Ontem, terminou Oficina de Capoeira no Laborate, ministrada por Mestre Carlão - from London. Mestre Nelsinho o convidou. Iria passar video sobre a Capoeira como Patrimonio Imaterial, projeto do IPHAN, devidamente aprovado e concretizado. Mestre Carlão foi um dos responsáveis pelo projeto…

Mathias Assunção, outro. Esclarece Carlão que o dossiê sobre a Capoeira elaborado por Mathias esta excelente. Um pecado… o Marannhão sequer é citado. A Capoeira é baiana, carioca e pernambucana, nessa ordem, segundo os autores do documentário. Parabens… fiquem com “essa” Capoeira, então!

Mas Mestre Carlão pediu desculpas, pela omissão. Grande consolo!

Aceitei convite de Mestre Nelsinho, para assistir à apresentação do vídeo. Muita surpresa  e alegria. Primeiro, a recepção de Mestre Nelsinho, a quem admiro e respeito, pelos seus estudos sobre a Capoeira maranhense… em seguida, um senhor se apresenta: Professor Leopoldo! sou Uirapuru Uru, de Barra do Corda… lembra de mim? sim, Uru, foi meu aluno no CEFET-MA, professor de história, hoje, e capoeirista com um trabalho maravilhoso, no sertão…

Logo em seguida, entre Mestre Indio do Maranhão, junto com o Contra-Mestre Baé. Dois grandes amigos; já trabalhamos juntos, com a Capoeira, em Barreirinhas. Trabalho magnifico, do Baé a frente da Federação. Indio, um grande conhecedor da Historia da Capoeira. Aprendi muito com ele, de nossos papos, nos almoços em Barreirinhas…

A seguir, Mestre Patinho chega… herdeiro de Sapo, mantem viva a Escola Maranhense de Capoeira, através do Laborarte e de sua Academia Mestre Patinho, e de seus discipulos, espalhados pelo Maranhão.

Lembrei a Mestre Carlão que há, sim! uma Escola Maranhense de Capoeira. Mestre Sapo - discipulo de Canjiquinha e de Aberrê, misturou, já nos anos 70, a Angola com a Regional, aliando  a elementos da cultura maranhense, especialmente a ‘punga’ , os movimentos do boi, a ritmicidade dos tambores de mina e crioula, as ladainhas proprias, enfim, o que há de mais autentico na maranhensidade… deu na ‘nossa’ Capoeira.

Não é herdeira da baiana - embora Sapo tenha sido um dos Capitães de Areia, e Canjiquinha, em suas andaças pelo Nordeste com apresentação não de grupo de capoeira, mas de grupo folclórico, unindo as duas vertentes - duas não, três, pois além das sistematizadas - Bimba e Pastinha (baianas), baseados em Zuma (carioca), temos a CAPOEIRAGEM - seu maior representante foi Sinhôzinho (Rio de Janeiro). Na definição de Lacé Lopes, ‘trata-se de um jogo/luta dramática’, baseada na rua - luta de rua… essa seria a tradução da ‘escola de capoeira maranhense’, herdeira direta da ‘Carioca” e da ‘Punga dos Homens” - capoeira primitiva, que Sapo e Patinho souberam muito bem ‘traduzir’ para a herança do Maranhão. 

Essa! a Escola Maranhense de Capoeira”.

Chamado para falar - a lingua coçou durante os debates, mas não me meti em roda de mestres… - disse ao Mestre Carlão que não se preocupasse, pois falava do Brasil e da herança brasileira.

Lembrei a ele que o Maranhão não é, nem nunca foi, Brasil… fomos um estado independente (país) até a anexação por força das armas ao Império brasileiro. Nossas culturas divergem… nossas heranças, nossas memorias, são outras… Nossa capoeira tem outra origem: ela não é baiana!

Lembrei que o Maranhão, País, a partir do Consulado Pombalino, com os portos brasileiros do Rio de Janeiro, Salvador e Olinda/Recife, receberam grande fluxo de escravos. Os negociantes, em sua maioria, eram cariocas e pernambucanos.

A ‘diáspora’ deu-se para o Brasil, para o Maranhão, e para as Antilhas… dai a semelhança da Ladja com a nossa, vá lá, Capoeira…

A partir da inserção do Maranhão no comércio agroexportador internacional - a partir do reinado de D. José I (Marques de Pombal, primeiro-ministro, um dos déspotas esclarecidos, com o reinado iniciando em 1750...) -  chegaram os  escravos, pois a Companhia do Compercio do Maranhão e Grão-Pará deveria colocar, no mercado, 10.000 peças por ano.

