A REFORMA DO ENSINO MÉDIO E A ESCOLA DA PONTE…  

Esta semana estive na escola de meu neto, para conhecer a nova metodologia que estão implantando. Para inicio de conversa, nesses anos em que ele lá estuda, esta, salvo engano, é a quarta metodologia que estão implantando; tinha a ‘velha metodologia’ desenvolvida pela sua fundadora; depois modificada pelas filhas, com bases em seus estudos de doutorado, com algumas mudanças substantivas na ‘metodologia tradicional’ até então adotada; depois, passaram para uma ‘nova’ metodologia, com base nas modernas tecnologias de informação, adotando um sistema exógeno, com base na Venezuela, um tal de UNO; sempre que tentei verificar, me davam a resposta em espanhol, e base fora do país… nunca funcionou a contento, pois pelo que entendi, nem os professores tinham certeza do que estavam fazendo… agora, aparecem com outro sistema, abandonando a plataforma anterior – que já não estava sendo usada!!! por ser falha, e nem terem implantado a contento…

Agora, vejo a nova metodologia - implantada nos cursos superiores do sistema de ensino -, a ser estendida a todo o ensino médio, após algumas experiências – como se viu em noticias nos jornais de hoje, sobre a mudança da metodologia… baseada em 'cases', estudos de caso...

Agora mesmo, Henrique Borralho posta: “A reforma universitária de Berlim, que introduziu a ciência moderna nas Universidades, separou Humanidades e Ciências Exatas e Naturais. Desde então o ensino superior tem assumido uma função capitalista: formar para o mercado, para a então nascente sociedade industrial, técnica e hiper especialista.Como superar isso? Repensar o que se ensina, como, para que e para quem.”

A Reforma do Ensino Médio propõe, justamente, essa ‘nova’ estrutura, de separar as áreas ,de conhecimento – como havia no ensino tradicional – se fazia ‘científico’ ou ‘humanas’, e também havia a alternativa das ‘profissionais’; eu, por exemplo, já tinha minha ‘profissão escolhida’ por meu pai – seria advogado, como ele… então fiz ‘colégio comercial’, no Ginásio; depois Técnico em Contabilidade”, e por fim, Faculdade de Direito… nunca estudei – a não ser o básico, o mínimo – Física, Química, Biologia… depois, quando me decidi pela Educação Física – área médica!!! – precisei desses conhecimentos, até mesmo já no Vestibular… fui fazer complementação de estudos em cursinhos… passei, atuo há 40 anos na profissão, deixando o Direito de lado – nem terminei a faculdade…

Agora, vejo a escola de meu neto ir na contramão das propostas que se estão fazendo… vai estudar tudo, não importa a sua ‘vocação’ e os conhecimentos que não irá precisar… logo agora, quando se propõe um ensino segmentado, por áreas vocacionais… como escolher a profissão, aos 14 anos de idade? ao termino do 9o ano? do fundamental?

Ao responder às questões do Borralho, sugeri a ele conhecer a Escola da Ponte, de Portugal… pediu-me alguns detalhes…

Renata Carvalho  também respondeu ao Borralho, se referindo à pedagogia Waldorf faz isso de uma forma muito interessante ….venho buscando me inteirar e aprofundar mais sobre a antroposofia do Rudolf Steiner e a aplicação pela pedagogia Waldorf…as escolas de permacultura….apesar de pequenas são alguns passos na contramão desse pragmatismo educacional.

Prossegue Renata: Em resumo o Steiner, filósofo austríaco do início do XX propõe, a partir das leituras de Brentano, de Dilthey superar a ruptura entre sujeito e objeto que Descartes, a física clássica, e várias forças históricas complexas gravaram na mente humana ao longo dos séculos.


