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RESUMO

O objetivo do presente estudo foi resgatar a autobiografia da prática do voo livre, modalidade asa delta, e suas relações com conhecimento físico. Foi delimitado pelo interesse de aprimoramento conceitual do piloto e do físico; visando principalmente a segurança na prática desse esporte. Na evolução desse estudo observou-se a relação entre experiência de vida e formação e a aplicabilidade do conhecimento científico. O método utilizado foi baseado no registro autobiográfico e discussão de casos selecionados da experiência do próprio autor, procurando relacionar os conhecimentos físicos, tendo em vista a melhoria da abordagem técnica e científica dessa atividade de aventura. Foram identificados seis casos, ricos em detalhes técnicos e que apresentaram situação de maior risco e adversidades ao piloto, destacando no presente artigo apenas um deles. Observou-se que as situações foram de riscos decorrentes da falta de aplicação de conhecimento físico: velocidade relativa, trocas entre energia potencial e energia cinética, e vice versa, centro de gravidade e de massa, e ponto de referência. Destacaram-se os pousos maus concluídos, resultado do entendimento errôneo da amplitude da velocidade relativa observável, próxima ou distante do referencial. Neste aspecto, ao relatar a própria prática, relacionando os conceitos físicos envolvidos, observou-se assimilação de corretas técnicas de pilotagem, como se veio a demonstrar nos subsequentementes experimentos-pouso. Desse modo o licenciado em física, descobriu nuances sutis de conceitos físicos envolvidos na dinâmica do voo livre, conceitos cruciais para diagnosticar os porquês, que deflagraram os acontecimentos adversos, fornecendo elementos de aprendizagem e sugestões para a formação continuada de pilotos. 

1. INTRODUÇÃO

Sendo praticante de vôo livre, modalidade asa delta há 24 anos, no decorrer desse período eu pude sobrevoar diversos lugares, ver paisagens incríveis, experimentar boas emoções, fazer uma “infinidade” de amigos, ver e apreender no geral “panoramicamente” a majestosa e maravilhosa magia da vida na sua biodiversidade. Durante os voos realizados situações prazerosas foram constantes. Entretanto houve exceções; nem sempre foram “ventos favoráveis”; pois aconteceram alguns acidentes e incidentes na prática desse esporte.

A visão de toda essa riqueza e deslumbre, foi contraposto por ocasiões em que imperou o fator risco. Procurando realçar os bons momentos e minimizar os problemas, buscou-se motivação para se aprofundar no conhecimento da correta prática desse esporte.

Paralelo à motivação e devoção ao esporte e o interesse pelo conhecimento físico, aproximei-me do curso de Licenciatura em Física. Ao final desse processo, deparei com o momento em que tínhamos que concluir nossa formação acadêmica e elaborar um tema investigativo, surgiu assim a possibilidade de juntar essas duas paixões, Vôo livre e Física.

Perguntas surgiram: como unir essas duas motivações, o “eu-estudante” de física e o “eu-praticante” desse esporte radical. Quais eram as causas desses acidentes e situações adversas? Será que foram frutos de um desconhecimento de conceitos físicos?

Ao mesmo tempo, estava encantado e seduzido pela temática da formação continuada e o contato com as narrativas autobiográficas. (JOSSO, 2004; FREITAS; GALVÃO, 2007). Surgindo assim, um caminho teórico-metodológico a ser seguindo.

O recurso à narrativa autobiográfica inscreve-se na ideia de que, ao narrarmos episódios com significados, os analisaremos de uma forma contextualizada, tentando que essa análise ponha em evidência emoções, experiências ou pequenos fatos marcantes, dos quais antes não nos tínhamos apercebido. (FREITAS; GALVÃO, 2007).

A prática de modalidades de atividades de aventura na natureza é um assunto que vem sendo bastante estudado, principalmente nos campos da educação física e motricidade humana. (PEREIRA, ARMBRUST e PRADO, 2008). No caso do voo livre vemos os estudos de Pimentel (2006, 2008), Dias e Alves Jr. (2007) e Paixão et al. (2010), sendo que estes últimos autores destacam a questão dos riscos nesse tipo de atividade. Do ponto de vista de livro-texto sobre a prática de voo livre destaca-se a produção “Voando com consciência, Voando com Ciência” de Stoeterau (2000).

