Programa Segundo Tempo: Uma Proposta de Inserção de Atividades de Aventura
Por Erica Rigolin da Silva (Autor), Filipe Bossa Alves (Autor), Giuliano Gomes de Assis Pimentel (Autor), Amauri Aparecido Bassoli de Oliveira (Autor).
Em VIII Congresso Brasileiro de Atividades de Aventura - CBAA
Integra
RESUMO
O presente trata da sistematização do ensino de atividades de aventura no Programa Segundo Tempo (PST). Partimos da inserção de cinco modalidades das atividades de aventura (AA): skate, escalada, slackline, parkour e corrida de orientação. O PST é um programa de responsabilidade no Ministério do Esporte/Secretaria Nacional de Esporte Educacional que atende crianças e adolescentes em todo o Brasil. As ações são desenvolvidas por meio do esporte educacional, com foco no, desenvolvimento integral dos participantes. No PST já são trabalhadas esportes individuais e coletivos, como por exemplo, dança, futebol, atletismo, ginástica, etc. Para além destas atividades já inseridas no Programa, acreditamos que as AA também podem fazer parte desse universo, por sua riqueza motora e pelos seus princípios e valores já descritos pela literatura. Por meio da pesquisa-ação, a proposta vem sendo aplicada na Escola de Aventura que atende crianças e adolescentes de 7 a 15 anos em contraturno escolar.
INTRODUÇÃO
O Programa Segundo Tempo (PST), iniciado em 2003, se apresenta como uma proposta educacional para o contra turno escolar, visando o desenvolvimento social, afetivo, cognitivo e motor de crianças e adolescentes por meio do esporte educacional. Como afirmam Melo, Souza e Dias (2009, p. 24) “o PST tem como um dos princípios fundamentais a universalização da prática esportiva e a inclusão social, tendo-se no esporte educacional um meio para contribuir no desenvolvimento integral de crianças e adolescentes”. É de responsabilidade do Ministério do Esporte/Secretaria Nacional de Esporte Educacional os objetivos e finalidades que são trabalhadas no Programa. Desde a criação, o Programa já atendeu mais de 05 milhões alunos em todo o Brasil.
O PST trabalha no sentido de que os esportes propiciem o desenvolvimento e aprendizagem de habilidades sem que haja distinções, buscando sempre uma aprendizagem significativa partindo do conhecimento do aluno para poder selecionar e trabalhar os conteúdos, em um ambiente apropriado ao ensino para então, proporcionar situações que os levem a uma participação ativa (PALMA, et. al, 2009).
No PST são trabalhados diversos esportes, individuais e coletivos como: ginástica (geral, aeróbica, acrobática, rítmica e artística), capoeira, dança, esportes adaptados (goalball e bocha), futebol/futsal, basquete, handebol, voleibol, atletismo, natação, tênis de mesa, badminton, rugby tag, ultimate frisbee. Para estas modalidades já existe material pedagógico que auxilia os monitores do Programa na realização das atividades (OLIVEIRA, et. al. 2011; OLIVEIRA, et. al. 2011).
Para além dessas atividades já descritas na literatura, consideramos que outras práticas também deveriam integrar o PST contribuindo para o desenvolvimento de todos os aspectos já citados. Deste modo apontamos as atividades de aventura (AA) como possibilidades de 156 trabalho para o PST.
As AA compreendem diferentes atividades, podendo ser praticadas tanto no meio aquático (surf, mergulho), terrestre (montanhismo, treking), aéreo (paraquedismo, asa delta) e urbano (parkour, skate). Por tanto, as atividades de aventura podem ser praticadas em diversos locais, buscando incertezas e riscos (PIMENTEL e SAITO, 2010), inclusive em espaços estandardizados. As AA trazem consigo o risco, considerado um elemento diferenciador dos esportes tradicionais. Além disso, estas modalidades como apontam Pereira e Armbrust (p. 13, 2010) “lidam com a imprevisibilidade, o perigo, o desconhecido, a vertigem e as proezas heróicas, pode propiciar um ambiente muito rico para que habilidades sejam desenvolvidas em nossos alunos” e ainda que os objetivos para os alunos consiste em “estímulos prazerosos de se movimentar, sentir e agir” (AMBRUST e LAURO, 2010, p. 803).
Para reforçar a importância dessas práticas para o Programa, Betrán e Betrán (2006, p. 183) afirmam que as atividades de aventura não possuem “distinção de sexo, nível motor, interesse competitivo ou diferenciação cultural, que se forem tratados pedagogicamente e didaticamente pode ser considerado um verdadeiro processo interdisciplinar”.
Frente a essas considerações, objetivamos neste estudo apresentar uma proposta de inserção de 5 modalidaes de atividades de aventura no PST: skate, escalada, slackline, parkour e corrida de orientação.
