Ganhar a vida

Viver é um exercício difícil, exatamente porque somos mortais e não nos sobra tempo para experiências e compensações! Só ganhamos a vida com escolhas e atitudes difíceis, incómodas e até dolorosas, que balizem a tentativa de percorrer um caminho decente e limpo, sem o conseguir de todo. Sim, é preciso caminhar muito e andar de pé e de cabeça erguida para recolher um pouco do que está perto e ao nosso alcance. Mas não temos alternativa, se não quisermos atolarmo-nos e apodrecer na merda do fingimento.
Ganhar a vida é proclamar inequivocamente que o Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior é corresponsável pela situação de degradação do setor. Foi no seu tempo de Secretário de Estado que se abriram as portas à criação de perversas leis laborais e à destruição da democracia na universidade. Ele não tem condições para a função, porque ou mente ou desconhece a realidade, ao afirmar que haver docentes sem remuneração “é normal numa sociedade aberta, autónoma e livre”.
A mistificação da realidade é evidente. Uma coisa é haver peritos, pertencentes a outras instituições, convidados para dar esporadicamente algumas aulas; outra bem diferente e indigna é recorrer a jovens para assegurar o serviço docente, não lhes pagando nada ou explorando-os com precariedade laboral e com remunerações baixíssimas. Este é um expediente abjeto, que vigora na universidade com toda a naturalidade e tranquilidade da consciência. É em tudo semelhante à exploração dos estagiários não pagos, praga em expansão no mundo empresarial, etc. E há ainda estudantes de doutoramento que, além de pagarem propinas, lecionam graciosamente muitas das aulas (e corrigem os testes) atribuídas aos seus putativos orientadores.
Sim, hoje existe na universidade, com capa de legalidade, um regime de exploração de jovens docentes. Estes passam mal, nomeadamente no plano da subsistência material. Os de barriga cheia não se incomodam com os de barriga vazia. Fechar os olhos a isto é ser cúmplice com a iniquidade e perder a vida. Ora eu quero ganhá-la, por mais que a perca muita gente da área, a começar pelo Ministro.

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