(...) as vivências diárias numa dada modalidade podem levar à banalização desses elementos por parte do praticante, transformando-se em elementos sensoriais ordinários. Essa situação poderá implicar negativamente na prática das modalidades de esporte de aventura como, por exemplo, a manutenção da integridade física e emocional do praticante. (PAIXÃO et al., 2010).

No decorrer das leituras, alguns assuntos detiveram minha atenção. O vôo livre é sem dúvida um esporte que causa aos seus apaixonados praticantes uma sensação “mágica”, por outro lado, é uma atividade de alto risco. No entanto, a excitação e a adrenalina acabam propiciando a superação da sensação de risco.

Como atividade de aventura na natureza, o vôo livre está relacionado a incertezas, interface com o meio selvagem, tendência de risco e desafio, liberdade proporcionada pela aventura e preparação rigorosa da segurança antes e no momento de suas ações práxicas. (RAMOS, 2003, citado por PIMENTEL, 2008, p. 14).

Essa colocação reforçou mais a urgência de buscar o fator segurança. Percebeu-se que no contexto do estudo do voo livre, a procura por uma forma mais descritiva da própria experiência de vida permitiu ao piloto/pesquisador uma sensação de estar inserido e vivenciando como uma espécie de simulador de voo. Isso me estimulou a assimilar e aprofundar o conceito teórico por meio da analise de minha própria experiência pessoal, como também compreender e teorizar a respeito da “formação experiencial”, um dos conceitoschaves das “Experiências de Vida e Formação” segundo descritas em Josso (2004). O processo de registro dos relatos autobiográficos seguiu pelos caminhos propostos por Josso (2004), tendo em vista a perspectiva do “caminhar para si”.

Munidos desse aparato teórico nasceu a presente pesquisa, que procurou responder as perguntas: por que e como evitar a ocorrência de uma cadeia de eventos desfavoráveis para a prática correta e segura do esporte de vôo livre. Dessa maneira, selecionaram-se seis casos de voo, abrangendo decolagem, percurso e pouso, mais ricos em detalhes técnicos e que envolvessem conceitos físicos relacionados com a dinâmica de voo. No decorrer da pesquisa, após o exercício de relembrar os casos, o “caminhar para si”, sentiu-se necessidade de encontrar respostas para os pousos mal concluídos, confirmando conceitos e corrigindo erros. Para isso foram realizados três experimentos, que intitulamos “experimentos-pouso”.

2. OBJETIVO

O objetivo deste trabalho foi de identificar e analisar casos específicos de situações da prática de vôo livre utilizando o método de relatos autobiográficos e verificando os conhecimentos físicos envolvidos, de modo a corrigir erros e melhorar a segurança na atividade.

3. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

3.1 Levantamento bibliográfico e por meio eletrônico

Os dados de pesquisas anteriormente publicadas foram obtidos em bibliotecas e por meio eletrônico a partir do uso de palavras-chave, tais como: voo, voo livre, asa delta, aerofólio, narrativas autobiográficas, atividades de aventura na natureza. Entre as fontes de dados consultados estão as publicações da Associação Brasileira de Vôo Livre, juntamente com os dados obtidos através da Federação Paulista de Vôo Livre (FPDV) e nos buscadores tradicionais como Google Acadêmico, Scielo, entre outros.

3.2 Relatos autobiográficos e narrativas visuais

Tendo como base o estudo realizado por Josso (2004), que destaca a importância do relato autobiográfico como forma de registro das experiências de vida e formação, a presente pesquisa de caráter qualitativo foi desenvolvida a partir da retrospectiva da própria prática de vôo livre; na qual se procurou registrar de forma autobiográfica e reflexiva os diversos momentos dessa atividade de aventura, identificando sob o olhar da Física, com suas leis e conceitos toda a dinâmica envolvida.

Adotou-se uma fórmula cronológica para apresentação de seis casos selecionados entre 277 vôos realizados no período entre 1990 e 2013. A análise desses casos permitiu introduzir pouco a pouco, as reflexões e observações de cada caso, tendo em vista os momentos que foram mais marcantes e mais significativos de situações de risco, nos quais os conhecimentos físicos envolvido eram fundamentais.

