, foi dar treino no Centro Olímpico, do Parque da Vaquejada, em Ceilândia, para os selecionados do Programa. A forma honesta, simples, firme e ao mesmo tempo afetiva de tratar aqueles jovens. Que maravilha poder ter uma pessoa como ele que faz mais do que fala. Um educador mimético, que transmite com sua própria atitude os valores tão necessários para se formar um atleta, um aluno ou um cidadão.

Claro que eu e mais alguns milhões de brasileiros ficamos nos perguntando por que é que Joaquim Cruz ainda não voltou para o Brasil para repartir entre os corredores brasileiros seu conhecimento e experiência de atleta e técnico campeão. O que falta para que Joaquim volte se, mesmo sem ser esse seu objetivo, ele vai provando a cada desafio sua competência como técnico e formador?

Essa pergunta ficou ainda mais sem resposta depois que encontrei o Prof. Fernando Franco Ferreira e ele me mostrou o estudo meticuloso que fez sobre o estado da arte do atletismo brasileiro dos últimos 10 anos. O Prof. Fernando por conta própria, diga-se de passagem, acompanha todas as competições do atletismo brasileiro, masculino e feminino, e fazendo uso de um modelo estatístico apurado mostra a progressão (ou melhor, a parada) dos tempos dos atletas brasileiros tantos das provas de velocidade como as de fundo e meio fundo. Depois de mostrar que os tempos estacionaram há mais de 10 anos perguntou indignado o que acontece para que esse estado de coisas se mantenha, porque é que o índice brasileiro fica sempre em um patamar que corresponde ao tempo das semifinais dos Jogos Olímpicos e porque essa política não muda, levando o atletismo brasileiro a um nível que está longe de nos dar o orgulho que já foi comum no passado.

Fiquei sem ação e sem resposta. Afinal, conheço muitos dos atletas que representam o país nas provas olímpicas e sei o quanto são dedicados. Ouvi muitas histórias de vida em que a superação de limites sociais, mais até do que os pessoais, foi tão intensa que já valeria muitas medalhas e homenagens. Mas é inegável que os problemas estão como a agua em um ambiente fechado que já começa a alcançar a altura do nariz e não há indicação alguma para a saída mais próxima.

Essa discussão veio à tona logo após uma reunião da equipe técnica e multidisciplinar do Programa Rumo ao Pódio Olímpico junto com Joaquim Cruz em que se discutiu e tratou do planejamento das atividades para os próximos meses. Afinal, ninguém do grupo quer correr o risco de repetir os mesmos erros já apontados pelo Prof. Fernando. O PRPO, que nasceu da certeza de Joaquim de que há outros muitos garotos e garotas habilidosas no Distrito Federal como ele foi, é a materialização de uma proposta de excelência que não fica apenas na esfera do discurso, mas que se aplica no dia a dia dos selecionados desde a primeira etapa do processo seletivo.

E não há aqui qualquer contradição. Isso porque a busca pela superação deixou de ser um objetivo longínquo para ser um exercício cotidiano na construção de uma identidade vitoriosa, tarefa nada fácil para um país que se acostumou a ouvir que os melhores do mundo estavam no norte, independente do continente.

Essa marca que Joaquim Cruz imprime ao PRPO certamente fará a diferença na formação desses 30 novos atletas que correm todos os dias em busca de seus sonhos, de transformação de si próprios e de suas famílias. Ali não se sonha em ser um atleta olímpico, ali se trabalha para se ser um medalhista olímpico, independentemente da realização dos Jogos no Rio de Janeiro em 2016.

E conforme Joaquim falou a Christian Carvalho Cruz, em entrevista durante os Jogos Olímpicos de Londres (http://www.estadao.com.br/noticias/esportes,entrevista–joaquim-cruz-fala-de-seus-projetos,916015,0.htm) quando perguntado por que ele insistia, por que lutava contra uma estrutura que tem pelo menos 500 anos ele respondeu depois de longo silêncio, emocionado:

“Olha, o meu trabalho como gente, como ser humano, não acabou ainda. Eu nasci com um objetivo. E se isso não for levado para a frente, todo o sacrifício, os treinamentos, as dores, as cirurgias terão sido em vão. (Silêncio de novo.) Existe algo maior do que tudo isso, sabe? Eu acredito que toda criança nasce uma estrela e tem o direito de brilhar. E nós adultos temos a responsabilidade de oferecer oportunidades de ela brilhar. Acho que é isso.”

Por isso eu colaboro com a campanha “Volta Joaquim!”

Por katiarubio
em 7-10-2012, às 20:24

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Comentários

Joaquim Cruz, exemplo de atleta e também de gestor esportivo. Sabe que para alcançar a excelência no alto rendimento é preciso de organização e investimentos diversos. Diferentemente de um “plano de emergência” como parece ser o Brasil Medalhas 2016, aposta no planejamento a longo prazo. Boa sorte no PRPO e que o Brasil possa acolhê-lo de volta, se esta for a sua vontade!

Por Flávio Ramon
em 7-10-2012, às 21:43.

Prafa Kátia, não deixe de me inscrever na campanha “Volta Joaquim”. Vamos engajar o Centro Esportivo Virtual nessa? A Sra. topa ser a embaixatriz do CEV no Instituto Joaquim Cruz pra tricotar a parceria? Parece que eles ainda não tem uma biblioteca por lá. Não achei também alguma coisa sobre a democratização digital. Gostei da notícia no Twitter

#podiolimpico reunião das Equipes do PRPO com Joaquim Cruz e Kátia Rubio pic.twitter.com/8gw8Gpgu

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