Ele define a antroposofia como “um caminho de conhecimento para guiar o espiritual do ser humano ao espiritual do universo.” O objetivo do antropósofo é tornar-se “mais humano”, ao aumentar sua consciência e deliberar sobre seus pensamentos e ações; ou seja, tornar-se um ser “espiritualmente livre”. A base epistemológica da antroposofia ta na obra A Filosofia da Liberdade e na tese de doutorado dele, Verdade e Ciência. Dá uma sacada no site da sociedade Brasileira de Antroposofia, http://www.sab.org.br/antrop/ tem uma biblioteca bem vasta publicada lá e que é a base para o desenvolvimento da pedagogia Waldorf q objetiva integrar de maneira holística o desenvolvimento físico, espiritual, intelectual e artístico dos alunos. O objetivo tmb é desenvolver indivíduos livres, integrados, socialmente competentes e moralmente responsáveis. As escolas e professores possuem grande autonomia para determinar o currículo, metodologia e governança.

Escola da Ponte

A Escola Básica da Ponte ou Escola da Ponte – Escola Básica Integrada de Aves/São Tomé de Negrelos, popularmente referida apenas como Escola da Ponte, é uma instituição pública de ensino, localizada em Vila das Aves e São Tomé de Negrelos, em Santo Tirso, no distrito do Porto, em Portugal, que proporciona aprendizagens a alunos do 1.º e 2.º Ciclo, dos 5 aos 13 anos, entre o 1º e o 9º ano, cujo método de ensino se baseia nas chamadas Escolas democráticas e numa educação inclusiva.

É a instituição de ensino que Rubem Alves se refere, em 2001, descrevendo-a no seu livro “A Escola com que Sempre Sonhei sem Imaginar que Pudesse Existir”.

Faz parte integrante do chamado Movimento da Escola Moderna (MEM) alicerçado nas ideias pedagógicas do francês Célestin Freinet, e em 2002 era considerado, pelo presidente do referido movimento em Portugal, o único exemplo acabado dos seus princípios que são “uma escola democrática, para todos, em que se dá protagonismo ao aluno”. Assim como segue igualmente muito do pensamento apresentado pelo brasileiro Paulo Freire.

Está assente em valores como a solidariedade, autonomia e responsabilidade.

Hoje é um marco pedagógico de diferenciação do modelo de escola corrente, dito “tradicional”, e esta diferença é estudada, admirada e até parcialmente adoptada um pouco por todo o Mundo, com especial destaque no Brasil.

Inserida no sistema público de ensino português, apesar da excelência comprovada por todas as inspecções e estudos, mesmo a nível mundial, o seu método de ensino tardou em ser aprovado e reconhecido pelo Ministério da Educação. Durante muito tempo, a escola da Ponte foi “ignorada” pelas autoridades, depois passou ser considerada por todas instituições publicas nacionais como uma “referência” para um novo sistema de ensino que privilegie a Cidadania.

É inclusive reconhecida mundialmente pelo seu projecto inovador, pois desde 1977 que o lema desta escola é “tentar fazer crianças felizes” baseia-se na autonomia dos alunos e professores, assim como, rompe o sistema padrão de seriação/ciclos adoptado pelas restantes instituições de ensino em Portugal e grande parte do mundo.

A escola não tem paredes internas para separar os alunos de acordo com a idade ou série. Esses, por sua vez, se agrupam de acordo com a área de interesse a ser pesquisada, independente da faixa etária[11][12].

Aqui “a palavra-chave da relação escola encarregados de educação é participação”. Por isso, os pais são vistos como “parceiros e corresponsáveis pelo projeto educativo do aluno”[13].

Este projecto surge em 1976 e foi liderados pelo pedagogo José Pacheco que entretanto, por sentir que estava num processo de conclusão e por o Ministério da Educação não ter permitido prosseguir a escola até ao 12º ano, deixou-o entregue à gestão da própria comunidade local, conta com uma assembleia de estudantes, associação de pais, uma comunidade organizada e outras tantas acções e programas que culturalmente mantém seu funcionamento[14], eliminando a função corrente de conselho directivo escolar.

No ano letivo 2015/16 tem apenas 230 alunos do pré-escolar ao 9.º ano.

O número de exames realizados não é muito expressivo, mas a posição da escola nos rankings das escola portuguesas oscila entre o lugar 214 no 4.º ano e o 1147 no 9.º ano. Os alunos são preparados para os exames tendo aulas mais tradicionais.