As etapas da pesquisa seguiram os seguintes passos: busca de dados no diário de vôo, processo de relembrar, processo de transcrição e descrição da situação, busca de fotografias e imagens relacionadas, análise da situação resgatada, análise do conhecimento físico envolvido, processo de elaboração das recomendações aos praticantes.

As imagens foram escolhidas e utilizadas de forma a compor narrativas visuais que complementavam o texto descritivo. Utilizou-se como referencial para esse tipo de estratégia o trabalho desenvolvido Figueiredo (2010), versando sobre cavernas.

Os casos foram registrados de maneira a expressar quatro momentos distintos: 1º. descrição do caso selecionado; 2º. situação envolvida; 3º. conhecimento físico relacionado; 4º. recomendações aos praticantes.

3.3 Experimento-pouso

Sob a luz da reflexão física que nasceu da análise dos seis casos, o entendimento teórico do porquê dos pousos mal concluídos, realizou-se o experimento-pouso durante o andamento da presente pesquisa.

Foram realizados 3 vôos experimentais, nos seguintes locais: a) São Vicente-SP (02/02/2013), b) Andradas-MG (30/05/2013), c) São Vicente-SP (12/06/2013).

Esses experimentos-pousos forneceram luz para conclusões imprescindíveis sobre a relação entre voo livre e conhecimento físico, auxiliando a união da teoria com a prática.

4. CASOS SELECIONADOS

Buscando relembrar toda a dinâmica envolvida em cada caso de vôo selecionado, tomou-se como partida a releitura do diário de vôo elaborado após cada prática, o qual se tornou uma forma de trazer a tona lembranças guardadas sobre o cenário, as emoções e detalhes do vôo específico. Entre os seis casos estudados (Quadro 1), para o presente artigo foi escolhido o caso 1, por ter sido o primeiro dos casos envolvendo situações adversas.

Quadro 1- Casos escolhidos para estudo Caso 1: de encontro ao paredão (São Vicente, SP) Caso-2: atravessando uma térmica (Caraguatatuba, SP) Caso-3: excesso de comando (Andradas-MG) Caso 4: interditando o aeroporto (Atibaia - SP) Caso 5: pouso mal feito nos levou ao churrasco (Andradas - MG) Caso 6: raciocinando com a asa trocada (Atibaia, SP)

4.1 Caso 1: de encontro ao paredão (São Vicente, SP)

4.1.1 Descrição do caso

Nesse caso o voo tinha como objetivo realizar o que se chama de “vôo prego”, vôo direto ao pouso, ou seja, sem permanência, pois na época tinha somente cinco voos-solo (pós formatura); a ocasião não demonstrava situação de risco eminente, pois o pouso seria próximo. Após a decolagem, afastou-se rapidamente do morro, no entanto a asa perdeu altura também rapidamente, mais do que esperado, ficando muito abaixo da linha de decolagem e aquém da performance do equipamento.

A asa seguia rumo ao pouso (diametralmente sentido oposto ao paredão da decolagem); entretanto, em frações de segundo o sentido inverteu, era exatamente o contrário. Em nosso referencial o morro se aproximava perigosamente.

O equipamento era um modelo antigo, que não permitia grande margem de erro. Por inexperiência a velocidade de voo era próxima de estol, ou seja, próxima de parar de voar. Durante essa situação fui surpreendido por um gradiente de velocidade do vento na horizontal, mudando repentinamente o sentido, de modo a levar a asa de encontro ao paredão.

4.1.2 Situação envolvida

Apesar do ponto de pouso próximo, a situação foi agravada pela perda acentuada de altitude e pela manobra de correção causada pelo retorno indevido da asa em direção ao morro. Entre a decolagem e a aterrissagem existia um obstáculo que era o enfileiramento de prédios da orla marítima. Se deparando com a fileira de prédios a frente a solução rápida escolhida devido à baixa altitude foi passar entre dois desses prédios, algo arriscado, mas era a única solução plausível no momento, pousando na areia da praia junto ao pouso oficial.