Já pelos anos 1820/40, novas levas, desta vez, provenientes do Rio de Janeiro, Salvador e Recife. Época em que aparece, em nossas imprensa e cronistas, referencias a manifestações da lúdica e do movimento já com caráter urbano - nas cidades! mesma época em que os pesquisadores da academia dão como tendo iniciado, esse movimento de migração campo/cidade, nos demais ‘locis’… Rio de Janeiro, Salvador, Recife…

Logo depois - já no final dlo sécuilo XIX -, tem inicio da estagnação seguida da decandencia economica e os movimentos de libertação dos escravos, o capital volta-se para as áreas do café - Rio de Janeiro, depois São Paulo. A venda de escravos - proibido o comércio transatlantico, proveniente da Africa, deu-se do Maranhão/Pará em direção ao Sudeste/Sul… aparece, nessa época mais acentuadamente, movimentos de capoeiristas na Corte…

Coincidencia apenas?

O Porto é o elemento de disseminação. Portugal é o elemento aglutinador - a migração forçada de contingentes populacionais provenientes de África - Angola, Moçambique… -; de São Lourenço (hoje, Madagascar, Reunión); e outros portos/pontos do Indico - Molucas, Céleres, Indonésia- mesmo da China e India. Lembrar que no Império portugues o sol nunca se punha.

Quando falamos ‘negros africanos’, essas populações não provinham unicamente da Africa. Vinha sobretudo de outros Portos portugueses - Madagascar, Reunion, Indonesia - todos tratados indistintamente como negros, inclusive nossos indios eram chamados de ‘negros da terra’…

 Há necessidade de um maior estudo da presença dos 1.500 indios timbiras - maranhenses - junto às tropas portugues na reconquista das colonias portuguesas aos holandeses - lembro que a derrota da colonia holandesa nos trópicos deu-se com a expulsão dos batavos, primeiro de São Luís, depois de Olinda; nessa ocasião - retomada de Pernambuco, as tropas portuguesas tinham como comandantes maranhenses, já com vitórias nos campos de batalha; mesma coisa vai acontecer, depois, quando da retomada de São Jorge de Luanda e do Mina, já na África, quando maranhenses comandam as tropas portugueses; daí a presença de indios maranhenses junto às tropas portuguesas…

Assim como já havia a presença de indios maranhenses entre as tropas enviadas por Nassau, pouco antes, na conquista das posses portuguesas…

O que aconteceu do encontro dessas duas culturas, e seus modos de luta? Lembrar que a Rainha Jinga era aliada dos portugueses - capturava outros povos para venda, sem violencia de armas, pois havia necessidade de dominar sem prejudicar (danificar) a mercadoria… -; depois, já aliada dos holandeses permanecendo o mesmo tipo de comercio - e com a retomada, enfrentaram os 1.500 indios maranhenses e foram derrotados em todas as refregas… dá para se pensar… Mas isso, é Historia, e deve aparecer agora, que temos que estudar a Historia dos Afrodescendentes…

Pois bem… de onde vem a Capoeira?: qual a sua ancestralidade? Que é brasileira, não há dúvida… Assim como temos uma escola baiana (Bimba x Pastinha), uma carioca (Sinhozinho x Zuma), temos uma Maranhense, sim Senhor. E ainda nem falei da ‘GUARDA NEGRA’ e da ‘CARIOCA’, Mestre Carlão…

Publiquei no meu Blog http://colunas.imirante.com/leopoldovaz/, sobre noticia aqui de São Luis do Maranhão... mas o assunto é de interesse geral, daí colocá-lo neste espaço, também:

Comentários

Por Marcilio Krieger
em 29 de Setembro de 2009 às 17:46.

Oportuno e excelente, o resgate histórico  da Capoeira. Se me permite, digo que "Desporto também é cultura" - afinal, como poderíamos ser desperto para o fato de que o Maranhão  , no dizer do autor  "...

... não é, nem nunca foi, Brasil… fomos um estado independente (país) até a anexação por força das armas ao Império brasileiro. Nossas culturas divergem… nossas heranças, nossas memorias, são outras… Nossa capoeira tem outra origem: ela não é baiana! "

Essas, são achegas que à força de uma historiografia "oficial"  se perderam e que, mais que nunca faz-se necessário serem recuperadas. A unidade física nacional não significa sermos uma unidade em termos de História. O que nos une é que essa diversidade nos irmana, embora certos setores busquem a predominância de certas regiões ou culturas regionais sobre o todo nacional.

Parabéns pelo trabalho e continue a publicizar a variedade da prática da capoeira : " ...

.. Pois bem… de onde vem a Capoeira?: qual a sua ancestralidade? Que é brasileira, não há dúvida… Assim como temos uma escola baiana (Bimba x Pastinha), uma carioca (Sinhozinho x Zuma), temos uma Maranhense, sim Senhor. E ainda nem falei da ‘GUARDA NEGRA’ e da ‘CARIOCA’, Mestre Carlão… "

Obrigado pela aula de cidadania!

Marcilio Krieger

 


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