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1 - INTRODUÇÃO

O presente artigo tem por objetivo discutir a inclusão social e a educação física, procurando contribuir com o debate que se tem travado na área. Nossa intenção é discutir a inclusão, tema bem contemporâneo, nos seus aspectos teóricos e práticos de forma a perceber as realidades e possibilidades de uma educação inclusiva que comungue com uma sociedade também inclusiva, de forma dialética, na qual ambas são interdependentes e inter-influentes.

De fato, quando buscamos referências no passado é possível constatar que: 1º) as sociedades procuravam fazer distinção entre os "normais" e "anormais"; 2º) esta demarcação implicava numa hierarquização das posições; 3º) e isto denotava a maior ou menor importância dada as pessoas, ou até mesmo, a sua sobrevivência.

Na Antiguidade Clássica, tal situação foi bem evidenciada, como podemos notar no filme "300". Em uma determinada passagem do mesmo, mostrou-se que os recém-nascidos que apresentassem alguma deformidade que os "afastassem" daqueles indivíduos do ideal de guerreiros espartanos, estes eram lançados de um penhasco, para a morte. Esparta era uma cidade onde a guerra era exaltada e, para se afirmar como uma "potência" se empenhava em uma busca desenfreada pela perfeição dos indivíduos que, mais tarde, se tornariam guerreiros defensores de sua pátria. Pelo mesmo motivo, aqueles que não correspondiam à imagem dos tão sonhados guerreiros, eram eliminados logo ao nascer. O que assusta a todos é que, ainda hoje, em determinadas tribos, esta é uma prática bastante comum.

Apesar de ainda observarmos limites impostos, por exemplo, no acesso aos diversos espaços e locais em nossa sociedade; no geral, podemos dizer com certa segurança, que a visão dos ditos "normais" sobre os deficientes, tem se alterado de forma ampliada e positiva. Tomando a escola, enquanto um dos principais espaços de formação humana, é passível constatar-se que esta ainda não apresenta uma estrutura física que possa dar acesso aos deficientes como um todo, principalmente os físicos.

E para além do espaço físico, há que se falar no espaço didático-pedagógico, no qual o trabalho educativo fica muito restrito não possibilitando que os alunos, nas suas variadas dificuldades e necessidades, possam se desenvolver plenamente.

Para algumas correntes, pode-se dizer que um grande avanço da inclusão social foi ingressar o deficiente para o interior das escolas, realizando uma inclusão escolar. Para outras, somente o fato do aluno se encontrar em uma escola de ensino regular não resolve o problema da inclusão social, acaba por mascará-lo. As últimas acreditam que a inclusão social deve ocorrer em toda a sociedade e por último, como conseqüência de um processo bem feito, a inclusão escolar. O artigo a seguir vem exatamente e alimentar essas discussões com o objetivo de trazer, ao leitor, uma reflexão maior sobre o tema.

2 - A COMPLEXIDADE DA INCLUSÃO SOCIAL

2-1 Inclusão escolar em escola regular

A proposta da educação inclusiva é promover o "desenvolvimento humano pleno, lidar com a diversidade, com as múltiplas linguagens, saberes e valores". É pensar no deficiente como "sujeito humano, que tem sua história, sua cultura, sua identidade e diversidade; como sujeito social, corpóreo, cultural, de classe, gênero, raça, idade". A escola deve reconhecer e respeitar o aluno como um sujeito social com suas particularidades e individualidades (ARROYO, 2008).

De acordo com Profeta (2007) a educação da criança deficiente não deve ser pensada apenas como educação formal na instituição escolar - especial ou não, deve ocorrer também num processo evolutivo, com experiência, oportunidades de erros e acertos no seu cotidiano.