Apos o vôo ser concluído, pude pensar com calma. Quando o equipamento ia de encontro à parede rochosa, entrei em pânico, não conseguindo raciocinar direito. Essa situação ocorreu devido à falta de experiência. Mesmo assim, fui capaz de responder por reflexo condicionado e executar o comando de manobra, embora no ato não tivesse a mínima consciência do que fiz.

No caso em questão poderia ter resultado em um acidente de grandes proporções, tendo em vista que se ocorresse o choque com a pedra, pararia de voar e em seguida cairia em queda livre. Uma vez em queda imediatamente acionaria o paraquedas reserva. Consequentemente poderiam acontecer duas situações: se o paraquedas fosse acionado e não tivesse altura para abrir ou, se o paraquedas abrisse, mas se resvalasse na rocha, poderia ocorrer o embaraçando suas cordas; levando afinal a uma queda de 160 m de altura.

A queda dessa altura poderia resultar em um acidente gravíssimo ou até mesmo fatal. Para a minha sorte e espanto dos que assistiam o acontecido, nenhuma das situações descritas tornou-se realidade. A passagem perigosa entre dois prédios não pode ser evitada, mas foi realizada a contento, adicionando ainda mais adrenalina ao processo.

4.1.3 Conhecimento físico

Na figura 1 observa-se o Aerofólio (A) utilizado. Sendo de projeto antigo, possuía em seu conjunto um Cross bar Fixo (CbF), barra transversal na figura em cor amarela, conectado diretamente à quilha (cor marrom), tornando-a rígida em termos de ação e reação (Terceira Lei de Newton). Diferente dos projetos atuais em que os Cross bar (Cb) são semiflutuantes para Aerofólio de média performance e flutuantes para os de alta performance, dando uma maior flexibilidade ao conjunto. Sendo assim estas últimas absorvem parte das forças desiguais que vêm de encontro ao Bordo de Ataque (Ba-lado direito) e Ba-lado esquerdo. Essas forças são resultado do gradiente de velocidade horizontal (GvH) que provoca acelerações diferentes ponto a ponto nos Bordos de Ataque (Ba).

A Asa é considerada em vôo como o conjunto de: A, piloto, equipamento de suporte e de medição; estando esta sem aceleração (sem pressão de barra) portanto sem força atuando no sentido e direção do movimento e também do pouso, ficou sujeita a uma resultante de 132 forças em sentido contrário ao movimento devido GvH; consequência dos obstáculo da orla marítima (prédios, postes, árvores etc.).

Para entender o GvH criado no Caso 1; Abaixo da decolagem devido aos obstáculo a frente do deslocamento de ar; Podemos imaginar na figura abaixo, o observador olhando de cima do plano da figura; A região escura seria a projeção no plano de um obstáculo exemplo um prédio, a imagem esbranquiçada representando o fluxo de ar (vento), com suas linhas representando as diferentes velocidade e suas direções, o sentido desse deslocamento da esquerda para a direita na figura 2.

Figura 2- Exemplo de situação de Gradiente de Velocidade Horizontal (GvH) (Fonte:www.google.com.br/search?q=gradiente+de+velocidade+de+escoamento&rlz=1C2KMZB_enBR574BR 574&biw=).

4.1.4- Recomendações aos praticantes de vôo livre modalidade Asa Delta.

Importantíssimo saber as características do equipamento de vôo em especial a asa, pois só com uso de equipamento adequado ao seu nível de pilotagem poderá executar excelentes vôos com segurança; e ainda mais quando estiver voando em regiões desconhecidas ou mesmo em regiões conhecidas, mas que supostamente devido a topografia podem apresentar situações adversas; é imprescindível voar sempre com certa aceleração (pressão de barra); ou seja com velocidade de maior planeio (Ld) ou um pouco aquém.

4.2 Experimento pouso: caso referencial

Josso (2004) destaca que os processos de formação, de conhecimento e aprendizagem são importantes; considerado por ela como parte do processo consciencial; os quais são explorados na “Experiência de vida e Formação”, reforçando o proceder de relembrar. Nesse relembrar, analisa-se de uma forma contextualizada, tentando que essa análise ponha em evidência emoções, experiências ou pequenos fatos marcantes, que não havíamos percebido anteriormente. (FREITAS; GALVÃO, 2007). Foi então que sentimos nesse conjunto uma forma de entender e solucionar o que por anos me afligia, ou seja, os pousos mal concluídos.

