Resumo

O jogo, como parte das manifestações da cultura corporal de movimento presente em qualquer sociedade, representa ideias e percepções estruturadas em decorrência das interações culturais estabelecidas ao longo do tempo. No caso das práticas corporais dos povos indígenas, essas interações culturais agregam um componente cosmológico que configura um tipo de manifestação pouco valorizada na sociedade contemporânea que pode ser caracterizada como autóctone. A partir dessa noção peculiar, a presente dissertação teve por objetivo compreender a especificidade dos jogos autóctones indígenas a partir dos significados atribuídos pelos povos de San Juan de Atacuari às manifestações corporais próprias do povo Ticuna, grupo étinco articulador naquela região, reconhecendo a existência dessa configuração relacionada ao jogo, ainda não abordada na literatura acadêmica específica da educação física. A pesquisa foi desenvolvida a partir de um delineamento descritivo com uma abordagem teórico-metodológica qualitativa realizada em três momentos: o primeiro, constituído por um mapeamento na produção do estado da arte entre o jogo desde o campo da educação física e a construção conceitual do autóctone desde a Antropologia; o segundo, uma descrição e localização do contexto no qual se desenvolve a pesquisa; e o terceiro, relacionado à trilha metodológica traçada para o desenvolvimento da investigação. A parte empírica do estudo foi desenvolvida na comunidade indígena de San Juan de Atacuari (Amazonas – Colômbia), entre os meses de fevereiro e abril de 2014, e contou com dezesseis colaboradores locais pertencentes aos povos Ticuna, Cocama e Yagua, escolhidos dentre aqueles que se encontravam posicionados por esta mesma comunidade no lugar de quem possuía certo tipo de conhecimento sobre a cultura local. A partir da análise de narrativas, captadas por meio da entrevista etnográfica, foi possível evidenciar a existência e a prática dos jogos autóctones indígenas naquela comunidade, bem como os múltiplos significados que este tipo de jogo representa para os diversos povos que habitam a região. Em conclusão, foi possível compreender que o jogo autóctone indígena, que na língua Ticuna é chamado de naĩ´ãwee~ i nucuma´ü~, não se resume à manifestação corporal original ou genuína de um povo específico, criação pura e indissolúvel; e sim se caracteriza por uma forma de expressão corporal da cultura ameríndia que presentifica a dimensão cosmológica no ato de jogar, por meio da interação entre seres mitológicos e seres da natureza pertencentes aos planos/mundos vertical e horizontal.

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