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Opa camaradas,

 

  Volto para dar a notícia e tentar sintetizar um bate-papo (in)formal que rolou com o Valter Bracht aqui na UFPR hoje ao meio-dia. Um horário um tanto quanto ingrato, mas foi o que deu para fazer para aproveitar a vinda de pesquisadores da linha sociocultural/pedagógica da Educação Física (assim como o Valter), que estão aqui na universidade para um fórum (para saber mais) de discussão acerca das condições de entrada, produção e manutenção dessa linha na pós-graduação da área. Uma iniciativa do GEPLEC (Grupo de estudos e pesquisas em lazer, esporte e cidade), coordenado pela professora/presidenta do CBCE, Simone Rechia, que vale ressaltar o esforço de todo o grupo para organizar e promover esses espaços de discussão que são sempre válidos, sobretudo pelo envolvimento de estudantes da graduação nessa empreitada.

 

 

 

 

  O professor Valter fez uma fala inicial se concentrando em abordar três questões tidas como problemáticas acerca da formação profissional dos professores de Educação Física. A fala dele foi direcionada, principalmente, para o assunto sobre o qual ele se debruça nos seus estudos e pesquisas há alguns anos, que é a Educação Física como espaço de intervenção pedagógica.

 

  Primeiro Valter Bracht apresentou o problema do reconhecimento social como questão nevrálgica da formação e atuação dos professores de Educação Física no Brasil e em alguns outros lugares do mundo hoje. Referenciado nas indicações de Axel Honneth sobre os fatores do reconhecimento social, Bracht problematizou a situação que se distingue dentro da Educação Física escolar - mas não só nela, vislumbrando o magistério como um todo - estabelecendo um paralelo comparativo entre professores em desinvestimento e aqueles que buscam a inovação pedagógica. De acordo com pesquisas que o grupo dele e outros estão desenvolvendo, os fatores que tem levado os professores à desinvestir (em alguns casos abandonar) ou inovar pedagogicamente na Educação Física são marcados, principalmente, por questões históricas da Educação brasileira como um todo e outras específicas da área, assim como baixo investimento, infraestrutura precária, baixos pisos salariais, entre outras. Pelo lado do desinvestimento, este encontrado em maior escala, muito se culpa o menosprezo da instituição escolar com relação à disciplina e ao professor de Educação Física, denegando-se o reconhecimento da sua importância como componente curricular da educação básica. Pelo outro lado, da inovação, este muito mais raro, o discurso é de resistência e luta cotidiana pelo reconhecimento. Diante disso, Valter aponta que temos, na verdade, um problema de legitimidade dos argumentos que nos mantem vivos no campo escolar. Argumentos que girem em torno não só de elementos morais de respeito e redistribuição de renda, mas também de conhecimentos no campo do direito social á Educação Física na escola. A partir de tal entendimento, Valter considera que precisamos de argumentos que levem à uma luta por reconhecimento que sigam para além de questões salariais, que alcancem também dimensões afetivas e morais do professor de Educação Física na escola.

 

 

  Em segundo lugar, Valter procurou problematizar até que ponto a pós-graduação da Educação Física ajuda pedagogicamente na formação de professores. Ao partir do pressuposto das missões que a Capes, instituição do MEC responsável pela pós-graduação no Brasil, assumiu no decorrer da sua trajetória, Bracht já consegue um forte argumento para indicar onde podemos encontrar uma possível causa para o problema. A Capes, inicialmente, como sua denominação pressupõe, tinha como missão principal a "Coordenação de Aperfeiçoamento Pessoal do Ensino Superior", porém, com o passar dos anos, ela absorveu e acabou concentrando esforços na missão de gerenciar e fomentar a produção científica do Brasil, o que de certa forma acabou negligenciando alguns princípios da missão primária. Outro argumento usado por Bracht para tal questão foi a perspectiva disciplinar sobre a qual se organizou a pós-graduação em Educação Física. Novamente citando questões históricas da área, assim como a influência inicial das ciências biológicas, a subdivisão da Educação Física em sub-áreas de pesquisa dentro da pós-graduação, conformando laboratórios excessivamente especializados e que pouco dialogam entre si, provocou o distanciamento das problemáticas da Educação Física como área de intervenção social. Assim, o que percebe-se hoje é a área pedagógica a caminho da extinção dentro da pós-graduação da Educação Física, o que traz como consequência o perene afastamento entre teoria e prática, deixando nas mãos dos imaturos estudantes de graduação o papel intelectual de aproximar e entrelaçar as diferentes problemáticas que são objeto de investigação e intervenção da área.