"É importante partir do princípio de que a inclusão de TODOS, na escola, independentemente do seu talento ou de sua deficiência, reverte-se em benefícios para os alunos, para os professores e para a sociedade em geral. O contato das crianças entre si reforça atitudes positivas, ajudando-as a aprender a ser sensíveis, a compreender, a respeitar e a crescer, convivendo com as diferenças e as semelhanças individuais entre seus pares. TODAS as crianças, sem distinção, podem beneficiar-se das experiências obtidas no ambiente educacional. Os alunos com deficiência, em especial, quando em ambientes inclusivos, podem apresentar melhor desempenho no âmbito educacional, social e ocupacional. Eles aprendem como atuar e interagir com seus pares no mundo"real".Do mesmo modo, o benefício maior para os professores é a co-participação na transformação da Escola, através do apoio cooperativo e do aprimoramento das habilidades profissionais. "As vantagens e benefícios desse trabalho de inserção podem ser observados através do enriquecimento e desenvolvimento do ambiente escolar e de todos que dele fazem parte" (FERREIRA; GUIMARÃES, 2003, p. 117-118).

Durante o 2º semestre do ano letivo de 2006 da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), algumas alunas participaram como voluntárias do projeto: Corpo e diversidade na escola, coordenado pela professora Maria Elisa Caputo Ferreira, em que puderam observar as aulas de Educação Física inclusiva, com crianças deficientes físicas e mentais na escola CAIC- Santa Cruz em Juiz de Fora- MG.

As conclusões que obtiveram dessas observações são positivas, pois perceberam o empenho dos professores em tentar proporcionar melhoria no desenvolvimento motor e intelectual das crianças deficientes, contando com poucos recursos pra trabalhar especificamente com elas, por se tratar de uma escola da prefeitura na periferia. Também perceberam o carinho e cuidado dos colegas de classe para com as crianças deficientes, sendo solidários quando os professores precisavam, o que corrobora com a idéia citada acima.

Embora o objetivo seja a inclusão de fato, as dinâmicas das aulas foram pouco inclusivas, pois quase não existiam momentos em que as crianças "saudáveis" interagiam com as crianças deficientes, as aulas eram divididas em momentos exclusivos para cada grupo de crianças, fazendo com que houvesse dispersão dos alunos quando os professores se dedicavam às crianças deficientes.

Por ser uma escola de periferia, as crianças são em geral, extremamente carentes financeiramente quanto afetuosamente, o que certamente dificulta o desenvolvimento psicossocial, intelectual e físico delas. E tudo isso mostra como é difícil tratar a inclusão, já que, as dificuldades vão além da instituição escolar, incluem a discriminação, o preconceito, as desigualdades sociais, a falta de políticas públicas favoráveis e também a falta de preparação dos professores, funcionários e também dos alunos.

Consideram-se benéficas as intervenções feitas pelos professores e alunos (colegas de classe) junto às crianças deficientes, porque independentemente das dificuldades encontradas, houve um movimento em favor da inclusão de todas as pessoas, não só as deficientes. Existiu interação entre os alunos e os professores o que promoveu de forma perceptível um ganho na formação humana das pessoas envolvidas no processo e também uma nova perspectiva de cidadania, que é o que se preconiza a Educação Inclusiva.

2-2 Inclusão social em escola especial

Entende-se por inclusão social a igualdade entre as pessoas, em todos os setores, fazendo com que as suas necessidades sejam atendidas e respeitadas, principalmente quando nos referimos àquelas com necessidades especiais. A inclusão deve ocorrer de forma constante na sociedade e ser construída, não somente por algumas pessoas, mas por todas elas.

A exclusão aos portadores de deficiência surge, muitas vezes, a partir da falta de informação dos próprios pais. Esses se deparam com uma nova realidade que lhes é apresentada, uma realidade desconhecida e pouco explorada. Pouco se fala sobre deficiência e menos ainda sobre as possibilidades de desenvolvimento, estimulação e terapia. Diversas vezes a falta de conhecimento faz com que a deficiência seja vista como uma doença, um problema. O estigma, assim gerado, transforma os deficientes em pessoas incapazes. É, realmente, um território desconhecido, pouco explorado onde os pais deverão adentrar e buscar conhecer ao máximo, pois são eles que promoverão a interação e inclusão de seus filhos na sociedade.