DESENVOLVIMENTO METODOLÓGICO
A Escolinha atende crianças e adolescentes de 7 a 15 anos, que realizam atividades de iniciação esportiva das modalidades de aventura que são divididas em módulos durante 8 meses por ano, duas vezes por semana. Diante disto, analisamos as possibilidades e dificuldades que estas modalidades carregam e, então, propomos modelos de planos de aula com atividades especificas ou não para cada modalidade, classificando os conteúdos em três dimensões: conceitual, procedimental e atitudinal.
A dimensão conceitual se refere ao que será ensinado, ou seja, o que o aluno deverá aprender em termos de conceitos e fatos relacionados às modalidades como, por exemplo, compreender a evolução do “skate” como possibilidade de lazer e de competição. A dimensão procedimental é como eu vou transmitir os conteúdos, como vou ensiná-los e como eu devo agir diante de uma situação concreta de prática de alguma modalidade, como por exemplo, ser gestor dos procedimentos de segurança e saber utilizar os equipamentos de segurança corretamente. A dimensão atitudinal “refere-se ao que se deve ser, efetivada pela atitude do individuo em seu meio” (PAIXÃO, p. 89, 2012). Um exemplo, ao final de uma aula, o aluno saber respeitar as limitações dele e dos outros, buscando atitudes de interação, solidariedade e companheirismo (PAIXÃO, 2012).
As aulas são organizadas em: parte inicial, parte principal e parte final. No início de todas as aulas, há alongamento. Na parte inicial, realizamos exposição verbal do objetivo geral da aula e questionamentos de acordo com os objetivos, como por exemplo, se o objetivo for estimular a prática de atividades de aventura pode-se questionar o que eles entendem por atividades de aventura, quais já praticaram, onde praticaram e só após as respostas apresentar a sua versão ou concordar com o exposto pelos alunos. A parte principal consiste em atividades especificas ou não de alguma modalidade, sempre fazendo a exposição verbal e após o trabalho em grupo, mesmo que as modalidades possuam características individuais. A parte final de toda aula, encerra-se com um círculo conversando novamente as questões trabalhadas na aula, buscando resgatar a importância dos conteúdos.
Plano de unidade da Escola de Aventura
CONTEÚDOS PORCENTAGEM Skate - Histórico da modalidade (15%); fundamentos técnicos (equilíbrio, remada, freios, posição dos pés, ollie) (60%), gestão de segurança e equipamentos de segurança (25%). 20% Escalada - Histórico da modalidade (15%); fundamentos técnicos (tipos de pegadas, pisadas, nós, equilíbrios, deslocamento, quedas) (60%), gestão de segurança e equipamentos de segurança (25%). 20% Slackline - Histórico da modalidade (15%); fundamentos técnicos (equilíbrio, subida na fita, deslocamento, manobras) (60%), gestão de segurança e equipamentos de segurança de acordo com a variação da modalidade (25%). 20% Parkour - Histórico e filosofia da modalidade (15%); fundamentos técnicos (equilíbrio, rolamento, saltos) (60%), gestão de segurança (25%). 20% Corrida de orientação - Histórico da modalidade (15%); fundamentos técnicos (manuseio de bussolas, mapas) (60%), gestão de segurança e equipamentos de segurança (25%). 20%
AULA DE AVENTURA NA PERSPECTIVA DO PROGRAMA SEGUNDO TEMPO
Conforme dito anteriormente as AA tem um diferencial, o risco que as mesmas trazem, o que em certos momentos pode ser um elemento limitador ou motivador. Partindo desse princípio as aulas da Escola de Aventura são planejadas de maneira a controlar esses 158 riscos, propiciar o melhor aproveitamento das aulas possibilitado uma prática dotada de sentido.
Deste modo, Oliveira diz que a proposta para as AA:
[...] gira em torno de uma prática esportiva calcada em princípios fundamentalmente diferentes, a começar pelo deslocamento do objetivo de competição do outro, para a natureza ou até para si mesmo, o que torna possível uma nova visão mais solidária e cooperativa (OLIVEIRA, 2013, p. 46).
A iniciativa da Escola de Aventura parte desse ideal, não restringindo a participação de alunos, não importando classe social, etnia ou qualquer outro fator. Uma aula de AA deve buscar valorizar em seus participantes, o cooperativismo, proporcionar um olhar crítico da sociedade além de um conhecimento mais profundo da modalidade praticada.
Atualmente a aventura vem tendo um aumento no número de produções que procuram incluí-la no currículo escolar, em iniciação esportiva e em programas educacionais, ONGs e entidades afins (OLIVEIRA, 2013). Voltado para o PST temos, por exemplo, o trabalho de Euflausino, Oliveira e Pimentel (2013), o qual teve como objetivo desenvolver processos de ensino-apredizagem no Parkour para o Programa Segundo Tempo com realização de aulas ministradas a 15 meninos de uma escolar particular da cidade de Maringá. Os resultados foram positivos, levando em consideração os objetivos do PST em conjunto com a aventura.