 

Estrutura


A sua estrutura organizativa, desde o espaço, ao tempo e ao modo de aprender exige uma maior participação dos alunos tendo como intencionalidade a participação efetiva destes em conjunto com os orientadores educativos, no planeamento das atividades, na sua aprendizagem e na avaliação.

As crianças e os adolescentes compartilham o mesmo espaço físico, um grande galpão, muito bem estruturado para pesquisa e de fácil acesso aos alunos[31].

A escola encontra-se numa área aberta. Os alunos formam grupos heterogêneos, não estando classificados, agrupados ou distribuídos por turmas nem por anos de escolaridade que, na prática, não existem. Não há salas de aula mas sim espaços de trabalho, onde não existem lugares fixos. Essa subdivisão foi substituída, com vantagens, pelo trabalho em grupo heterogéneo de alunos. Do mesmo modo, não há um professor encarregue de uma turma ou orientador de um grupo.

Em vez disso, todos os alunos trabalham com todos os orientadores educativos e de acordo com os níveis de progressão tanto ao nível das competências académicas quanto comportamentais.

Assim escola está organizada por 3 núcleos:

Iniciação
Consolidação
Aprofundamento
Dentro desses núcleos, os alunos estão subdivididos por grupos, organizados, no início do ano lectivo, de acordo com as suas preferências. Depois de organizados, os grupos escolhem um professor tutor, o que dá origem a uma tutoria, um grupo constituído pelos alunos e pelo professor[32].

Os orientadores estão organizados por dimensões:

Artística
Identitária
Linguística
Lógico-matemática
Naturalista
Pessoal e Social

 

Instrumentos pedagógicos


Definição dos Direitos e Deveres – Os alunos decidem democraticamente, na Assembleia de Alunos, os direitos e deveres que consideram fundamentais para o funcionamento da escola[33].

Assembleia de Alunos – atividade que reúne todos os alunos, na qual são discutidas, analisadas e votadas medidas para o dia a dia na escola, de forma democrática, solidária, respeitando as regras e visando o bem comum[34][35].

Comissão de Ajuda – é formada por seis alunos nomeados para resolver os problemas mais graves colocados na Assembleia. Três desses alunos são escolhidos pelos membros da mesa da Assembleia Geral e outros três pelos professores. As decisões dessa Comissão guiam-se pelos direitos e deveres definidos pelos alunos, que se comprometeram a respeitar o estabelecido.

Debate – tem caráter mais informal que as Assembleias e acontece sempre que necessário.

Biblioteca – ocupa o espaço comum, da área aberta da Escola, e serve como espaço de encontro e de pesquisa.

Acho bem / Acho mal – Nas salas, existe um dispositivo pedagógico que consiste numa folha afixada na parede onde os alunos podem escrever aquilo que acharam bem e aquilo que acharam mal[36].

Caixinha dos Segredos – Local onde os alunos podem colocar, por escrito por carta, tudo aquilo que querem transmitir de forma privada, tais como sugestões e propostas. Depois será a “Comissão de Ajuda” entrega as cartas aos destinatários, e faz um levantamento das sugestões e propostas[37].

Comissão de ajuda – Os alunos da comissão de ajuda recolhem as folhas com os “Acho bem / Acho mal” e o que está na “Caixinha dos Segredos” e fazem uma reunião, uma vez por semana, à hora do almoço, para pensarem na forma de resolver os problemas. Depois, vão ter com os colegas envolvidos nos problemas, durante os intervalos, e conversam com eles até chegaram a uma solução. Se não conseguirem chegar a uma solução, colocam o assunto à assembleia para que seja discutido pela escola toda. Mas, como afirmam com orgulho, essa situação quase nunca se verifica. Regra geral, a comissão de ajuda consegue resolver os assuntos com os colegas envolvidos[38].

Eu Já Sei – faz parte do objetivo de desenvolver a autonomia dos alunos, partindo do processo de auto-avaliação. Sempre que um aluno se sente preparado para ser avaliado, solicita a avaliação escrevendo o seu nome numa lista. Só então esta avaliação se processa, no dia seguinte. Caso o professor considere que o aluno não estava preparado, orienta-o no sentido de procurar mais informação e corrigir os seus erros. Quando termina este trabalho, o aluno solicita nova avaliação.

