Resumo
O lazer está definido na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 como um dos direitos sociais, o que nos indica que ele foi considerado, no momento de construção de tal Constituição, um bem essencial aos cidadãos e ao seu bem-estar, e o acesso a ele foi considerado um fator condicionante da cidadania. Os direitos sociais são tidos como conquistas dos trabalhadores, como resultado da luta política entre capital e trabalho, que ocorre em cada país de forma diferente, são compreendidos como construções decorrentes de múltiplos conflitos e interesses. No entanto, o lugar ocupado pelo lazer e as compreensões em torno dele no Brasil daquele momento, são bastante diversas desse lugar ocupado pelos direitos sociais e da natureza de tais direitos. O lazer era tido com algo supérfluo, secundário, que não foi reivindicado, evidenciando um todo contraditório em torno de sua inclusão como direito social na Constituição de 1988. Esta pesquisa buscou reconstituir a trajetória do lazer na Constituinte para compreender como e por que ele foi incluído na Constituição brasileira de 1988, quais os atores políticos e interesses envolvidos, e quais os significados e compreensões de lazer presentes no processo de construção de tal Constituição. Assim, o corpus documental privilegiado nessa pesquisa foi constituído pelos documentos produzidos pela Assembléia Nacional Constituinte de 1987-1988, e pelos documentos que foram produzidos em torno dela. Os vestígios encontrados revelaram que não houve organização popular, grupos de pressão e interesse em torno do lazer, mas revelaram também que o lazer ocupava um lugar de reconhecido destaque na vida dos cidadãos brasileiros, evidenciado pelo status de direito a ele conferido pelos três diferentes atores políticos participantes da Constituinte - população, entidades e constituintes. O lazer foi entendido como "atividade" por alguns, como "direito fundamental" por muitos, como importante à "realização integral do ser humano" por outros, e como uma das "necessidades básicas" dos cidadãos por muitos outros. Deste modo, as presenças do lazer na Constituinte nos permitem questionar a idéia da existência de um todo contraditório em torno de sua construção como direito social no Brasil, nos permite perceber as singularidades da história do lazer no Brasil.