Os Espaços Políticos da Escola e Suas Interfaces com a Educação Física
Por Sergio Esteves da Silva (Autor).
Em XI EnFEFE - Encontro Fluminense de Educação Física Escolar
Integra
OS ESPAÇOS POLÍTICOS, O INDIVÍDUO E A SOCIEDADE
Ao abordar os espaços políticos da escola, faz-se necessário frisar que o conceito de política deve aqui abarcar não só os aspectos inerentes à liderança e construção de regras, mas também a "habilidade no trato das relações humanas, com vista à obtenção dos resultados desejados" (Ferreira, 1075, p. 1109).
No contexto escolar, resultados desejados podem ser entendidos como a legitimação do espaço escolar como local privilegiado para o desenvolvimento da aprendizagem de alunos e professores.
Há no meio acadêmico, uma controvertida e turbulenta discussão no sentido de estabelecer quais as reais atribuições da escola, diante das novas exigências da sociedade. Não menos complexa, é a discussão sobre que tipo de homem se quer formar e qual a sociedade que se deseja.
Entendo que o indivíduo, carrega em si tensões, contradições, emoções e potencialidades. Na dinâmica de interações, ao mesmo tempo em que a sociedade influencia o indivíduo, ela é por ele influenciada. A dissociação indivíduo/sociedade é impossível, pois "cada indivíduo traz consigo a marca de uma nação e de uma classe específica" (Simões, 2005).
Portanto, a compreensão da sociedade, passa pela análise da historicidade do indivíduo. Somos ao mesmo tempo, individuais e coletivos. Contudo, se almejamos alguma mudança na Educação, e por conseguinte na sociedade, devemos ter clareza que tal processo se dará, necessariamente, no coletivo. Em outras palavras, faz imperioso ter bem definida a importância do coletivo e a necessidade de visualizar a individualidade de cada ser, para que no coletivo, haja uma resignificação das interações nos espaços escolares, levando possivelmente, à concretização dos resultados desejados.
Vale ressaltar, que o coletivo na escola será diferente de uma unidade para a outra, pois há de se considerar as individualidades presentes, em cada corpo social escolar.
O COLETIVO ESCOLAR E A GESTÃO DEMOCRÁTICA
Entendendo o coletivo escolar como espaço político onde efetivamente ocorrem as tomadas de decisões, há de se ressaltar a importância do líder (diretor), que poderá ser um facilitador do processo de construção do mesmo, fomentando e criando espaços de discussões coletivas, onde todos os envolvidos sejam gestores de sua própria formação.
Nesse sentido, "é necessário que a Gestão Democrática seja vivenciada no dia-a-dia das escolas, seja incorporada ao cotidiano e se torne tão essencial à vida escolar quanto a presença de professores e alunos" (Romão, 2002, p. 66).
Um exemplo de coletivo escolar é o Conselho de Escola - um colegiado formado por pais, alunos, professores, diretor, pessoal administrativo e operacional, para gerir coletivamente a escola.
O Conselho de Escola já é realidade em Estados e Municípios de todas as regiões do país, contudo, apesar de poder exercer funções deliberativas, normativas ou fiscalizadoras, há os que vêem neles uma ameaça.
Os que vêem os Conselhos como ameaça, percebem a força que eles podem ter para minar os instrumentos de poder autocráticos.
Não se pode negar a força do coletivo, já que ele "é um organismo social vivo, colocado ao mesmo tempo, como meio e fim da educação..." (Cambi, 1999, p. 560). E, parece que os nossos representantes sabem bem disso. Como negar o caráter desagregado da distribuição dos horários das aulas? Professores do 3º e 4º ciclos (5ª a 8ª séries) da rede municipal e principalmente da rede estadual, quase não se encontram. Às vezes, professores do mesmo grupo de alunos, nem mesmo se conhecem.
A distribuição do tempo e a organização do espaço escolar conspiram fortemente para que haja uma fragilização do coletivo.
O pior é que nesse cenário, o professor de Educação Física tende a ficar cada vez mais isolado dos processos decisórios da escola.
Em minha trajetória como professor da Rede Municipal de Macaé, Rede Municipal de Niterói e Rede Estadual, na qual também exerci a função de Diretor Geral, presenciei, por diversas vezes, professores de Educação Física sendo dispensados de reuniões e Conselhos de Classe, por não se tratar de assunto do seu interesse. Nessas unidades, infelizmente, a Educação Física é vista como um apêndice, um acessório da escola, a ela ligada, porém dela distinta e, muitas vezes de importância secundária.
