Resumo
Nos últimos 10 anos verificou-se o aumento vertiginoso no número de praticantes de corrida de rua e de publicações especializadas, nas quais há constante e maciça divulgação de conteúdos científicos com o intuito de dar credibilidade e respaldo aos textos e anúncios – tendo em vista o caráter positivo, neutro, de “verdade” e novidade que o discurso da ciência assume. Uma vez que é tão custoso – e desejável – que a ciência se faça presente para toda a população, é interessante observar essa via de difusão. Assim, o objetivo desse trabalho foi verificar em duas revistas especializadas em corrida de rua como é feita a divulgação da ciência, e para tanto utilizamos a Análise do Conteúdo para investigar sua presença e funcionalidade, as fontes utilizadas e os temas tratados, de forma a subsidiar não apenas a análise de como melhorar essa difusão mas também propor, a partir dos Estudos Culturais, uma reflexão sobre o tipo de homem e estilo de vida projetados. Conclusões: Observamos que as assessorias de imprensa dos centros produtores de pesquisa em esporte brasileiros apresentam uma atuação deficitária em relação às redações que publicam material deste segmento. Identificamos que o espaço está aberto para divulgação, mas não existe esta aproximação de forma eficiente. Os centros de pesquisa estrangeiros foram muito mais evidenciados em relação aos centros nacionais (69% do total de citações de ciência são internacionais contra 31% de nacionais). A assessoria nacional mais elogiada pelos editores foi também a organização que mais frequentemente apareceu nas citações científicas brasileiras, a Unifesp, mostrando como um trabalho bem realizado efetivamente traz resultados e ajuda os pesquisadores a compartilhar seus achados com a população. Em relação ao conteúdo de ciência divulgada compreendemos que é reflexo dessa falta de relacionamento com pesquisadores para que possam explicar os métodos e complexidades de uma pesquisa. Na falta desse aprofundamento o que se publica são apenas resultados sem a devida contextualização, o que dá ao leitor a ideia de promessas e milagres, acreditando que pode (e deve) aplicar os métodos em sua vida. Aliado a isso, a divulgação de páginas e páginas incitando-o a ser melhor e mais rápido são as receitas e fórmulas mágicas de como ser um atleta. Verificamos, ainda, como o material das revistas abordando a divulgação de ciência ecoa no homem moderno: se por um lado o tornou um corredor mais rápido, também o fez retirando a liberdade de um 'brincar' esportivo despretensioso, associando a ele a necessidade de performance de uma máquina. Se para os atletas de elite a ciência impõe de forma incisiva a performance como valor absoluto e a consequente dificuldade em delimitar o que é válido ou não na eterna busca pela superação, para os esportistas recreacionais estas dúvidas e pertinências também estão presentes, ainda que em uma escala menor, mas não menos importante.