Além desse trabalho dentro do Programa Segundo Tempo já existe o Projeto PST Navegar, que desenvolve atividades de vela, remo, e canoagem (CAVASINI, 2012). Segundo Paixão (2012) essas modalidades podem ser consideradas de aventura, o que seria precedente para que outras AA possam ser incluídas no Programa. Por fim, vale ressaltar que, especialmente como atividade esporádica (no projeto Recreio nas Férias, por exemplo) ações pontuais já foram iniciadas para a inclusão da aventura em núcleos do programa. Todavia, o PST ainda não abordou diretamente esse conteúdo e também não constitui uma proposta central. Na atualidade, encontramos na obra de Pereira e Armbrust (2010) um material didático pensado para escolas, passível de adaptação, e uma abordagem que dialoga o esporte de aventura com o PST, feita por Cavasini, Franco e Darido (no prelo) que apresentam modelos de planos de aula sobre escalada, corrida de orientação, parkour, atividades sobre rodas, surf, slackline, arvorismo e trekking.
CONCLUSÃO
O Programa Segundo Tempo (PST) vem se mostrando como uma possibilidade do ensino de diferentes atividades, buscando trazer a tona algumas questões importantes, trabalhando essas atividades nas dimensões conceitual, procedimental e atitudinal e ainda trabalhando as mesmas no contra turno, fazendo uso do tempo ocioso de crianças e adolescentes.
Nesse contexto as AA surgem como uma possibilidade de inserção para quebrar esse paradigma de ensino somente das modalidades esportivas tradicionais. Vale ressaltar que as AA possuem o risco como um fator diferenciador, onde deve ser trabalhado nas aulas de maneira que possa ser controlado e não como limitador da prática, transformando-o em um elemento motivador durante as aulas.
A Escola de Aventura seguindo os princípios do PST, proporciona aos seus participantes uma prática esportiva de caráter educacional, sem excluir seus participante de acordo com aptidão física, gênero, credo, etc. Desta forma a busca pelo aperfeiçoamento da prática pedagógica dessas AA no Escola de Aventura é um processo continuo. Sendo assim, 159 esse trabalho sugere outras intervenções e possíveis mudanças nos seus processos a fim de solucionar aspectos carentes de reflexão.
REFERÊNCIAS
AMBRUST, I., LAURO, F. A. A. O skate e suas possibilidades educacionais. Revista Motriz, Rio Claro, v.16 n.3 p.799-807, jul./set. 2010.
BETRÁN, J. O. BETRÁN, A. O. Proposta pedagógica para as atividades físicas de aventura na natureza (Afan) na educação física do ensino médio. Viagens, Lazer e Esporte – O espaço da natureza. Barueri: Manole, 2006.
CAVASINI, R. Programa Segundo Tempo Navegar. In: GOELLNER, S. V.; SOARES, L. S.; CARVALHO, M. A. A. (Org.). Programa Segundo Tempo: Memórias, experiências, avaliação e prespectivas no encontro das equipes colaboradoras. Maringá: Eduem, 2012. p. 277-284.
MELO, J. P.; DIAS, J. C. N. S. N.. Fundamentos do Programa Segundo Tempo: Entrelaçamento do esporte, do desenvolvimento humano, da cultura e da educação. In: OLIVEIRA, A. A. B.; PERIM, G. L.. Fundamentos pedagogicos do Programa Segundo Tempo: da reflexão à prática. Maringá: Eduem, 2009. p. 17-44.
OLIVEIRA, C. L. Educação pela aventura para o desenvolvimento humano. In: PEREIRA, D. W. Atividades de aventura: em busca do conhecimento. Várzea Paulista: Fontoura, 2013. p. 39-54.
OLIVEIRA A. A. B.; KRAVCHYCHYN C.; MOREIRA E. C.; PEREIRA R. S. Programa Segundo Tempo: Ensinando e aprendendo esportes no Programa Segundo Tempo. Eduem, v.1, 2012.
OLIVEIRA A. A. B.; KRAVCHYCHYN C.; MOREIRA E. C.; PEREIRA R. S. Programa Segundo Tempo: Ensinando e aprendendo esportes no Programa Segundo Tempo. Eduem, v.2, 2012.
PAIXÃO, J. A. O instrutor de esporte de aventura no Brasil e os saberes necessários a sua atuação profissional. Curitiba: Crv, 2012. 105 p.
PALMA, M. S. et. al. Estilos de ensino e aprendizagem motora: implicações para a prática. In: OLIVEIRA, A. A. B.; PERIM, G. L.. Fundamentos pedagogicos do Programa Segundo Tempo: da reflexão à prática. Maringá: Eduem, 2009. p. 17-44.
PEREIRA, D. W., AMBRUST, I. Pedagogia da aventura: os esportes radicais, de aventura e de ação na escola. Fontoura, 2010.
PIMENTEL, G. G. A.; SAITO, C. F. Caracterização da demanda potencial por atividades de aventura. Motriz, Rio Claro, v.16 n.1 p.152-161, jan./mar. 2010