A inclusão escolar se faz instrumento de grande importância nesse processo. Não uma inclusão simplista que visa apenas à entrada do aluno especial na escola regular e desconsidera suas necessidades diferenciadas (MACIEL, 2007). Trata-se de uma inclusão real que tornará tais pessoas capazes de viver em sociedade, capazes de transformar o mundo em que vivem. Para legitimar esse processo é muito importante que aprendam a ler, escrever, contar e etc. Mas é mais importante ainda que tenham certa autonomia, que possam comer sozinhos, ir ao mercado, atravessar a rua, pegar ônibus, entre outros. São essas atividades que trarão melhorias à vida de cada uma dessas pessoas, que farão com que se sintam importantes, membros reais da sociedade em que estão inseridos.

Porém, o cenário nacional se mostra muito diferente: as escolas não estão preparadas para receber esses alunos, os professores não estão capacitados, quase não há investimento nessa área. Pouco se faz em prol dessa parcela da população. O governo, juntamente com a iniciativa privada, realiza alguns projetos sem consistência que acabam por se superpor, gastar verbas sem modificar grandes coisas. Sem falar que essas ações não têm um caráter permanente, a cada mudança de governo sofrem alterações, esvaziamento, o que faz com que percam continuidade. Investir em inclusão social deveria ser uma medida econômica: tornar o deficiente, assim como os outros cidadãos marginalizados, em pessoas produtivas e conscientes, faria com que os gastos sociais fossem reduzidos.

Com base nessa perspectiva mais ampla e completa de inclusão social, podemos citar a Associação de Livre Apoio ao Excepcional (ALAE), situada na cidade de Juiz de Fora, em Minas Gerais. A ALAE é uma escola especial preocupada com a inserção de seus alunos não só na sociedade, mas também no mercado de trabalho. Os seus esforços vêm sendo observados há pouco mais de um ano, desde agosto de 2006, por alunos do curso de Educação Física da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). Essa observação pôde constatar que a escola acompanhada tem o objetivo maior de enfatizar e explorar o potencial e as capacidades de seus alunos deixando de lado pensamentos discriminatórios que se centram nos impedimentos dos mesmos.

Vários projetos são realizados buscando potencializar as capacidades desses alunos, fazer com que se tornem mais próximos daquela comunidade e menos dependentes. Pode-se citar como exemplo as oficinas de madeira, rádio, bijuterias, biscoitos, entre outras, onde os alunos são estimulados a produzir objetos e vender ,posteriormente, na "feirinha" da instituição. Não só esses são os trabalhos realizados, também se encontram passeios supervisionados, rompendo os limites escolares, para que eles possam viver em sociedade, aprender a atravessar as ruas, pegar ônibus, comprar roupas, etc.

Por fim, pode-se afirmar que se trata de uma proposta mais complexa e, por vezes, de difícil aplicação, mas que traz muita satisfação e felicidade àqueles que contribuem com esse processo. É gratificante perceber a alegria que os alunos têm de viver, de passear, de conversar e interagir com as outras pessoas. Iniciativas bem sucedidas como esta, alimentam o desejo de realização de uma inclusão social de fato, em todos os âmbitos da vida. Assim, se cada pessoa fizer a sua parte e, aos poucos, todos juntos, num futuro não tão distante construiremos uma sociedade mais fraterna e solidária, justa e menos desigual.

Obs: as alunas Thalita Vargas da Silva (thavargas@hotmail.com) e Clarissa Salles Costa (clarissasalles@gmail.com) são alunas da Faculdade de Educação Física e Desportos (FAEFID) da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF).


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

  •  Arroyo, Miguel G. O direito à escola inclusiva. Mímeo, 2007.
  • Ferreira, Maria Elisa Caputo & GUIMARÃES, Marly. Educação Inclusiva.. Rio de Janeiro: Editora DP&A, 2003.
  • Maciel, Maria Regina Cazzaniga. Portadores de Deficiência: a questão da inclusão social. In: www.scielo.br/pdf/spp/v14n2/9788.pdf. Acessado dia 15/07/07.
  • Profeta, Mary da Silva. Mitos e realidades na educação atual das pessoas com deficiênci. In: http://www.unesp.br/prograd/PDFNE2004/artigos/eixo4/mitoserealidade.pdf. Acessado dia 30/07/07.