 

  Em terceiro lugar, mas não menos importante, Valter pondera algumas questões sobre o ensino privado com vistas à formação profissional da Educação Física no país. Bracht parte da desproporcionalidade que existe entre instituições públicas e privadas no que se refere aos cursos de formação de professores da área. Respectivamente, são mais ou menos 30% das primeiras para 70% das segundas. A questão para Bracht, se precavendo de qualquer tipo de preconceito com as instituições privadas, é que nesses espaços de formação profissional a centralidade acaba ficando nas tendências do mercado de trabalho. De tal modo, a formação é direcionada, fragmentada e se torna utilitária, instrumental. Sob esse ponto de vista, segundo Bracht, é preciso entender que a lógica de mercado não necessariamente é a mais indicada para uma perspectiva pedagógica e educacional que se preocupa com a formação crítica e emancipatória nas dimensões sociocultural e humana. Assim, resta-nos a esperança nas instituições públicas de ensino e formação, pois é nelas onde ainda há espaço para a resistência e a subversão, fugindo das lógicas de mercado. A partir disso, Valter Bracht conclui que é preciso lutar por uma equação que balanceie a formação de professores entre o mercado e os princípios pedagógicas de emancipação e superação.

 

  Ufa... difícil sintetizar o que uma referência importante fala por alguns minutos, tudo acaba sendo muito importante para a reflexão.

 

  Nas perguntas que consegui acompanhar o Valter falou também sobre os mestrados profissionais, que a priori acabaram sendo renegados pelos "semideuses" do mundo acadêmico, mas que para ele são uma boa esperança para a formação continuada voltada para o campo de intervenção. O professor ressalta que o grande equívoco está em acreditar que as cabeças pensantes são as da universidade e a mão-de-obra trabalhadora é aquela que tá na escola. Na verdade, para Bracht, os mestrados profissionais devem ter como eixo norteador a pesquisa-ação, em que pesquisadores e professores, ambos teóricos da educação, estejam no mesmo patamar de reflexão e intervenção.

 

  Por fim, mesmo sabendo que não é um tema pelo qual o professor Valter se interessa e pesquisa, não pude deixar passar a oportunidade de perguntar qual a posição do professor sobre a relação da Educação Física, desde a formação até a intervenção, com as tecnologias e a cultura digital. Ele, de início, já demarcou a sua pouca afinidade com as tecnologias lembrando que outra vez já lhe presentearam com um celular de brinquedo para ver se conseguiam fazer com que ele se familiarizasse com a máquina (rsrs). Valter lembrou de dois exemplos práticos da sua trajetória para falar sobre o assunto. Um foi uma única turma que ele e um gurpo de professores se propuseram formar através de um curso de educação a distância desenvolvido na Federal do Espírito Santo. O outro foi um seminário que alunos da graduação apresentaram em sua disciplina com um power-point cheio de luzes e efeitos, mas que do ponto de vista do conteúdo era um verdadeiro desastre. Para ele, o que fica dessas duas experiências é que a tecnologia e a cultura digital é ambígua, tendo um importante papel social, sobretudo, de acesso à informação, mas que deve ser tratada com muito cuidado pelo risco do fetiche de consumo e apropriação que elas tendem a despertar. Além disso, para o professor, mesmo que os suportes tecnológicos propiciem uma educação a distância conforme a experiência que eles tiveram, essas ferramentas ainda não conseguem dar conta do "olho no olho" que a formação cultural e humana de professores exige.

 

Enfim... por enquanto é isso. Coisas demais para pensar e refletir por um bom tempo.

 

Vou tentar pegar a gravação da roda de conversa que o pessoal do GEPLEC estava fazendo lá no auditório.

 

Abraço

 

 

Silvan Menezes

 

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