Consequentemente no tempo de elaboração deste trabalho pesquisa, várias vezes relembramos etapas, momentos, refazendo mentalmente uma visão geral do ritual dos pousos. Numa dessas ocasiões ocorreu a conclusão do que nos levava a realizar a aterrissagem mal elaborada e mal finalizada.

Quando o pouso estava sendo finalizado e o vento (fluxo do ar) já próximo ao chão vinha a nosso encontro com grande velocidade no Referencial Terra (Rt), mesmo sendo a velocidade da asa no Referencial massa de ar Rf alta (pouco maior da velocidade LD); a resultante da soma vetorial das velocidades da Asa em relação ao ar (direção e sentido do movimento) e a velocidade do vento se deslocando na mesma direção e sentido contrário ao da Asa esse (deslocamento) tomado no Rt, essa resultante era pequena na nossa visão consequentemente mantínhamos inalterado os comandos implementados na reta final do 133 pouso, assim procedendo mantinha-se a velocidade da Asa em relação Rf ideal, finalizando sem crash (situação de choque ou colisão).

Porém quando a intensidade da velocidade do vento que vinha ao nosso encontro, já próximo do chão no Rt era pequena ou quase nula, a resultante da soma vetorial das velocidades ao nosso ver parecia muito grande, desacelerávamos modificando os controles de barra acertados no início da reta final, assim procedendo, a Asa parava de voar em relação à massa de ar se projetando ao solo, nessa situação o crash acontecia novamente.

Com base nesse entendimento (Conceito Referencial), o auxílio do gráfico de velocidades (Figura 3), mais aquisição de um velocímetro digital (fornece a velocidade em tempo real no Rf). Fomos a campo testar esse nova forma de ver o ritual pouso. Realizamos três vôos experimentos enfocando os pousos; efetuados em São Vicente-SP e Andradas (MG). Para nossa alegria e satisfação os três pousos foram concluído com exatidão.

Figura 3- Relação entre velocidade vertical e velocidade horizontal. (Fonte: SOBREVOAR,2009)

Podemos ver na Figura 3 que a Asa Delta quando já estava próxima ao solo a velocidade em relação a massa de ar era de Ld (máxima razão de planeio) ou seja vmax planeio, a componente horizontal era maior e essa se dissipava no atrito entre o ar e o equipamento ate a asa parar; mas quando também junto ao chão o equipamento era desacelerado para vmin, nessa situação a predominância era a da componente de velocidade vertical, a Asa chocava-se com o solo (crash) sem antes dissipar a velocidade horizontal e parar simplesmente.

4.3 Discussão dos resultados

O método de “Experiência de Vida e Formação” é uma ferramenta à mais e relevante para implementar a formação continuada, do praticante de voo livre e profissional da área correlata, propiciando um profícuo “caminhar para si”, tal como no sentido destacado por Josso (2004).

Nos seis casos analisados aconteceram fatores adversos, constituindo-se em uma cadeia de eventos desfavoráveis, por desconhecimento de conceitos físicos, relacionados com a dinâmica do vôo.

Os pousos mal concluídos na prática do esporte anteriores ao experimento-pouso foram o resultado de: mal entendimento de linha de visão do Referencial, ter a consciência de que a velocidade de vôo do equipamento é em relação ao referencial fluido (Rf) e não ao referencial solo (Rs); pois quando o equipamento voava junto ao Chão (Rs) pela proximidade, o piloto acreditava que se deslocava com grande velocidade, velocidade aquém da velocidade ideal de vôo; embora o equipamento estivesse na velocidade ideal em relação ao Rf, sendo desacelerado o equipamento parava de voar e “Creshava” (Ia de encontro ao solo).

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Observou-se que por anos, as perguntas que foram surgindo após cada voo, relembradas no decorrer dos relatos autobiográficos, embora não estivessem em níveis conscientes, exigiam respostas; tanto do praticante no decurso de 23 anos de prática do voo livre, como do físico no decurso dos últimos cinco anos de estudo.

