Resumo

Pelotas e Rio Grande são duas cidades do Rio Grande do Sul com expressiva população negra, nas quais, no final do século XIX, o futebol chega como um costume europeu elitista utilizado como marca de distinção social. A partir da segunda década do século XX, com a adesão de operários e da população negra, institui-se um processo de popularização do futebol nessas cidades, o que não significou, no entanto, o fim do racismo nem dos casos de injúria e discriminação racial no universo futebolístico de Pelotas, Rio Grande e toda a zona sul do Rio Grande do Sul. Nesse sentido, o presente estudo buscou analisar e problematizar histórias de racismo nas memórias futebolísticas das cidades de Pelotas e Rio Grande. Os produtos da pesquisa foram sistematizados em três artigos acadêmicos. No primeiro artigo foi realizada uma revisão sistemática qualitativa das produções sobre o negro no futebol brasileiro publicadas em periódicos científicos com escopo na Educação Física classificados nos extratos B2 ou superior pela área 21 do quadriênio 2013–2016. Os resultados indicaram uma pluralidade de temáticas abordadas e de metodologias utilizadas, mas também algumas lacunas, como a ausência de estudos sobre o período entre a copa de 1950 e o início do século XXI; as mulheres negras no futebol; o racismo no futebol escolar e nas categorias de base. O segundo artigo é produto de uma pesquisa histórica documental em jornais diários e semanais da cidade de Rio Grande sobre a Liga Esportiva Rio Branco (1926–1930). Os resultados apontaram que a referida liga era constituída por agremiações esportivas que não eram aceitas na Liga Rio-Grandense, dentre elas, duas agremiações vinculadas à população negra de Rio Grande que mantinham relações com clubes negros de futebol de outras cidades do estado, o Bangu F. B. C. e o S. C. Rio Negro — o qual também participava de outras atividades culturais da população negra de Rio Grande, como bailes, saraus teatrais e o carnaval. O terceiro artigo trata do racismo no futebol profissional de Pelotas e Rio Grande a partir da segunda metade do século XX, através da metodologia da História Oral. Foram relatados vários episódios racistas presenciados pelos ex-futebolistas negros entrevistados. Destaca-se a tendência a uma maior incidência de xingamentos raciais em cidades com uma maior presença de descendentes de imigrantes europeus (alemães, italianos etc.) e de um racismo estrutural velado que aparece de forma subjacente nas escolhas de dirigentes e treinadores de clubes, dificultando as possibilidades de ex-futebolistas negros serem escolhidos para essas funções. Conclui-se que as tensões e os conflitos raciais da sociedade brasileira aparecem como uma marca constituinte da história do futebol do interior do Rio Grande do Sul.

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