Eu Preciso de Ajuda – a criança é estimulada a buscar todas as fontes possíveis de informação que estão a seu alcance antes de pedir ajuda (pares, grupos, livros, internet). Esgotadas todas as possibilidades, o aluno pode escrever seu nome numa das listas dispostas em diversos locais da escola. Posteriormente, um professor organiza pequenos grupos de estudo para esclarecer o assunto com quem tem dúvidas.

Professor Tutor – o professor tutor acompanha de perto um grupo reduzido de alunos, dos quais monitoriza o trabalho individualmente e faz reuniões sistemáticas uma vez por semana, mantendo também um contato direto e frequente com os encarregados de educação.

Grupos de responsabilidade – cada aluno e os orientadores educativos são responsáveis por algum aspecto do funcionamento da escola. Os grupos de responsabilidade reúnem-se uma vez por semana para resolverem alguns assuntos ou estruturarem um aspeto fundamental do dia a dia da escola. Algumas das responsabilidades atribuídas aos grupos são:
5 R’s;
Arrumação e Material Comum;
Assembleia e Comissão de Ajuda;
Biblioteca;
Terrário Jardim;
Comenius;
Computadores e Música;
Correio e Visitas na Ponte;
Datas e Eventos;
Jogos de Mesa e Recreio Bom;
Jornal;
Murais
Solidariedade;

 

PARA SABER MAIS:

http://www.escoladaponte.pt/site/

https://pt.wikipedia.org/wiki/Escola_da_Ponte

José Pacheco e a Escola da Ponte – http://novaescola.org.br/…/jose-pacheco-e-a-escola-da… O educador português conta como é a Escola da Ponte, em que não há turmas, e diz que quem quer inovar deve ter mais interrogações que certezas por: CM   Cristiane Marangon  

José Pacheco não é o primeiro – e nem será o último – a desejar uma escola que fuja do modelo tradicional. Ao contrário de muitos, no entanto, o educador português pode se orgulhar por ter transformado seu sonho em realidade. Há 40 anos ele coordena a Escola da Ponte. Apesar de fazer parte da rede pública portuguesa, a escola de ensino básico, localizada a 30 quilômetros da cidade do Porto, em nada se parece com as demais.

A Ponte não segue um sistema baseado em seriação ou ciclos e seus professores não são responsáveis por uma disciplina ou por uma turma específicas. As crianças e os adolescentes que lá estudam – muitos deles violentos, transferidos de outras instituições – definem quais são suas áreas de interesse e desenvolvem projetos de pesquisa, tanto em grupo como individuais.

A cada ano, as crianças e os jovens criam as regras de convivência que serão seguidas inclusive por educadores e familiares. É fácil prever que problemas de adaptação acontecem. Há professores que vão embora e alunos que estranham tanta liberdade. Nada, no entanto, que faça a equipe desanimar.

O sistema tem se mostrado viável por pelo menos dois motivos: primeiro, porque os educadores estão abertos a mudanças; segundo, porque as famílias dos alunos apóiam e defendem a escola idealizada por Pacheco.

Quando jovem, esse educador de fala mansa não pensava em lecionar. Queria ser engenheiro eletrônico. Mas uma questão o inquietava: por que a escola ainda reproduzia um modelo criado há 200 anos? Na busca por uma resposta, se apaixonou pelo magistério. “Percebi que na engenharia teria menos a descobrir, enquanto na educação ainda estava tudo por fazer.” Desse “tudo” de que tem se incumbido o professor Zé, como gosta de ser chamado, é que trata a entrevista a seguir, concedida à NOVA ESCOLA em São Paulo.

 

A Escola da Ponte é bem diferente das tradicionais. Como ela funciona?

JOSÉ PACHECO Lá não há séries, ciclos, turmas, anos, manuais, testes e aulas. Os alunos se agrupam de acordo com os interesses comuns para desenvolver projetos de pesquisa. Há também os estudos individuais, depois compartilhados com os colegas. Os estudantes podem recorrer a qualquer professor para solicitar suas respostas. Se eles não conseguem responder, os encaminham a um especialista.