Foi refletido e apreendido que no exercício de relembrar e analisar esses relatos tevese a oportunidade de vivenciar cada vôo novamente, com a sensação de estar inserido em um simulador de realidade de vôo.

Um fator importante que colaborou para uma maior acuidade dos fatos foi que durante este exercício não me encontrava sob a ação da adrenalina, diferentemente de quando estava presente nos voos. Pude assim, enxergar com mais clareza, principalmente com uma visão crítica de auto-observação os fatores norteadores que deflagram os acontecimentos observados em cada caso.

Esse novo olhar e entendimento foram resultados da cooperação entre a teoria e a prática, “uma ação práxica” conforme dito por Pimentel (2008). Sob essa visão observou-se, exercitou-se e concluiu-se por intermédio da prática assessorada por reflexões conceituais em todos os detalhes que lhe concerne, foi enriquecida e aprimorada para se constituir em correta e segura prática desse esporte.

O físico reviveu conceitos, descobriu nuances sutis de conceitos físicos na dinâmica física aplicada a prática do esporte; também teve contato e assimilou conceitos novos, resultado de pesquisa subsequente na busca de compreender e diagnosticar os porquês de cada caso, resultado da dinâmica de história de vida e formação.

Entendemos e aprendemos através da analise de experiência própria. A sermos capaz de resolver problemas através do método da formação continuada, uma das ideias principais da história de vida e formação, elaborada por Josso (2004).

Nos relatos autobiográficos, registramos os episódios com significado, analisando cada caso de uma forma contextualizada, fortalecido pelas narrativas visuais.

A construção é desenvolvimento dessa proposta investigativa se mostrou apropriada para o presente estudo, constituindo-se em uma narrativa, na medida em que as coletas de dados foram escritas em forma de autobiografias, resgatando os casos singulares de nossa trajetória como praticante de voo livre e suas interfaces na atividade como físico. Abrindo, assim, espaços para novas reflexões, contribuindo para novos vôos.

REFERÊNCIAS

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FIGUEIREDO, Luiz Afonso Vaz de: Cavernas como paisagens racionais e simbólicas: imaginário coletivo, narrativas visuais e representações da paisagem e das práticas espeleológicas. 2010. 466f. il. Tese (Doutorado em Ciências, área Geografia Física) – 135 Departamento de Geografia, Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2010.

FREITAS, Denise; GALVÃO, Cecília, Uso de narrativas autobiográficas no desenvolvimento profissional de professores. Ciência & Cognição. Sociedade Brasileira de Neurociência v.12, p. 219-233, 2007. Disponível em: http://www.cienciasecognicao.org/revista/index.php/cec/article/ view/648/430. Acesso em: 24 jun. 2013.

JOSSO, Marie-Christiane. Experiência de vida e formação. São Paulo: Cortez, 2004.

PAIXAO, Jairo Antônio da; COSTA, Vera Lucia de Menezes; GABRIEL, Ronaldo Eugénio Calçada Dias; KOWALSKI, Marizabel. Práticas aventureiras e situações de risco no voo livre: uma análise a partir do conceito de redoma sensorial. Motriz: Rev. Educ. Fis. [online]. v.16, n.3, p. 672-681, 2010.

PEREIRA, Dimitri Wuo; ARMBRUST, Igor; PRADO, Denis Ricardo. Esportes radicais de aventura e ação, conceitos, classificações e características. Revista Corpo consciência, Santo André, v. 12, n. 1, p. 37-55, jan./jun. 2008.

PIMENTEL, Giuliano. G. A. Risco, corpo e sociabilidade no vôo livre. Tese (Doutorado em Educação Física) - Faculdade de Educação Física, Universidade Estadual de Campinas 2006.

PIMENTEL, Giuliano Gomes de Assis. Ritos e riscos na prática do vôo livre. Movimento. Porto Alegre: Escola de Educação Física Brasil, v. 14, n. 3, p. 13-32, set. 2008.

STOETERAU, Kurt W. Voando com ciência, voando com consciência. São Paulo: Traço Publicações, 2000.

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