ESTADO X MUNICÍPIO - RESULTADO DO PROVA BRASIL
Ao analisar o resultado do Exame Prova Brasil 2006, realizado em âmbito nacional pelo MEC, com o objetivo de avaliar o desempenho em Língua Portuguesa e Matemática de alunos de 4ª série, deparei com o seguinte resultado:
O CIEP 279 Professora Guiomar Gonçalves Neves, em Trajano de Moraes, interior do Estado do Rio de Janeiro, obteve o melhor desempeno em Língua Portuguesa e o segundo em Matemática dentre as escolas de todo o Brasil.
A Escola Municipal Nossa Senhora da Penha, no Morro da Penha, em Niterói, obteve o segundo melhor resultado em Língua Portuguesa e também em Matemática, dentre as escolas da Rede Municipal de Niterói.
Como professor da segunda escola, ocupei-me em levantar alguns elementos que pudessem indicar os possíveis ingredientes do sucesso. Dentre eles destaco:
As escolas não desenvolvem nenhum projeto inovador ou bombástico. O trabalho é focado no planejamento sério e o Projeto Pedagógico privilegia a leitura e escrita.
Há um grande entrosamento das equipes (professores atuam juntos há mais de 5 anos).
São realizadas reuniões pedagógicas semanais, onde são discutidas as melhores estratégias de ensino e troca de experiências.
Todo o grupo se reúne uma vez por mês, para que sejam repensadas as práticas e sejam decididos os novos projetos.
Nenhuma das duas escolas possui mais de 400 alunos.
Aproximadamente 80% dos professores têm nível superior.
Fica evidenciada a importância e a força do trabalho em grupo, como elemento capaz de promover a concretização da aprendizagem.
Ressalto que na Escola Municipal Nossa Senhora da Penha, o professor de Educação física, participa com direito a voz e voto de todas as reuniões pedagógicas ou deliberativas, vivendo intensamente o dia-a-dia da escola e conhecendo seus alunos pelo nome.
Quanto a minha experiência na rede Estadual, destaco que o trabalho se desenvolve apresentando muitas dificuldades, dentre elas:
Horários fragmentados.
Carga horária de 16 horas, muitas vezes cumprida em duas ou mais escolas.
Não há horário pré-estabelecido para reuniões pedagógicas.
Carência de professores e funcionários.
Elevada quantidade de alunos por turma.
Rotatividade de professores.
Falta de identidade coletiva.
Apesar do grande esforço da Direção, os sucessos obtidos no Colégio Estadual Visconde de Itaboraí, devem-se bem mais a esforços individuais do que propriamente à consciência coletiva, embora já se possa vislumbrar inquietações, baseadas no profissionalismo de muitos professores que possivelmente poderão mudar tal estado de coisas.
O leitor mais atento, poderá se perguntar, qual será a escola que tirou o primeiro lugar na Prova Brasil, dentre as Escolas Municipais de Niterói?
A resposta é a Escola Municipal Paulo de Almeida Campos, em Icaraí, que possui uma característica atípica, seus alunos são de classe média. Situação bem diferente das demais escolas da rede que atendem às classes populares. Contudo, talvez esse não seja o fator determinante do sucesso. Além da competência do grupo, existe uma participação ativa dos pais de alunos, tanto no aspecto pedagógico, quanto no que concerne à administração.
Seja da Rede Municipal ou Estadual, concordo com Romão (2002), que a escola ensina não só por meio do conteúdo com o qual trabalha, mas também pelas relações que estabelece com eles no dia-a-dia. O indivíduo que só ouve, dificilmente se fará ouvir; se fala no momento que bem entende, apresentará dificuldade para ouvir o outro;
Se só realiza tarefas individuais, dificilmente aprenderá a pensar e decidir coletivamente; se só cumprir ordens, terá dificuldade de estabelecer seus próprios limites; se achar que não tem nada a ver, nem a fazer com as questões da escola jamais poderá ser um professor de Educação Física.
Obs. O autor, professor esp. Sergio Esteves da Silva ( sergio.est@hotmail.com ) leciona na rede municipal de Itaboraí e na rede estadual RJ
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA:
- Cambi, Franco. História da Pedagogia. São Paulo: Ed. UNESP, 1999.
- Ferreira, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário da Língua Portuguesa, Nova Fronteira, 1975.
- Gadotti, M. e ROMÃO, J. E. Autonomia da escola: Princípios e Propostas. Instituto Paulo Freire. SP: Cortez, 2002.
- Simões, Cássia Custódio. A construção do coletivo no cotidiano escolar, Uberaba, 2005.