Existem salas de aula?

PACHECO Não há salas de aula, e sim lugares onde cada aluno procura pessoas, ferramentas e soluções, testa seus conhecimentos e convive com os outros. São os espaços educativos. Hoje, eles estão designados por área. Na humanística, por exemplo, estuda-se História e Geografia; no pavilhão das ciências fica o material sobre Matemática; e o central abriga a Educação Artística e a Tecnológica.

A arquitetura mudou para acompanhar o sistema de ensino?

PACHECO Não. Aliás, isso é um problema. Nosso sonho é um prédio com outro conceito de espaço. Temos uma maquete feita por 12 arquitetos, ex-alunos que conhecem bem a proposta da escola. Esse projeto inclui uma área que chamo de centro da descoberta, onde compartilharemos o que sabemos. Há também pequenos nichos hexagonais, destinados aos pequenos grupos e às tarefas individuais. Estão previstas ainda amplas avenidas e alguns cursos d’água, onde se possa mergulhar os pés para conversar, além de um lugar para cochilar. As novas tecnologias da informação devem estar espalhadas por todos os lados para ser democraticamente utilizadas pela comunidade, o que já conseguimos.

Os professores precisam de formação específica para lecionar lá?

PACHECO Não. Eles têm a mesma formação que os de outras instituições. O diferencial é que sentem uma inquietação quanto à educação e admitem existir outras lógicas. Nossa escola é a única no país que pode escolher o corpo docente. Os candidatos aparecem geralmente como visitantes e perguntam o que é preciso para dar aulas lá. Digo apenas para deixarem o nome. No fim de cada ano fazemos contato. Hoje somos 27, cada um com suas especializações.

Como os novos professores se adaptam à proposta da escola?

PACHECO Há profissionais que estiveram sozinhos em sala durante anos e quando chegam constatam que sua formação e experiência servem para nada. De cada dez que entram, um não agüenta. Outros desertam e regressam depois. Mas nós também, por vezes, temos que nos adaptar. Há dois anos recebemos muitas crianças e professores novos, não familiarizados com a nossa proposta. Apenas a quinta parte do corpo docente já estava lá quando isso aconteceu. Passamos a conviver com mestres que sabiam dar aula e estudantes que sabiam fazer cópias. Foi necessário dar dois ou três passos para trás para que depois caminhássemos todos juntos. Precisamos aceitar o que os outros trazem e esperar que eles acreditem em nossas idéias. Essa é a terceira vez que passamos por isso.

Qual o perfil dos alunos atendidos pela Escola da Ponte?

PACHECO Eles têm entre 5 e 17 anos. Cerca de 50 (um quarto do total) chegaram extremamente violentos, com diagnósticos psiquiátricos e psicológicos. As instituições de inserção social que acolhem crianças e jovens órfãos os encaminham para as escolas públicas. Normalmente eles acabam isolados no fundo da classe e, posteriormente, são encaminhados para nós. No primeiro dia, chegam dando pontapés, gritando, insultando, atirando pedras. Algum tempo depois desistem de ser maus, como dizem, e admitem uma das duas hipóteses: ser bom ou ser bom.

Como os estudantes vindos de outras escolas se integram a um sistema tão diferente?

PACHECO Não é fácil. Há crianças e jovens que chegam e não sabem o que é trabalhar em grupo. Não conhecem a liberdade, e sim, a permissividade. Não sabem o que é solidariedade, somente a competitividade. São ótimos, mas ainda não têm a cultura que cultivamos. Quando deparam com a possibilidade de definir as regras de convivência que serão seguidas por todos ou não decidem nada ou o fazem de forma pouco ponderada. Em tempos de crise, como agora, em que muitos estão nessa situação, precisamos ser mais diretivos. Só para citar um exemplo, recebemos um garoto de 15 anos que tinha agredido seu professor e o deixado em estado de coma. Como um jovem assim pode, de imediato, participar da elaboração de um sistema de direitos e deveres?

A escola nem sempre seguiu uma proposta inovadora. Como ocorreu a transformação?

