Resumo

“Dos 10 anos até o momento eu ouço coisas ruins quando jogo futebol. Até os 19 anos eu ouvi que jogar futebol não era coisa de menina e que, portanto, eu só poderia ser algo abominável que merecia ser esculachada dentro e fora das 4 linhas. Alguém que não era ‘mulher suficiente e tampouco poderia ser homem’”. O depoimento do ativista transmasculino Bernardo Gonzales explicita as situações-limite que interditam o futebol aos corpos não enquadrados pelo paradigma da modernidade. É sobre esses episódios da transfobia cotidiana (ou outras formas de violência estrutural e/ou institucional) que nos referimos ao reivindicar espaços seguros e acolhedores para os corpos rejeitados pelo futebol. Desde a gênese do projeto de extensão “Futebóis e Diversidade”, idealizamos uma proposta que ensina futebol a todos, todas e todes, mas, sobretudo a jovens cujas experiências com o futebol tenham sido frustrantes ou desconfortáveis. Assim, assumimos como princípio basilar a garantia do direito das pessoas, sobretudo daquelas colocadas à margem do futebol, a aprender e se sentirem confortáveis nos ambientes futebolísticos. Partimos dessa premissa, por considerarmos que o lugar de privilégio dos sujeitos já inseridos e aceitos nesses contextos lhes garante o livre acesso a outros tempos, espaços e experiências de ensino/treinamento/prática da modalidade, que são formal ou informalmente interditados àquelas/es consideradas/os como corpos dissonantes nesse universo demarcado por uma masculinidade dominante que busca silenciar ou apagar expressões alternativas de masculinidades, feminilidades ou outras identidades não-binárias. Interpelar a condição canônica do futebol moderno pelos futebóis emergentes do paradigma da transmodernidade nos permite a problematização daquilo que para muitas pessoas configura-se como a situação-limite em sua dimensão fatalista, que na perspectiva dialógica e humanizante de Paulo Freire as impede de exercer sua vocação ontológica e histórica de ser mais, desumanizando-os/as.

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