PACHECO Até 1976, a escola era igual a qualquer outra de 1ª a 4ª série. Cada professor ficava em sua sala, isolado com sua turma e seus métodos. Não havia comunicação ou projeto comum. O trabalho escolar era baseado na repetição de lições, na passividade. Naquele ano, havia três educadores e 90 estudantes. Em vez de cada docente adotar uma turma de 30, juntamos todos. Nosso objetivo era promover a autonomia e a solidariedade. Antes disso, porém, chamamos os pais, explicamos o nosso projeto e perguntamos o que pensavam sobre o assunto. Eles nos apoiaram e defendem o modelo até hoje.

Qual é a relação dos pais com a escola?

PACHECO Eles participam conosco de todas as decisões. Se nos rejeitarem, teremos de procurar emprego em outro lugar. Também defendem a escola perante o governo. Neste momento, os pais estão em conflito com o Ministério da Educação. Ao longo desses quase 30 anos, quiseram acabar com nosso projeto. Eu, como funcionário público, sigo um regime disciplinar que me impede de tomar posições que transgridam a lei, mas o ministro não tem poder hierárquico sobre as famílias. Portanto, se o governo discordar de tudo aquilo que fazemos, defronta-se com este obstáculo: os pais. Eles são a garantia de que o projeto vai continuar.

Como sua escola é vista em Portugal?

PACHECO Há uma grande resistência em aceitar o nosso modelo, que é baseado em três grandes valores: a liberdade, a responsabilidade e a solidariedade. Algumas pessoas consideram que todos precisam ser iguais e que ninguém tem direito a pensamento e ação divergentes. Há quem rejeite a proposta por preconceito, mas isso nós compreedemos porque também temos os nossos. A diferença é que nós nunca colocamos em cheque o trabalho dos outros. Consideramos que quem nos ataca faz isso porque não foi nosso aluno e não aprendeu a respeitar o ponto de vista alheio.

Qual é o segredo de sucesso da proposta seguida pela Ponte?

PACHECO Nós acreditamos que um projeto como o nosso só é viável quando todos reconhecem os objetivos comuns e se conhecem. Isso não significa apenas saber o nome, e sim ter intimidade, como em uma família. É nesse ponto que o projeto se distingue. O viver em uma escola é um sentimento de cumplicidade, de amor fraterno. Todos que nos visitam dizem que ficam impressionados com o olhar das pessoas que ali estão, com o afeto e a palavra terna que trocam entre si. Não sei se estou falando de educação ou da minha escola, mas é isso o que acontece lá.

O modelo da Escola da Ponte pode ser seguido por outras escolas?

PACHECO Não defendo modelos. A Escola da Ponte fez o que as outras devem e podem fazer, que é produzir sínteses e não se engajar em um único padrão. Não inventamos nada. Estamos em um ponto de redundância teórica. Há muitas correntes e quem quer fazer diferente tem de ter mais interrogações do que certezas. Considero que na educação tudo já está inventado. A Escola da Ponte não é duplicável e não há, felizmente, clonagem de projetos educacionais.

Hoje a escola pode funcionar sem o senhor?

PACHECO Fui e continuo sendo um intermediário. Não tenho mérito por isso, apenas cumpro a minha missão. Vou me afastar dentro de um ano e estou amargamente antecipando essa despedida. Todo pai tem de deixar o filho andar por si próprio e, nesse momento, a Ponte caminha sozinha. Depois quero continuar desassossegando os espíritos em lugares onde há gente generosa, que só precisa de um louco com a noção da prática, como eu. Agora ninguém pode dizer que uma experiência como a da Escola da Ponte não aconteceu, porque ela existe e provamos que é possível.

 

Quer saber mais?

A Escola com que Sempre Sonhei sem Imaginar que Pudesse Existir, Rubem Alves, 120 págs., Ed. Papirus, tel. (19) 3272-4500, 22 reais

Quando Eu For Grande, Quero Ir à Primavera, José Pacheco, 109 págs., Ed. Didática Suplegraf, tel. (11) 6941-0599, 19,60 reais

Sozinhos na Escola, José Pacheco, 115 págs., Ed. Didática Suplegraf, 19,90 reais

 

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